Pesquisador da UFSC recebe 1º Prêmio CBMM de Ciência e Tecnologia

“Desse prêmio que me  reconhece agora, 90% está ligado à minha trajetória na universidade”, diz  João Batista Calixto, professor aposentado da UFSC

Professor aposentado da UFSC e pesquisador em farmacologia, o biólogo João Batista Calixto, de 69 anos, recebeu o Prêmio CBMM de Ciência e Tecnologia na última quarta-feira (21). A cerimônia de entrega ocorreu no Museu do Amanhã, no Rio de Janeiro, com palestra do Prêmio Nobel em Economia 2018 Paul Romer.  Em entrevista à Estela Benetti, do Diário Catarinense, Calixto conversou sobre a premiação e disse estar preocupado com a maneira que a ciência vem sendo tratada nos últimos meses no país.

A premiação é uma iniciativa da Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração (CBMM) e nesta primeira  edição reconheceu dois cientistas: Calixto na categoria Tecnologia e o matemático Marcelo Viana na categoria Ciência. Nascido no interior de Minas Gerais, Calixto traz no currículo o desenvolvimento do primeiro medicamento 100% brasileiro e 24 patentes registradas no Brasil e exterior.

Confira a entrevista completa:

O que representa esse prêmio para o senhor?

Eu fiquei muito feliz com esse reconhecimento. Ao mesmo tempo, é uma responsabilidade enorme representar a classe científica. Este é o maior prêmio do Brasil em Ciência e Tecnologia. Foi  lançado pela CBMM, Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração, empresa que é líder mundial em fornecimento de produtos de nióbio e está presente em mais de 20 países. Ela pertence ao Grupo Moreira Salles, do Rio de Janeiro, que tem tradição em apoiar a ciência e a cultura.

Como iniciou sua trajetória e evoluiu para a pesquisa de fármacos?

Nasci no interior de Minas Gerais, vim para Florianópolis em 1976 e não saí mais. Ingressei como professor na UFSC. Desse prêmio que me reconhece agora, 90% está ligado à minha trajetória na universidade. Sou Biólogo pela Universidade de Brasília, mestre e doutor em farmacologia pela USP, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto. Sempre trabalhei muito com pesquisa básica. Com o Laboratório Catarinense, de Joinville, eu fiz a minha primeira parceria como cientista. Em 2010, fui convidado para criar o Centro de Inovação e Ensaios Pré-Clínicos (CIEnP) em Florianópolis e em 2013 me aposentei na UFSC. Agora, só trabalho na área de inovação no CIEnP. A instituição mantém parcerias com a UFSC. Eu também participo de diversas entidades científicas do Brasil.  

 

Qual é a importância dessa iniciativa da CBMM numa fase em que cientistas de universidades são criticados e há falta de recursos?

Esta é a primeira edição do Prêmio CBMM. O momento foi feliz. Traz um certo alento, de que as coisas podem melhorar. É uma empresa que não tem nada a ver com a minha área de atuação. E o outro pesquisador premiado é da área de matemática. Essa é uma premiação aberta a toda a comunidade científica. Espero que outras empresas também possam apoiar a ciência, a inovação, a cultura e as artes. No Brasil, isso ainda não é comum.

Como o senhor avalia os cortes de recursos para pesquisas e polêmicas políticas na área?

Esse prêmio mostra o valor da ciência. Não consigo entender como as pessoas não percebem a importância da ciência. Medicamentos, tecnologias, tudo vem da pesquisa e inovação. É muito difícil ver que a alta cúpula do país não dá valor a ciência, que é a base de tudo. Mas eu acho que é muita ideologia, eu tenho esperança de que as coisas vão mudam. As crises não são de todas ruins. Acho que geram reflexões e abrem caminhos. Ninguém esperava essa mudança agora, essas polêmicas sobre pesquisas. Muitas pessoas receberam bolsas do CNPq e da Capes. Fica quase impossível acreditar que isso está acontecendo. A minha sugestão é que a gente tem que persistir e mudar esse quadro.

Que prejuízos o país tem com a fuga de cérebros?

Os mais jovens estão enfrentando um desemprego absurdo. Temos um grande desemprego no Brasil de pessoas com baixa qualificação, mas temos também muitos doutores e pós-doutores sem colocação no mercado. Essa fuga de cérebro gera dois grandes prejuízos ao Brasil: fará falta quando for retomado o crescimento econômico e também o país perde investimento de alta qualidade. Isto porque o Brasil gastou grande quantidade de recursos para formar essas pessoas, elas vão de mão beijada lá para fora e muitos não voltam mais para contribuir aqui. Cada dia você vê mais notícias negativas. Eu já vi muitas crises. Talvez essa seja a mais forte. Mas também vai passar. Outra que pesou muito foi a do governo de Fernando Collor. Mas naquele momento o Brasil não tinha investido tanto em recursos humanos quanto nos últimos 20 anos.  

O que mais preocupa o senhor no atual cenário?

Chama a atenção o fato de o país estar se desindustrializando. Florianópolis tem o maior polo de startups e empresas inovadoras do Brasil em relação ao total de habitantes. Isso é resultado da educação. Não há solução para os problemas do mundo sem ciência e inovação. Está muito difícil, mas temos que ser resistentes, lutar. Se fala em suspender 84 mil bolsas do CNPq. São recursos necessários para a formação dos profissionais e, se for cortado, tudo o que foi investido até agora se perde. É diferente de você começar um prédio e, se não tem dinheiro, deixa para retomar mais adiante aproveitando o que já foi feito. Se o estudante para, perde todo o curso. Este momento é muito preocupante para a ciência no Brasil. Nunca teve tanta disputa ideológica como agora.

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