A pesquisa ainda é incipiente, mas algumas questões já foram definidas: um robô móvel e autônomo, que use lâmpadas de LED Far-UVC para a limpeza
Em meados de março, quando a pandemia começava a afetar o Brasil com mais intensidade, Patricia Della Méa Plentz conversou com o irmão Rodrigo Della Méa Plentz, coordenador do Serviço de Fisioterapia da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre, sobre as dificuldades e preocupações que os hospitais enfrentavam para atender pacientes com Covid-19 e que tipos de robôs poderiam ajudar os profissionais de saúde. Além de fraterno, o diálogo evoluiu para uma pesquisa de um robô móvel de baixo custo para desinfecção de ambientes, já que Patrícia é professora do Departamento de Informática e Estatística (INE) e pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Computação da UFSC e Rodrigo também é professor da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre.
“Quanto menos gente envolvida, melhor para evitar infecções. Como atuo na área de robótica móvel, comentei com ele: ‘precisamos pensar num robozinho, ou para atender pacientes ou para permitir uma televisita por um tablet’”, conta Patrícia. Nas conversas, Rodrigo lembrou que eram necessárias soluções para desinfecção de ambientes – num primeiro momento, hospitais, mas depois para outros pontos com grandes aglomerações, como escolas, postos de saúde e shopping centers. Eles aproveitaram um edital do CNPq, oferecendo bolsas para propostas envolvendo o combate ao SARS-CoV-2, e iniciaram o projeto – agora com a participação do doutorando Sergio Pfleger.
A pesquisa ainda é incipiente, mas algumas questões já foram definidas: um robô móvel e autônomo, que use lâmpadas de LED Far-UVC para a desinfecção. “O tamanho do robô vai ser determinado pelo ambiente que vai desinfectar, que ainda não definimos, e a quantidade de aglomeração neste ambiente – se ele vai usar mais ou menos luz. Isso implica em ter mais ou menos baterias para ele carregar”, explica a pesquisadora. É nisto que o bolsista Sergio trabalha atualmente: qual a quantidade de luz necessária para desinfectar um determinado ambiente e o quanto isto requer em bateria. “O ideal, e o que vamos perseguir neste projeto, é quanto menor o robô, melhor. Nós vamos ir ao limite do que for possível”, diz Patrícia. Ela lembra que nos Estados Unidos e Alemanha, há estruturas do gênero com até um metro e oitenta de altura usando este tipo de luz, com um custo proporcionalmente maior. São duas alternativas em estudo: uma com uma série de lâmpadas apenas na parte de baixo do robô (para desinfecção do piso) e outra com uma lâmpada também na parte de cima (para desinfecção de móveis e objetos que compõem um determinado ambiente).
A operação do robô começa com o mapeamento do ambiente, através de câmeras e outros sensores (que podem estar também no ambiente), no primeiro uso. Nesta navegação, o robô guarda todas as informações, constrói um mapa – incluindo aí o docker, que é a estação de reabastecimento das baterias – e calcula quanto tempo levaria para desinfectar este ambiente. Com as câmeras no ambiente, é possível que o robô estime o tempo necessário para a desinfecção – se apenas uma pessoa tiver passado pelo local, o tempo para a limpeza seria menor. Estas tarefas são possíveis porque o robô tem “algoritmos de navegação adaptativos: ele tem todas estas informações e define a melhor solução. Aparece aí também a inteligência artificial, que é o deep learning; técnicas de sistemas de tempo real para poder maximizar uso da bateria e do tempo (como chegar do ponto A ao ponto B da forma mais rápida e eficiente) e algumas métricas para definir o melhor caminho”.
A desinfecção ocorreria em horários alternativos, para evitar o fluxo normal de pessoas no ambiente. “A ideia é dimensionar a carga de bateria para que ele consiga garantir a desinfecção de um espaço inteiro e vá para outro. Ao perceber que o nível de bateria chegou no mínimo, ele vai para o docker, recarrega e segue o trabalho” comenta a pesquisadora. Isto é garantido por um sistema do robô que acione um alarme quando a energia estiver no mínimo possível para ele voltar ao docker.
O tipo de luz ultravioleta empregado no projeto foi escolhido por “permitir certa aproximação, mas não pode haver incidência direta na pele. É o mais adequado para sistemas de desinfecções de ambientes,”, aponta a professora. Mesmo assim, pessoas não devem estar presentes no ambiente quando for utilizada. Desta forma, o robô precisa estar preparado para parar quando houver algum tipo de movimento, do pessoal de limpeza ou vigilância, por exemplo. “A câmera no robô é importante porque podem acontecer imprevistos. Com um sensor visual, de imagem, ele pode estar preparado. São algumas travas de segurança que este tipo de sistema precisa ter”, afirma Patricia. A literatura da área, continua a pesquisadora, comprova que a Far-UVC elimina 99,9% dos vírus, inclusive o coronavírus.
A pesquisadora também analisa se com um tipo de estrutura robótica é possível ”atacar” vários tipos de ambientes. “Tem um edital da Fapesc, que quer soluções para o Estado. Será que conseguimos montar este robô para que seja aplicado nas escolas, nos postos de saúde e nos hospitais? São questões que estudamos diariamente”.
A expectativa é que, de seis a oito meses, a pesquisa já tenha respondido às questões de bateria, tamanho e da dinâmica do robô. A ideia é montar um protótipo de baixo custo, com tecnologias abertas e melhorar a partir disto – Patrícia imagina que a parte robótica (plataforma, motor, estrutura metálica, câmeras e sensores) fique em R$ 6 mil, com mais R$ 1 mil em lâmpadas. “Depois barateia, pode fazer por metade desse valor, porque uma empresa pode comprar lotes dos componentes por um preço mais acessível”. Já a parte de software é possível utilizar os abertos ou desenvolver sem custos. “A gente não sai do zero, mas pega coisas prontas, gratuitas, que funcionam muito bem, como os algoritmos de slam (simultaneous localization and mapping – o mapeamento do ambiente) e de reconhecimento de objetos móveis (o doutorando Sergio desenvolveu um para a dissertação do mestrado)”.
A intenção é transformar o robô num produto, futuramente, após terminar a pesquisa. “Depois desta pandemia, acho que as pessoas gastariam R$ 500 ou 600 para adquirir um robô que faça a desinfecção dos ambientes nos quais elas circulam. Há a possibilidade de desenvolver um robô num formato menor para desinfecção de domicílios. As pessoas mudaram o comportamento de higiene; as cidades, espaços públicos e privados assim como as casas irão se estruturar no sentido de se preparar melhor para uma próxima pandemia. Fomos pegos de surpresa nesta pandemia, ninguém imaginou que ia ser deste tamanho. Os governos, empresas e pessoas vão ter interesse maior em se prevenir e se proteger mais”, finaliza Patricia.
Fonte: Agecom