O governo Bolsonaro conseguiu inflamar as ruas e também o Congresso Nacional. É o que mostra uma reportagem do El País, publicada hoje, que aponta uma série de decisões atabalhoadas e desencontradas que se mostraram um tiro no pé para o Planalto.
Na quarta-feira (15), enquanto estudantes protestavam contra os cortes na educação pelas cidades brasileiras e eram chamados de “idiotas úteis” pelo presidente, deputados davam um claro recado de que o apoio ao Governo está fincado em areia movediça, ao sabatinarem por mais de seis horas o ministro da Educação Abraham Weintraub.
O último ministro que havia sido convocado para prestar esclarecimentos no Congresso Nacional havia sido Cid Gomes, no momento em que a ex-presidente Dilma Rousseff começava a se desgastar no parlamento. Ficou horas batendo boca com deputados e acabou demitido.
O destino a que chegou Bolsonaro é complicado: enfrenta um desgaste popular capilarizado e com potencial explosivo, ao mesmo tempo que não consegue juntar apoio no Parlamento sequer para evitar uma convocação de ministro. E tudo isso antes mesmo de completar seis meses de Governo.
A confusão teve origem há cerca de dois meses, quando um decreto presidencial e uma portaria contingenciaram 29,4% do Orçamento dos principais órgãos da União. Sem saber explicar esse bloqueio orçamentário numa área essencial para o país, o ministro da Educação afirmou que, no caso de sua pasta, que perdeu R$ 7,4 bilhões (31,4% do Orçamento próprio), a decisão tinha caráter ideológico, já que ele cortaria recursos de universidades que “cometiam balbúrdias”. E, assim, acabou tragado para a fúria das redes sociais e para uma convocação para depor na Câmara dos Deputados – algo que só costuma acontecer em governos sem base de apoio sólida ou enfraquecidos.
A convocação de Weintraub (por 307 votos a 82) foi uma demonstração do esfacelamento da base de apoio de Bolsonaro na Câmara. “Quando assumiu, Bolsonaro tinha uns 200 deputados que queriam tirar selfie, gravar uma live com ele. Estávamos apaixonados. Hoje, acho que só os do PSL querem”, avaliou o governista Otoni de Paula (PSC-RJ). Segundo ele, Bolsonaro perdeu o momento correto para criar um alicerce na Casa e terá trabalho dobrado para fazê-lo, já que pouco dialoga com os parlamentares.
A ida do ministro ao Plenário nesta quarta serviu para expor ainda mais o Governo. Enquanto o ministro era sabatinado, os ânimos ficaram exaltadíssimos. Deputados do PSOL, do PSL e do PSD precisaram ser contidos para não se agredirem. Ao ser provocado, Weintraub rebatia. Deu poucas respostas diretas. Não explicou os critérios para contingenciar de maneira distintas as universidades e os institutos federais. Criticou os Governos Lula e Dilma, disse que a responsabilidade pelo contingenciamento era dessas gestões e confrontou parlamentares que o provocavam. Ainda assim, afirmou que estava disposto a conversar com todos, inclusive com os opositores.
“Eu dou a outra face e continuo aberto ao diálogo”. Além disso, tentou fazer uma contabilidade criativa. Dizia que o contingenciamento na Educação era de 3,5%. Mas a apresentação que ele próprio fez aos parlamentares mostra que o bloqueio era de 31,4% —a diferença está na base usada para calcular os cortesd+ a do ministro considera o Orçamento total, o que inclui gastos obrigatórios, como o dos salários, que não podem ser cortadosd+ o segundo, gastos não obrigatórios, ou seja, custeio e investimentos.
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