Por Rodrigo Maia, Presidente da Câmara dos Deputados, e Líderes*
Quem olha para a discrepante situação econômica de Brasil e China — o primeiro encontra dificuldades para crescer e tem uma economia calcada em commodities, enquanto o segundo apresenta uma pujança que ameaça os Estados Unidos — talvez não imagine que, até 1990, o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro era superior ao chinês.
O que aconteceu nestes quase 30 anos? Com olhar estratégico, a China investiu pesadamente em pesquisa e desenvolvimento. Hoje, é o segundo país no mundo que mais reserva dinheiro à área, dedicando dez vezes mais recursos que o Brasil por ano.
A capacidade de transformação propiciada pela educação e pela ciência e tecnologia é admirável. E os números não deixam espaço para dúvidas: é altíssima a correlação entre o desenvolvimento econômico dos países e seu investimento em pesquisa e desenvolvimento , vide Estados Unidos, Alemanha, Japão, Coreia do Sul e Israel. Nesta era em que a riqueza das nações é calculada por sua capacidade de geração de conhecimento e inovação, torna-se, portanto, ainda mais fundamental e estratégica a oferta de uma educação de qualidade desde cedo, o incentivo a jovens talentos, o apoio a pesquisadores e o suporte material para o brilhantismo aflorar.
A direção é clara. O governo brasileiro, no entanto, tem dado sinais em sentido contrário. Diante da crise econômica, em vez de ao menos manter os recursos voltados à área, o governo realizou um forte contingenciamento e tentou mudanças que poderiam ter desestruturado o Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Informação, que, ao longo dos anos, se consolidou como um projeto de Estado, perpassando variados governos e até mudanças de regime.
É falsa a ideia de que a fusão da Capes e do CNPq otimizaria a gestão do fomento científico ou geraria ganhos operacionais. Capes e CNPq são instituições com missões diferentes e complementares. A Capes, na estrutura do Ministério da Educação , avalia e dá suporte aos cursos de pós-graduação, onde são feitos 95% da pesquisa brasileira, dedicando-se ao aperfeiçoamento de pessoal do ensino superior. Já o CNPq , dentro do Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, fomenta projetos de pesquisa e incentiva jovens promissores, sendo responsável por um terço da pesquisa em ciência no país. Ambos tinham sofrido cortes severos, com potencial de afetar gravemente a produção de conhecimento no Brasil. Mas, após negociação da Câmara dos Deputados com o governo federal, conseguimos garantir o descontingenciamento desses recursos.
Cerca de 8 mil bolsas da Capes foram cortadas neste ano, e o orçamento para 2020 foi reduzido praticamente pela metade. No CNPq , os cortes para o orçamento do ano que vem chegam a 88% na seção de fomento a projetos e redes de pesquisa e desenvolvimento. Além disso, a Finep , agência de inovação brasileira, sofre com a ameaça de transferência do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) e a anexação dela mesma ao BNDES. Acontece que o próprio BNDES, onde o Fundo foi criado em 1969, entendeu por bem repassá-lo ao Ministério de Ciência e Tecnologia por concluir que não se deve misturar o financiamento de grandes empreendimentos empresariais e de infraestrutura com o financiamento de ciência e tecnologia.
O Fórum Econômico Mundial, em seu relatório global de competitividade, divulgado em outubro, destaca a importância de governos investirem em recursos públicos para impulsionar pesquisas, melhorar a qualificação dos trabalhadores e avançar na questão tecnológica. A insistência na desestruturação a que assistimos hoje ignora os caminhos apontados pela economia global, em que a ciência e suas aplicações assumem papel cada vez mais central nos processos de agregação de valor e na definição de reputações dos países.
Se, com o baixo investimento público em Pesquisa e Desenvolvimento, a ciência brasileira foi capaz de descobrir a ligação entre o vírus da Zika e a microcefalia, desenvolver plástico 100% biodegradável a partir de resíduos da agroindústria e tornar o Brasil uma referência na prospecção de petróleo em águas profundas, imaginemos onde poderíamos chegar com um investimento condizente com os desafios contemporâneos?
A Ciência e a Tecnologia não são a causa da crise que enfrentamos, mas podem ser a solução para esta e para outras. É assim que elas devem ser encaradas pelo governo, por qualquer governo, sob o risco de perdermos gerações de cientistas e investimentos realizados até agora. Aliadas à Educação, permitirão ao Brasil desenvolver produtos de alto valor agregado, trazendo mais riqueza e bem-estar para o nosso país e deixando para trás a mentalidade extrativista. É o que o Brasil do futuro cobra de nós no presente.
*Rodrigo Maia (presidente da Câmara dos Deputados); e as lideranças: Alessandro Molon (líder da oposição), Aguinaldo Ribeiro (da maioria), Jandira Feghali (da minoria), Paulo Pimenta (PT), Wellington Roberto (PL), Arthur Lira (PP), André de Paula (PSD), Baleia Rossi (MDB), Tadeu Alencar (PSB), Carlos Sampaio (PSDB), Jhonatan de Jesus (Republicanos), André Figueiredo (PDT), Elmar Nascimento (DEM), Augusto Coutinho (Solidariedade), Pedro Lucas Fernandes (PTB), José Nelto (Podemos), Ivan Valente (PSOL), André Ferreira (PSC), Daniel Almeida (PCdoB), Leandre (PV), Joenia Wapichana (Rede).
Leia na íntegra: O Globo