Movimento Escola Sem partido gera clima de perseguição aos professores, alertam especialistas
O Ministério da Educação (MEC) encaminhou um ofício ontem para as secretarias de Educação do país em que dá orientações sobre o respeito a crenças religiosas, pluralismo de ideias e sobre o veto de propagandas partidárias nas salas de aula, informa a Folha de São Paulo.
Segundo o ministro da Educação, Abraham Weintraub, o documento visa impedir “excessos dos educadores” e promover um “ambiente sadio” para os estudantes, onde eles não estejam sujeitos a automutilação e suicídio.
Os temas abordados no ofício remetem ao que é preconizado pelo movimento Escola sem Partido, que quer limitar o que os professores falam na sala de aula sob o argumento de que há uma extensa doutrinação de esquerda nas escolas brasileiras.
O texto encaminhado para as secretarias destaca que o ensino deve ser com base no pluralismo de ideias e concepções pedagógicasd+ que o aluno não pode ser prejudicado por sua história, identidades, crenças e convicções políticas ou religiosasd+ que ele não pode ser submetido à propaganda partidária e que tem o direito de seguir sua religião, além de não poder ser constrangido ou ameaçado.
Esses temas coincidem com o conteúdo de um cartaz que o Movimento Escola sem Partido defende que seja afixado dentro das salas de aula. O cartaz, com seis deveres dos professores, é previsto, inclusive, no projeto de lei em trâmite na Câmara, que tem apoio de parlamentares do PSL, partido do presidente Jair Bolsonaro.
Segundo o ministro da Educação, Abraham Weintraub, o objetivo é fomentar uma cultura de paz e não há relação com o movimento — que tem apoio do governo. O ministro disse que colocou à disposição canais de comunicação do MEC para o recebimento de casos que sejam considerados extremos.
“O nome do documento é Escola de Todos, qualquer outro termo não se credencia”, disse ontem o ministro em entrevista coletiva. “Queremos assegurar o melhor convívio escolar, no pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, respeito a diferenças, combate ao bullying e não exposição de política partidária dentro da escola”.
Não há evidências sobre a dimensão de casos de propagandas político-partidárias, ou de algo que possa ser denominado como doutrinação, na rede educacional de todo país. Educadores e estudiosos afirmam que os partidários do Escola sem Partido usam casos isolados para propagandear ataques a professores e grupos políticos.
Weintraub tem afirmado em várias oportunidades que se baseia em evidências para a tomar as decisões dentro da pasta, como nos cortes de orçamento realizados ao longo do ano. Questionado sobre quais estudos ou evidências respaldaram o envio do ofício, ele disse que vídeos recebidos deram fundamento.
“Eu nem estava tão próximo desse assunto no dia a dia, mas vi que ele está ganhando corpo e tem fundamento. Você vê uma série de vídeos com [professores] com uma postura totalmente inadequada em sala de aula”, diz.
O ministro ressaltou que o ofício trata de assuntos têm respaldo no que é previsto na legislação. “Estou respondendo com ação que vai gerar resultado de curto prazo”, diz. “O ofício é um simples chamamento a todos pelo bom senso”.
As discussões sobre Escola sem Partido ganharam corpo a partir de 2014, quando a família Bolsonaro fez as primeiras proposições legislativas relacionadas ao tema. O hoje senador Flavio Bolsonaro fez a proposta na Assembleia Legislativa, e ainda vereador Carlos Bolsonaro, na Câmara.
Em março de 2017, o ministro Luís Roberto Barroso (STF) suspendeu, em decisão liminar, uma lei que criava o programa Escola Sem Partido em Alagoas (no estado o texto foi batizado como Escola Livre). O tema ainda não foi apreciado definitivamente na corte.
Caberá às redes de ensino decidirem se vão adotar medidas relacionadas ao conteúdo do ofício. Mas a conclusão de especialistas é que, mesmo que não haja legislação nacional definida sobre o tema, as discussões relacionadas ao Escola sem Partido já têm colaborado com um clima de perseguição dentro das salas de aula.
No início do mês, Bolsonaro disse ter determinado ao MEC que redija um projeto de lei para proibir a abordagem de questões de gênero nas escolas de ensino fundamental. Weintraub evitou, no entanto, falar sobre como esse tema tem andado.
Confira: Folha de São Paulo /UOL