Dirigente da entidade vê universidades concluindo semestres deste ano somente em 2021 e diz que governo alega trâmites burocráticos para manutenção da data
Diante dos apelos pelo adiamento do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) por conta da pandemia da Covid-19 e da paralisação em diversas universidades e escolas do país, a Associação Nacional de Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) defende que a necessidade de adiamento seja levada em conta pelo Ministério da Educação. A avaliação é do presidente da entidade, João Carlos Salles, que também vê ruído entre a comunicação do governo e o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), que estaria aberto ao diálogo.
As declarações foram feitas em uma coletiva de imprensa com jornalistas por meio de vídeoconferência na manhã de segunda-feira (11). Salles lembrou o posicionamento de dez universidades fluminenses, incluindo a Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a maior do país, pelo adiamento do exame.
“Houve uma manifestação importante, que não pode ser ignorada pela sua força, de um conjunto de instituições no Rio. É natural que as universidades de um estado que enfrenta uma situação aguda alertassem para os riscos de manter esse calendário. Não podemos aqui dissimular a gravidade da situação. Sem dúvida alguma seria irresponsável da nossa parte”, avaliou Salles, que também é reitor da Universidade Federal da Bahia (UFBA).
O presidente da Andifes afirma manter diálogo com o Ministério da Educação (MEC), que, por sua vez, apresenta argumentos burocráticos.
“A Andifes tem entendido que o anúncio formal da manutenção do calendário pelo Inep significava apenas um processo necessário para licitações e medidas necessárias para a realização do exame. Há a impressão de que se necessário, e parece necessário, o calendário poderia ser alterado pelo Inep. Isso, no entanto, tem entrado em conflito com propagandas oficiais do governo, o que nos preocupa”, disse Salles.
Para o dirigente da associação, se movido por trâmites burocráticos na defesa da manutenção das datas do Enem, o Inep deveria sinalizar que a medida será tomada sem prejuízo aos estudantes brasileiros.
Na última segunda-feira, o MEC lançou uma campanha publicitária com o mote “o Brasil não pode parar”, com o intuito de rebater críticas ao não adiamento do Enem. A peça foi criticada por candidatos, que enfrentam dificuldades com escolas e cursinhos paralisados por conta da disseminação da Covid-19 pelo país. Além disso, o ministro Abraham Weintraub declarou que a prova “não foi feita para corrigir injustiças” e que o Enem “é uma competição”.
Volta às aulas
João Carlos Salles também comentou as perspectivas de retorno às atividades nas universidades federais. Segundo a Andifes, 59 das 69 instituições estão paralisadas. Com o agravamento da situação do país e o semestre cada vez mais próximo do fim, a situação do calendário acadêmico tem provocado angústias entre estudantes. O dirigente, no entanto, afastou a possibilidade de cancelamento de semestres, mas alerta que as atividades podem invadir o ano de 2021:
“O ano civil e o ano letivo não coincidem. Nós sabemos disso. As universidades sempre tiveram interrupção de atividades e a reprogramação de seus calendários. Claro, cada universidade tem autonomia para deliberar a esse respeito. Nossas atividades de 2020 podem entrar pelo ano de 2021, como acontece, aliás, quando há paralisações e greves.”
O processo, reforçou o presidente da Andifes, deve ser feito de forma planejada.
“Voltar significa assumir responsabilidades, ter planos precisos. Não se volta de qualquer maneira. Nossos espaços presenciais talvez não estejam preparados para prover todas as formas de higienização. Um planejamento concreto deverá ser feito”, avaliou Salles. “A vida é um valor que não se precifica, que não se calcula. Sobretudo não se reduz a um preço. A reprogramação dependerá dos cenários a serem colocados. O essencial é garantir a saúde da nossa população, evitar que ela se exponha, e ao mesmo tempo garantir que nossa continuidade se faça em condições de qualidade.
Segundo o dirigente da Andifes, a entidade está estudando cenários futuros para avaliar quais medidas serão necessárias, incluindo a readequação de espaços, a utilização de equipamentos de proteção individual e procedimentos de higiene reforçada no cotidiano das aulas. Salles chamou atenção para os problemas das chamadas ações remotas, ou seja, medidas de ensino a distância por meio da internet, como a falta de acesso à internet pela parcela expressiva dos estudantes Brasil afora. A Andifes organiza um seminário nacional sobre o tema.
“É preciso pensar nesse cenário como conjugar nesse cenário futuro ações remotas e presenciais. A universidade é essencialmente presencial, lugar de conjugação de ensino, pesquisa e extensão. Não é apenas distribuição de conteúdos . É preciso que os saberes se encontrem. Não cabe à universidade pública agir no improviso. Mas estamos vivendo uma pandemia, uma situação de calamidade. Não estamos de férias nem de greve”, pontuou Salles.