Nove estados, entre os quais Santa Catarina, já tomaram medidas para aliviar o distanciamento social e outros dois anunciaram planos de levantar parcialmente a quarentena
A flexibilização
das regras de isolamento no Brasil é precipitada e pode acabar levando ao
colapso do sistema de saúde e até a medidas ainda mais restritivas de
confinamento, segundo especialistas ouvidos pelo Estadão. Além
do Distrito Federal, ao menos nove estados, entre os quais Santa Catarina, já tomaram
medidas para aliviar o distanciamento social e outros dois (São Paulo e Mato
Grosso) anunciaram planos de levantar parcialmente a quarentena. O presidente
Jair Bolsonaro defende um retorno à normalidade.
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS),
alguns critérios são fundamentais para a flexibilização das medidas de
isolamento, como o controle da transmissão e a capacidade dos serviços de saúde
de absorver novos pacientes. “Algumas premissas são muito importantes,
como estar na etapa de estabilização ou, de preferência, de queda no número de
novos casos da doença”, explicou o infectologista Fernando Bozza, chefe do
Laboratório de Medicina Intensiva do Instituto Nacional de Infectologia Evandro
Chagas, da Fiocruz, e coordenador de pesquisa do Instituto D’Or.
“O segundo ponto
crucial é que o sistema de saúde não esteja sob grande estresse; até porque, se
algo der errado, a situação será dramática. A terceira premissa é termos
capacidade de testagem, diagnóstico e vigilância. Precisamos ter essas três
condições para começarmos a conversar sobre flexibilização ou é precipitado.”
O país, hoje, não atende a nenhuma dessas
premissas. O número de novos casos está em ascensão, os hospitais públicos dos grandes
centros estão lotados e o número de testes e diagnósticos é muito aquém do
ideal. “Neste momento nos parece muito temeroso avançar com uma
flexibilização”, afirmou a especialista em gestão de saúde Crystina
Barros, integrante do grupo técnico de enfrentamento à Covid-19 da UFRJ.
“Provavelmente vamos acabar levando a uma sobrecarga do sistema de saúde
em dez ou 14 dias e até mesmo a um lockdown (medidas de quarentena ainda mais
rígidas do que as atuais).”
Embora já tenhamos cumprido cinco semanas de
isolamento, dizem especialistas, adotamos as medidas de confinamento em um
momento mais inicial da epidemia, em comparação a outros países. Estamos pelo
menos dez dias antes de Espanha, Itália e Estados Unidos, na linha do tempo da
doença. Nesses países, o número de novos casos já começa a se estabilizar.
Outro problema no Brasil é a tendência de
interiorização da epidemia, o que vai demandar serviços mais especializados de
saúde no interior e pressionar os centros maiores.
10
semanas
Nesta
quinta-feira, uma das mais prestigiadas revistas médicas do mundo, o New England Journal of Medicine, publicou um editorial defendendo que são necessárias pelo menos dez semanas
de trabalho intenso para conseguir parar a doença.
O texto, assinado pelo médico Harvey Fineberg,
especialista em políticas de saúde, defende, além de medidas de isolamento,
ações de organização do comando da saúde, testagem em massa, pesquisas e
proteção aos profissionais. Uma das estratégias é dividir a população em grupos
de infectados (casos graves e leves), casos presumidos, e pessoas expostas e
tratá-las ou isolá-las rigorosamente.