Novo dirigente do MEC prometeu ampliar o diálogo com o Congresso, instituições de ensino e entidades de classe
O presidente Jair Bolsonaro decidiu ouvir a ala militar e nomeou o economista Carlos Alberto Decotelli para comandar o Ministério da Educação. A escolha surpreendeu o próprio indicado, que recebeu o convite em uma reunião de última hora, além de auxiliares mais próximos do presidente, que percebiam movimentações da ala associada ao ideólogo Olavo de Carvalho e de integrantes do Centrão para emplacar seus favoritos. Decotelli já havia presidido o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) no início do governo. Agora, promete gestão técnica e baseada no diálogo, sem priorizar questões ideológicas.
Desde que Abraham Weintraub deixou o comando do MEC, na semana passada, Bolsonaro consultou diferentes núcleos do governo para definir o substituto. Dos ministros palacianos, ouviu que o melhor seria priorizar resultados práticos e afastar a pasta de polêmicas. Oficial de reserva da Marinha, Decotelli foi elogiado por seus pares pela formulação de políticas de educação ainda durante a transição de governo, em 2018, e pela condução do FNDE, embora tenha ficado apenas seis meses à frente do cargo. Ele foi substituído pelo advogado Rodrigo Sergio Dias, indicado à época pelo presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ). A segunda nomeação também durou poucos meses.
A passagem de Decotelli pelo FNDE foi marcada por ao menos uma polêmica. O novo ministro da Educação era o presidente do órgão quando foi publicado um edital de R$ 3 bilhões para a compra de computadores, notebooks, projetores e lousas digitais para alunos das redes públicas estaduais e municipais. O pregão, no entanto, foi suspenso pela Controladoria-Geral da União (CGU) por suspeitas de fraudes.
A auditoria da CGU apontou que a licitação estimou a compra de um número maior do que o necessário de computadores para atender a rede pública. Uma escola com 255 alunos em Itabirito (MG), por exemplo, receberia 30.030 laptops educacionais, em gasto estimado em R$ 54,7 milhões. Decotelli deixou o FNDE uma semana depois da publicação do edital.
Após deixar o FNDE, Decotelli voltou às atividades acadêmicas, meio ao qual se dedicou na maior parte de sua carreira. Com 67 anos, o novo ministro é financista, autor de livros, possui currículo com pós-doutorado na Bergische Universitãt Wuppertal, na Alemanha; doutorado em administração financeira pela Universidade Nacional de Rosário, na Argentina; e mestrado em administração pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), além de outras formações na área.
Logo após a nomeação, Decotelli falou a emissoras de TV em frente ao MEC. O novo ministro afirmou que Bolsonaro pediu foco em gestão e ampliação do diálogo na Pasta, e não tocou em questões ideológicas, característica que marcou os últimos titulares do MEC.
“Não houve nenhuma demanda ou fala sobre questão ideológica, até porque não tenho nenhuma competência ideológica, a minha formação é área de gestão e finanças, meus livros são de gestão financeira, eu sou um gestor de finanças e administração”, disse Decotelli. “Não tenho competência para fazer adequação ideológica”.
O novo ministro afirmou que Bolsonaro o recomendou a aplicar ciência e integração “para entregar a melhor política pública para a educação do Brasil”.
Ao citar sua experiência acadêmica, Decotelli afirmou que sua intenção é “que o MEC seja uma grande sala de aula”, com foco também em gestão e correção de projetos. Prometeu ampliar o diálogo com o Congresso, instituições de ensino e entidades de classe.
Decotelli é oficial da reserva da Marinha e coordenou atividades na Escola de Guerra Naval, onde fez contatos que são cultivados até hoje. Além dos ministros militares, oficiais mais veteranos que estão no governo apoiaram a escolha.
Ao mesmo tempo em que atendeu seus principais conselheiros no Planalto, Bolsonaro desagradou à ala ideológica, responsável pela defesa ferrenha do governo no Congresso, em manifestações de rua e redes sociais, além do filho Carlos, um dos defensores da linha pregada por Olavo de Carvalho.
Bolsonaro afirmou que a escolha do professor para o MEC foi “muito difícil”. Segundo o presidente, quatro nomes foram apresentados para comandar a Pasta e eram escolhas “sensacionais”. Bolsonaro, no entanto, disse que Decotelli foi escolhido “pela idade e pelo currículo mais extenso”, e elogiou outro cotado, o secretário de Educação do Paraná, Renato Feder. Segundo interlocutores do presidente, Feder foi descartado por ter apoiado o governador de São Paulo, João Doria (PSDB). O secretário doou recursos ao tucano em 2016, na campanha pela Prefeitura de São Paulo.
No comando do MEC, Decotelli terá de lidar com os interesses do Centrão nos recursos milionários do FNDE. Integrantes do grupo político indicaram Marcelo Lopes, ex-chefe de gabinete do senador Ciro Nogueira (PP-PI), para comandar o órgão. O Centrão estuda retomar a licitação de R$ 3 bilhões, que foi suspensa pela CGU.