Por Marcelo Carvalho
O texto de Lucas 18:2-5 (versão Almeida Corrigida Fiel) conta que
“Havia numa cidade um certo juiz, que nem a Deus temia, nem respeitava o homem. Havia também, naquela mesma cidade, uma certa viúva, que ia ter com ele, dizendo: Faze-me justiça contra o meu adversário. E por algum tempo não quis atendê-la; mas depois disse consigo: Ainda que não temo a Deus, nem respeito os homens, Todavia, como esta viúva me molesta, hei de fazer-lhe justiça, para que enfim não volte, e me importune muito.”
Não se pretende traçar um paralelismo entre o personagem do juiz iníquo da parábola e os ministros da suprema corte, pois, se acreditamos que há merecimento, então é inimaginável que uma corte auto revestida de pompa e circunstância e tão onerosa ao contribuinte (servida em situações especiais com lagostas e vinhos premiados) possa abrigar pessoas iníquas. Do contrário, estaríamos diante da mais alta degeneração de um dos poderes da república, algo que seria inaceitável e que não se sustentaria por muito tempo, pois sabemos que um “reino” dividido não se sustenta.
Mas, se conjecturamos que não é a iniquidade que torna semelhante o juiz da parábola e os ministros do STF, então talvez haja algo similar entre eles no que se refere ao aspecto central da parábola que é a injustiça.
Com efeito, como analisei em um texto anterior, a injustiça refere-se à assimetria com que os ministros fazem a leitura das manifestações da direita conservadora e da esquerda. Assim, somente advirá a imagem de justos juízes quando forem delineados precisamente, e igualmente aplicados as manifestações da direita e da esquerda, os critérios que tornam uma manifestação antidemocrática.
Nisso, tanto a PGR quanto o STF parecem perdidos. Mas, que não se iludam, pois serão devidamente expostos ao público e por ele execrados e criticados caso o rigor com que enquadram uns não seja aplicado igualmente a todos.
Voltando à parábola, também não se pretende traçar um paralelismo entre o personagem da viúva e os conservadores, pois, diferente da viúva que é submetida a um mal causado por outrem e recorre ao juiz por justiça, em nosso caso o mal causado aos conservadores se materializa na forma de indiciamentos e prisões arbitrárias que decorrem de processos absurdos sob exame do próprio juiz.
Mas, examinando a viúva da parábola, há algo de similar entre ela e os conservadores que se percebe no inconformismo dela diante de um juiz que se recusa a fazer justiça. Mostra também que mesmo pessoas perversas e de má consciência, que a princípio não temem a Deus e nem respeitam os homens, podem ser derrotadas pela tenacidade de quem não descansará até que haja justiça.
Avançando um pouco no texto da parábola e examinando os versos 6,7 de Lucas 18 nós vemos que
“E disse o Senhor: Ouvi o que diz o injusto juiz E Deus não fará justiça aos seus escolhidos, que clamam a ele de dia e de noite, ainda que tardio para com eles?”
Acrescido desses versos, a parábola aponta para um pressuposto moral de ordem mais elevado que é referenciado em Deus e que supera a justiça que deriva de uma mentalidade puramente humana sujeita a erros e típica do que se aprende nos cursos de direito e que vemos bem representada nos julgamentos da suprema corte.
É dessa referência ao Transcendente e da busca pela sua justiça que se fomenta um espírito inquebrantável, resoluto e disposto ao sacrifício que faz com que cristãos convictos lutem com as armas intangíveis de uma reta consciência que não se contenta com a “justiça” de juízes injustos.
E é dessa reta consciência que sempre remete a Deus, sendo neste processo corrigida e dirigida por Ele, que se faz o “bom combate” que o apóstolo Paulo menciona em suas cartas e que demanda uma atitude onde o indivíduo não separa sua forma de agir e de pensar dos elevados princípios cristãos que o definem.
E é do bom combate que esses elevados princípios se propagam transformando toda a sociedade com reflexos inclusive na vida pública. A sua importância é evidente, basta lembrar que pautas como o aborto só ganharam força pela omissão e atraso em se afirmar esses princípios.
Fica claro então a superioridade moral a que são chamados os conservadores e o convite que se reflete na forma como a viúva perseguiu a justiça ao expor a injustiça do juiz. Assim, a luta dos conservadores deve ser a mesma, contrariando com nossas ações a tese que os juízes usam para nos prender atribuindo-nos a pecha de antidemocráticos. Aceitando e desejando as odiosas ordens de prisão, revelaremos quem de fato pratica o autoritarismo e a injustiça.
Assim, se sabemos a infinita grandiosidade de quem esperamos justiça, alguém ainda se importa ou teme o que fazem 11 ministros do STF, meros mortais tão imperfeitos como qualquer outro cidadão, ou se suas decisões são justas, ou se expedirão mandados de busca e apreensão e ordens de prisão arbitrárias?
Façamos então o bom combate convencidos que cada um de nós que cair impulsionará outros a ocuparem seu lugar. Os que agora estão injustamente presos (Oswaldo Estáquio, Sara Winter , Antônio Bronzeri e Jurandir Alencar), e outros que logo estarão, mas que se mantêm resolutos nas suas convicções, nos apontam o caminho da resistência. Assim, aquele que tem capacidade de escrever que escreva. Outro que seja dotado da boa comunicação e do poder de análise e que tem seu canal de mídia independente que continue seu trabalho. Os que simplesmente ocupam as ruas manifestando-se a favor da liberdade que não deixem de fazê-lo.
Que cada um de nós prossiga na luta pelo direito à livre expressão, pois não temos como perder. A perseguição a que estamos submetidos demonstra a excelência dos nossos valores e antecipa a derrota e a humilhação de nossos adversários.
Marcelo Carvalho é professor do Departamento de Matemática
Os artigos publicados nesta seção não refletem necessariamente a opinião da diretoria e/ou dos filiados da Apufsc.