Na ciência, estrangulamento orçamentário continuará em 2019

O orçamento de 2019 está aprovado e as perspectivas para o setor de ciência, tecnologia e inovação não são boas. No cômputo final, o Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) terá R$ 15,339 bilhões para o próximo ano, um acréscimo de 20,55% em relação a 2018. Mas esse aumento não implicará em nenhum centavo a mais para os investimentos nos programas finalísticos da pasta.

Isto porque esse acréscimo se dá por dois fatores sem relação com as despesas correntes, grupo de despesa onde realmente se dá a aplicação de recursos para os projetos de CTEI. O primeiro fator é o aumento de mais de 45% da Reserva de Contingência relacionada ao ministério. Mais de R$ 5 bilhões do volume total de recursos para o MCTIC serão “capturados” pelo Tesouro Nacional a título de composição da reserva, prevista na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

Quase a totalidade desses recursos vem do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), criado para fomentar o setor. A verba – que deveria ser “carimbada”, ou seja, destinada em sua totalidade para os diversos fundos setoriais gerenciados pelo FNDCT – tem sido sistematicamente transferida para a Reserva de Contingência, deixando a descoberto o fundo de fomento. Em 2019, o orçamento geral do FNDCT será de R$ 4,238 bilhões, mas apenas R$ 841 milhões serão destinados aos projetos financiados pelos fundos setoriais, menos de 20% da arrecadação.

O segundo fator de distorção no orçamento geral do MCTIC é o volume atípico de recursos previstos para Inversões Financeiras em 2019. Houve um acréscimo de mais de 750% nas verbas destinadas a esse tipo de operação no orçamento, que consiste na aquisição de títulos, ações, imóveis e outros bens que resultem no aumento de capital de empresas públicas. Essas inversões estão concentradas em programáticas da Empresa de Correios e Telégrafos (ECT) e da Telebrás, totalizando gastos de mais de R$ 1,3 bilhão no próximo ano.

Além disso, é importante frisar que quase um terço do orçamento geral do MCTIC destina-se às chamadas Despesas Obrigatórias: pagamento de pessoal e manutenção das instalações do ministério. Ou seja, feitos todos os descontos dos custos ministeriais e aportes em operações financeiras, o MCTIC terá pouco mais de R$ 4 bilhões para a cobertura de todos os projetos de CTEI e Comunicações no próximo ano, situação praticamente idêntica a 2018, onde vários órgãos correram risco de paralisar suas operações por falta de recursos.

Principais cortes

Entre os projetos diretamente geridos pelo MCTIC destacam-se os cortes no “Apoio a Projetos de PED para Tecnologias Sociais, Assistivas, Extensão Tecnológica e de Inovação para Inclusão Social e Desenvolvimento Sustentável”, que perderá 90,56% de suas verbas em 2019d+ e no “Fomento a Pesquisa e Desenvolvimento Voltados à Inovação e ao Processo Produtivo”, com corte de 74,56% no próximo orçamento. Entre os projetos estratégicos para o setor, a construção da infraestrutura do Instituto Nacional do Semiárido (Insa) terá uma redução de 52,38% nos recursos em relação à 2018.

As obras relacionadas ao estudo da biodiversidade, inovação tecnológica e sustentabilidade dos ecossistemas amazônicos frente às mudanças globais também terá orçamento 24% menor do que o destinado neste ano. O único projeto de larga escala que receberá um aumento nas verbas em 2019 é o recém-inaugurado Sirius, que contará com pouco mais de R$ 255 milhões frente aos R$ 218 milhões destinados em 2018.

Bolsas

Os dois principais órgãos responsáveis pelo pagamento de bolsas de estudo no Brasil seguirão em situação crítica caso o governo não emita créditos suplementares ao longo de 2019. No Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), os recursos para o custeio das bolsas de CTEI sofreram um corte de 26% no próximo orçamento. Com isso, o órgão terá apenas R$ 785 milhões para a cobertura dos bolsistas.

A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), junto com outras representações da comunidade científica e acadêmica, solicitou que o Congresso Nacional ampliasse os recursos para esta ação do CNPq em R$ 300 milhões, o que colocaria a rubrica no mesmo patamar de 2018. A demanda, no entanto, que também já havia sido considerada pelo governo, não foi atendida pelos parlamentares.

Vale lembrar que o CNPq já vem sofrendo com o estrangulamento das verbas. A garantia de manutenção das dotações no mesmo valor de 2018, longe de solucionar os problemas do órgão, apenas asseguraria o mínimo para que o CNPq cumpra seus compromissos com os bolsistas ativos. O corte confirmado na LOA 2019 pode, assim, colocar em risco novos editais da instituição e o pagamento das bolsas a partir de setembro do próximo ano.

Na Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), órgão ligado ao Ministério da Educação (MEC), os recursos para o custeio das bolsas de ensino básico terão um aumento de 18,45% em 2019, com um total de R$ 807 milhões. Para o ensino superior, o aumento foi de 6,77%, totalizando R$ 2,682 bilhões para a rubrica. No entanto, os aumentos ainda estão aquém da necessidade orçamentária para atender todas as demandas por bolsas de pesquisa feitas ao órgão. Assim como o CNPq, a Capes também ficou no limiar de suspender o pagamento de bolsas por falta de recursos em 2018.

Após um alerta público do Conselho Superior da Capes sobre o risco de interrupção dos pagamentos, a instituição conseguiu uma liberação de recursos para que o ano de 2018 pudesse ser concluído honrando os compromissos. A pressão da comunidade científica e acadêmica, após a manifestação do Conselho Superior da Capes, foi muito importante para esta complementação dos recursos de 2018 e a manutenção dos patamares em 2019.

Inmetro e INPI

Está em análise a possibilidade de que o Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro) e o Instituto Nacional da Propriedade Intelectual (INPI), hoje ligados ao Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC), passem para a alçada do MCTIC. Os dois institutos ainda estão atrelados ao MDIC na LOA 2019 e terão orçamentos bastante apertados em 2019.

O Inmetro terá um acréscimo em seu orçamento anual de 11,42%, enquanto o INPI perderá 12,61% de seus recursos. No caso do Inmetro, no entanto, novamente surge o impacto da captura de recursos pela Reserva de Contingência como fator relevante. Do R$ 1,028 bilhão de recursos destinados ao instituto de metrologia, R$ 255 milhões não poderão ser usados por estarem na reserva do Tesouro Nacional.

Já no INPI houve um alívio na transferência de recursos para a Reserva de Contingência, que ficará com R$ 164 milhões em 2019, uma queda de 36,57% em relação a 2018. Ainda assim, cabe ressaltar que essa reserva tem alto impacto no enxuto orçamento do instituto, que em 2018 será de R$ 561 milhões no total. Ou seja, 30% dos recursos do órgão não poderão ser usados no próximo ano.

Fonte: Jornal da Ciência