Bolsonaro convoca para ato anti-Congresso: confira as reações

Vídeo compartilhado pelo presidente chama para manifestação de extrema direita contra parlamentares

O site BR Político, canal do jornal Estado de S. Paulo, revelou na terça-feira (25) que o presidente Jair Bolsonaro compartilhou, usando o WhatsApp, um vídeo em que convoca seus apoiadores para um ato de extrema direita contra o Congresso em 15 de março.

“Ele comprou a briga por nós. Ele desafiou os poderosos por nós. Ele quase morreu por nós. Ele está enfrentando a esquerda corrupta e sanguinária por nós. Ele sofre calúnias e mentiras por fazer o melhor para nós. Ele é a nossa única esperança de dias cada vez melhores. Ele precisa de nosso apoio nas ruas”, diz o vídeo, que tem pouco mais de um minuto e meio de duração, com o Hino Nacional sendo executado por um saxofone.

“15 de março. Gen Heleno/Cap Bolsonaro. O Brasil é nosso, não dos políticos de sempre”, mensagem que acompanha o vídeo compartilhado por Bolsonaro. A menção ao general Augusto Heleno, ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, se deve ao fato de o militar ter dito, em 19 de fevereiro, que os parlamentares estavam chantageando o governo.

“Nós não podemos aceitar esses caras chantagearem a gente o tempo todo. Foda-se”, disse o ministro. Ele estava num evento com outros ministros e o áudio foi captado por uma transmissão ao vivo da equipe da Presidência da República.

A confirmação e a resposta presidencial


Após a revelação de que Bolsonaro estava, ele mesmo, convocando uma manifestação contra um outro Poder da República, o ex-deputado federal Alberto Fraga, amigo pessoal do presidente, confirmou ao jornal Folha de S.Paulo que o presidente encaminhou o vídeo para ele. “Eu recebi um vídeo, ele [presidente] me encaminhou. Mas não foi ele que fez o vídeo. Confesso que não entendi assim [como um incentivo à manifestação]. Ele nunca fez esse tipo de pedido. Quem está fazendo isso são os bolsonarianos pelas redes sociais. Para mim mesmo ele não falou absolutamente nada“, afirmou.

No Twitter, Bolsonaro afirmou que a revelação da existência do vídeo é uma tentativa de tumultuar a República. “Tenho 35 milhões de seguidores em minhas mídias sociais, com notícias não divulgadas por parte da imprensa tradicional. No Whatsapp, algumas dezenas de amigos onde trocamos mensagens de cunho pessoal. Qualquer ilação fora desse contexto são tentativas rasteiras de tumultuar a República”, disse.

As reações ao vídeo de Bolsonaro


O fato de Bolsonaro ter compartilhado o vídeo e endossado as manifestações de extrema direita contra o Congresso causou reações rápidas de diversas figuras da política nacional, das mais diferentes vertentes ideológicas.

O que disse Lula


O ex-presidente Lula, principal adversário político de Bolsonaro, se manifestou usando sua conta no Twitter. “Bolsonaro e o general Heleno estão provocando manifestações contra a democracia, a constituição e as instituições, em mais um gesto autoritário de quem agride a liberdade e os direitos todos os dias. É urgente que o Congresso Nacional, as instituições e a sociedade se posicionem diante de mais esse ataque para defender a democracia”, escreveu o líder petista.

“O que o Brasil precisa é gerar empregos, tirar o povo da pobreza. Bolsonaro nunca combinou com democracia. É um falso patriota que entrega nossa soberania aos EUA e condena o povo à pobreza. Um falso moralista que acoberta o Queiroz e outros corruptos e criminosos”, concluiu.

O que disseram FHC e Doria


O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso também se posicionou no Twitter contra o ato. “A ser verdade, como parece, que o próprio presidente tuitou convocando uma manifestação contra o Congresso (a democracia) estamos com uma crise institucional de consequências gravíssimas. Calar seria concordar. Melhor gritar enquanto se tem voz, mesmo no Carnaval, com poucos ouvindo”, afirmou o líder tucano.

O governador de São Paulo, João Dória, se manifestou na mesma rede social, condenando a convocação. “O Brasil lutou muito para resgatar sua democracia. Devemos repudiar com veemência qualquer ato que desrespeite as instituições e os pilares democráticos do país. Lamentável o apoio do Presidente Jair Bolsonaro a uma manifestação contra o Congresso Nacional”, disse o tucano.

O que disse Ciro Gomes


O ex-governador do Ceará e terceiro colocado na eleição presidencial de 2018, Ciro Gomes repudiou a convocação, também usando o Twitter. “É criminoso excitar a população com mentiras contra as instituições democráticas e sem causa nenhuma, a não ser sua agenda anti-pobre, anti-produção e entreguista de nossas riquezas aos estrangeiros. Vamos lutar pela preservação da Constituição e pelo Brasil”, disse o pedetista.

“Que o Congresso, sob as lideranças de Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre, e o STF, com todos os Ministros, saibam reagir a essa ameaça”, acrescentou. Até a manhã de quarta-feira (26), Maia e Alcolumbre não haviam se manifestado publicamente.

O que disseram os líderes da oposição no Congresso


O deputado federal Alessandro Molon (PSB-RJ), líder da oposição na Câmara, usou o Twitter para repudiar a convocação contra o Congresso. “Basta! O próprio presidente convoca ato contra a democracia? Como Bolsonaro não consegue oferecer uma vida melhor ao povo, procura culpados: o Congresso, o Judiciário, a imprensa… As forças democráticas vão agir. Vamos nos unir para impedir outra ditadura”, disse.

O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), líder da oposição no Senado, também usou a rede social para se manifestar. “Chega! As forças democráticas precisam repudiar este comportamento vil e impedir a escalada golpista”, afirmou.

O que disseram ministros do Supremo


Celso de Mello, ministro do Supremo Tribunal Federal, mandou um posicionamento ao jornal Folha de S.Paulo, colocando-se contra a atitude do presidente. “O presidente da República, qualquer que ele seja, embora possa muito, não pode tudo, pois lhe é vedado, sob pena de incidir em crime de responsabilidade, transgredir a supremacia político-jurídica da Constituição e das leis da República”, disse.

O ministro Gilmar Mendes também usou o Twitter para se posicionar contra a convocação. “A CF88 [Constituição Federal de 88] garantiu o nosso maior período de estabilidade democrática. A harmonia e o respeito mútuo entre os Poderes são pilares do Estado de Direito, independentemente dos governantes de hoje ou de amanhã. Nossas instituições devem ser honradas por aqueles aos quais incumbe guardá-las”, disse.

O que disse a OAB


Felipe Santa Cruz, presidente da OAB, Ordem dos Advogados do Brasil, condenou a convocação compartilhada por Bolsonaro. “Entendo que é inadmissível, o presidente está mais uma vez traindo o que jurou ao Congresso em sua posse, quando jurou defender a Constituição Federal. A Constituição e a democracia não podem tolerar um presidente que conspira por sua supressão”, disse ao jornal Folha de S.Paulo.

Segundo Santa Cruz, o endosso do vídeo por parte do presidente pode ser enquadrado como crime de responsabilidade, passível de impeachment, conforme previsto no artigo 85 da Constituição Federal. De acordo com o inciso segundo do artigo, atentar contra o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos Poderes constitucionais das unidades da Federação é configurado como crime de responsabilidade. A lei 1.079/1950, a Lei do Impeachment, prevê que crimes de responsabilidade são passíveis de perda do cargo e inabilitação de até cinco anos para o exercício de qualquer função pública.

O que motiva a convocação de Bolsonaro


A mobilização contra o Congresso começou na quarta-feira da semana passada (19), com as declarações de Augusto Heleno. O pano de fundo da fala do ministro é a disputa em torno do Orçamento. Parlamentares querem mais controle sobre o gasto público, enquanto o governo busca manter o controle da distribuição de verbas.

No final de 2019, Bolsonaro vetou vários pontos da Lei de DIretrizes Orçamentárias que ampliavam as obrigações do governo quanto ao pagamento de emendas parlamentares. Agora, diante do impasse, os vetos podem ser derrubados.

Após a fala de Heleno, imagens convocando um ato contra o Congresso começaram a se espalhar pelas redes sociais. Uma delas dizia que “os generais aguardam as ordens do povo”, acompanhada de fotos dos generais Sérgio Etchegoyen, Hamilton Mourão (vice-presidente da República), Augusto Heleno (ministro) e Roberto Peternelli (deputado federal – PSL/SP).

Ao jornal O Estado de S. Paulo, Peternelli disse que não autorizou o uso da sua imagem, e disse que os pedidos para remover Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre de seus cargos “não é boa para ninguém”.

No Twitter, o general Carlos Alberto dos Santos Cruz, ex-ministro de Bolsonaro, classificou a imagem como irresponsável. “Não confundir o Exército com alguns assuntos temporários. O uso de imagens de generais é grotesco”, disse.

Também nas redes sociais, circulou um vídeo com ataques ao Supremo Tribunal Federal e ao PT, usando como trilha sonora a canção “Pulso”, dos Titãs. Arnaldo Antunes, ex-membro da banda, afirmou que as providências legais serão tomadas, já que a música foi usada sem a autorização do grupo.

No vídeo, ministros do STF e políticos como a ex-presidente Dilma Rousseff são chamados de “peste bubônica, câncer, pneumonia e leucemia”, doenças mencionadas na letra de “Pulso”.

As manifestações de maio de 2019


Em maio de 2019, com cinco meses de governo, Bolsonaro protagonizou outro momento de tensão com o Congresso e o Supremo envolvendo uma manifestação de extrema direita. No dia 17 daquele mês, o presidente compartilhou no WhatsApp um texto que dizia que o Brasil era “ingovernável” sem os “conchavos tradicionais”, insinuando ser vítima de um sistema corrupto.

A mensagem foi abraçada por apoiadores do presidente, e no dia 26 do mesmo mês, atos pró-Bolsonaro foram realizados em 156 cidades do país, com parte dos manifestantes pedindo o fechamento do Congresso. Não foi uma grande mobilização, como havia ocorrido no movimento pelo impeachment de Dilma Rousseff, nos anos de 2015 e 2016. Mas mostrou que Bolsonaro ainda tinha poder de levar apoiadores para a rua.

Dois dias depois do protesto, Bolsonaro se reuniu com Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara, e Davi Alcolumbre (DEM-AP), presidente do Senado, e Dias Toffoli, presidente do Supremo Tribunal Federal, em um café da manhã. Na reunião, eles discutiram um “pacto entre os Três Poderes”, que para formalizar metas de interesse da sociedade brasileira e também um entendimento entre os líderes.

A expectativa era de que o pacto fosse assinado em junho de 2019 mas, no mês seguinte, Bolsonaro disse que não era necessário que o acordo estivesse escrito em papel. “O que nós queremos e podemos fazer com a nossa união é um Brasil melhor para todos”, disse.

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