Especialistas temem guinada conservadora no órgão, responsável pela normatização de políticas importantes para a área
O Conselho Nacional de Educação (CNE), responsável pela normatização de políticas importantes para a área, passará por uma renovação significativa neste ano. Dos 24 conselheiros do órgão, 12 terão o mandato vencido, e seus substitutos serão escolhidos pelo governo. A mudança na composição do CNE acendeu o alerta entre atores da área, de especialistas a membros do Legislativo, que temem uma guinada conservadora no órgão.
A maior parte dos conselheiros que terminarão mandato ao final do primeiro semestre pertencem à Câmara de Educação Básica, que se debruça sobre temas que vão do ensino infantil ao médio. Sete membros poderão ser substituídos pelo governo nessa câmara. Já na de ensino superior, cinco cadeiras ficarão vagas. O governo pode reconduzir ao cargo conselheiros que estão no primeiro mandato, mas a aposta é de que o executivo escolha representantes mais alinhados às políticas governamentais.
“O CNE tem um papel bastante importante na normatização da educação, atuou em políticas fundamentais como a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e a definição de diretrizes de formação docente. Observando as indicações feitas para o MEC, vemos que corremos o risco de uma ascensão conservadora. Sem dúvida as nomeações estarão mais suscetíveis a esses grupos”, opina Anna Helena Altenfelder, presidente do conselho de administração do Cenpec, uma das organizações da sociedade civil mais atuantes na área. “O CNE se caracteriza por ser um órgão bastante republicano e democrático, que promove o diálogo, a grande preocupação é uma composição conservadora passar por cima disso”, conclui.
Segundo decreto emitido em 1999, ao menos metade das indicações para integrar o colegiado deve ocorrer por meio de uma lista de nomes apresentada por entidades representativas da área, mas cabe ao Ministério da Educação (MEC) definir quais serão essas organizações. Nos últimos anos, entidades representativas como a União Nacional dos Estudantes (UNE), a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), e o Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed) compuseram a lista. O ministro da Educação seleciona os candidatos e apresenta os nomes elegíveis ao presidente, responsável por nomeá-los.
‘Base de sustentação’
Para o deputado Idilvan Alencar (PDT-CE), há espaço para que o MEC faça nomeações desconsiderando instituições que historicamente participaram do processo. Alencar é membro da Comissão de Educação da Câmara e foi presidente do Consed durante a discussão da BNCC. Na época, o CNE e o governo sofreram fortes pressões da bancada evangélica do Congresso para exclusão de temas sensíveis, como a questão de gênero. Termos relacionados ao assunto acabaram retirados do texto final da Base.
“Essa questão de representação das entidades como era historicamente feito no conselho não vai contar desta vez. Esse é um perfil desse governo”, critica Alencar, que pretende propor à Comissão de Educação um acompanhamento sobre o processo.
Um dos membros restantes do conselho cujo mandato não termina em 2020, o educador Mozart Neves Ramos, que foi cotado para assumir o MEC na transição e acabou sendo desconvidado após pressão de grupos conservadores, opina que é crucial para o governo nomear ao menos as indicações da Undime e do Consed. Ramos argumenta que ambas as entidades são fundamentais para implementar no âmbito municipal e estadual as políticas definidas pela União.
“Para qualquer gestão do MEC, é fundamental que haja base de sustentação com Undime e Consed. A bancada evangélica tem seus interesses, eles vão se movimentar e vão ter possíveis indicações, mas acredito que Consed e Undime vão manter seus indicados, porque, independentemente de quem for o ministro, ele sabe da importância disso”, conclui.
Fonte: O Globo