Quem são e o que pensam os três candidatos ao cargo de reitor da UFSC

 

 

A Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) finalizou na última quinta-feira o processo de inscrição dos postulantes ao cargo de reitor na maior universidade catarinense. Três professores, também diretores de centros de ensino, todos com décadas de dedicação à instituição, disputarão nas urnas a sucessão na cadeira da reitoria: Edson De Pieri, diretor do Centro Tecnológico (CTC)d+ Irineu de Souza, diretor do Centro Sócio-Econômico (CSE)d+ e Ubaldo Balthazar, diretor do Centro de Ciências Jurídicas (CCJ) e reitor temporário da UFSC desde o afastamento da vice-reitora Alacoque Erdmann, ocorrido dias depois do suicídio do ex-reitor Luiz Carlos Cancellier de Olivo.

A eleição, cuja comissão eleitoral aguardará até esta segunda-feira eventual pedido de impugnação de alguma candidatura, ocorrerá em primeiro turno no dia 28 de março e, em segundo turno, se for necessário, em 11 de abril. As datas, definidas dentro da universidade, ainda não receberam a chancela do Ministério da Educação (MEC), que inicialmente não concordava com esse calendário – queria que em março tudo estivesse definido. A UFSC solicitou aprovação das datas fixadas pela Comissão Eleitoral e homologadas pelo Conselho Universitário, mas o ministro da Educação, José Mendonça Bezerra Filho, ainda não respondeu ao pedido.

Independentemente disso, a campanha nos corredores e bosques do campus da Trindade, bem como em Joinville, Curitibanos, Araranguá e Blumenau, já começou e promete esquentar no decorrer de março. A disputa tende a ser equilibrada, com dois “veteranos” de urnas na UFSC, De Pieri e Irineu, segundo e terceiro colocados respectivamente no pleito de 2015, e o decano Ubaldo Balthazar dando sequência ao programa de administração do ex-reitor Cancellier. Professores, técnicos e alunos regularmente matriculados estão aptos a votar, em condições paritárias para eleger o futuro reitor. A eleição na UFSC, que tem uma população acadêmica de cerca de 40 mil pessoas, envolve um orçamento na casa de R$ 1,4 bilhão em 2018 – a título de comparação, o orçamento da capital, Florianópolis, é de R$ 2,47 bilhões.

A eleição na UFSC definirá o nome do novo reitor pelos próximos quatro anos. O mandato de vice, ocupado pela professora Alacoque Erdmann, continuará sendo exercido por ela até 2020, quando haverá a escolha de um novo nome para o cargo. Depois de concluído o pleito eleitoral na UFSC, ainda não há data definida para a posse, pois é preciso encaminhar o nome do vencedor ao MEC e aguardar trâmites burocráticos.

PRINCIPAL DESAFIO da UFSC

De Pieri: Gestão transparente

Tem um grande problema de gestão. Há pouca transparência nos atos. E isso provavelmente tem causado a maior parte dos problemas. Eu acho que essa é a questão principal que temos de focar desde o início. Ou seja, se há algum tipo de denúncia, se há algum tipo de dúvida sobre determinados procedimentos, é porque eles também não estão suficientemente transparentes. Essa é a minha opinião. Falta transparência nos atos da gestão, na alocação de recursos quando vai para as fundações, e isso precisa ser claro e bem divulgado. É preciso criar o Portal da Transparência da UFSC.

Irineu: Resgate da Autonomia

O principal desafio será resgatar a autonomia da universidade. Também fazer um processo de maior transparência, usar as competências da UFSC para ter controles internos dos gastos públicos por meio de um sistema eficaz, que realmente fique claro para toda a sociedade quantos recursos chegam e quantos recursos são aplicados. E a universidade tem todas as possibilidades técnicas e pessoas capacitadas para fazer esses procedimentos mais eficientes. Existe uma demanda da sociedade em cima de todas essas questões, então todos querem saber como a universidade vai se portar daqui para frente. Na questão humanística, a universidade também ficou muito fragilizada com todo esse processo e demais acontecimentos, por isso é preciso haver um chamamento de toda comunidade, dos alunos, docentes e servidores técnico-administrativos para aproximar mais a universidade da sociedade.

Balthazar:  Reconquista da autoestima

Um dos grandes desafios é fazer a UFSC reconquistar a sua autoestima. Recuperar o bom nome da UFSC. Nós estamos trabalhando com isso, como reitor pro tempore. Nós conseguimos dar uma certa estabilidade. Temos hoje uma equipe de trabalho que foi a montada pelo professor Cancellier e a meu pedido voltou (depois do episódio envolvendo a vice-reitora Alacoque e o corregedor Rodolfo). Eu fiz a solicitação a todos pró-reitores, assessores e diretores que voltassem, e todos voltaram. É uma equipe que tem trabalhado firme, que trabalha pela universidade. Eu diria que hoje, com toda tranquilidade, ouvindo as pessoas, nós estamos reestabelecendo o bem estar da UFSC. O desafio para os próximos quatro anos é manter essa paz, essa tranquilidade da UFSC baseada naquele tripé de ensino, pesquisa e extensão

RELAÇÃO COM AS FUNDAÇÕES DE APOIO

De Pieri: Transparência

A transparência é exatamente para que não haja dúvidas no trabalho das fundações. Elas fazem um trabalho que, sem ele, não haveria outro jeito de tocar a universidade na atual legislação. No entanto, como não há transparência, fica muitas dúvidas sobre as fundações. E procedimentos que são corretos muitas vezes são induzidos por algum coordenador que pede para a fundação fazer algo que não está dentro da legislação que a Capes ou que os órgãos financiadores promovem. Então, muitas vezes há acusação, digamos assim, injusta, com as fundações. A universidade devia ter uma secretaria de relações diretas com as fundações, inclusive para controlar salários de professores que muitas vezes ultrapassam o teto, porque as fundações não têm esses dados, quem tem é a universidade. Mas as acusações vão sempre em cima das fundações. Então, é nesse ambiente transparente que eu te digo que a secretaria faria o trabalho de interlocução com as fundações e teria o controle de, por exemplo, saber se um professor A recebe uma complementação de uma fundação, e uma complementação B de outra fundação, se as duas fundações juntas dão o teto (salarial), a universidade tem como saber, mas a fundação, não. Porque ela só olha aquilo que está pagando. E veja a injustiça que fica sobre a fundação. Esse tipo de controle que é necessário. E isso também vale para as outras formas de alocação de recursos.

Irineu: Transparência

O que precisamos é colocar tudo que envolve as fundações com mais transparência. Precisamos, como tudo que é público, disponibilizar todo tipo de informação sobre elas. As fundações existem para apoiar a universidade, e a universidade precisa mostrar como os recursos foram e são aplicados, sempre. Todas as ações precisam ser pensadas na transparência, porque é a partir disso que veremos se os recursos estão sendo aplicados no que é o mais importante: o ensino, a pesquisa e a extensão.

Balthazar: Harmonia

As fundações exercem um papel importante para captação de recursos na universidade. E isso é um fato concreto. Nós vamos procurar manter uma relação harmoniosa com as fundações, mas dentro daquela ideia que a fundação é necessária. Nós vamos continuar esse trabalho, mas evidentemente, as fundações são de direito privado, não um órgão público. Tem a própria administração e obedece a uma legislação que regula essa relação entre a universidade e ela, a fundação. Quatro fundações de apoio funcionam junto à UFSC: Fapeu, Feesc, Fepese e Funjab. E a nossa relação vai procurar ser amistosa, mantendo uma relação de trabalho. Evidentemente, quando a gente ouve que teve desvio de dinheiro, precisamos também investigar. Se foram praticados ilícitos, que seja apurado e punido. Ninguém vai tolerar falcatruas na universidade. Agora, que haja o devido respeito ao processo legal. Dando-se o direito de defesa a quem foi acusado.

PROFESSORES AFASTADOS POR SUSPEITA DE FRAUDE

De Pieri: Problema a ser resolvido

Eu falei pessoalmente com dois deles. É uma situação bastante difícil. Do meu ponto de vista, eles já deram todas as informações que eram necessárias para o andamento do processo. A gente não sabe em que pé está o processo, mas o próprio TCU já disse que não vê nenhum problema que eles voltem. Na semana passada, eu recebi uma decisão do TRF4 que negou o pedido de um deles para voltar. Então, como a gente não sabe o andamento do inquérito, eu não quero falar em nome da Polícia Federal e não sei quais as razões que eles não estão permitindo a volta dos professores e o próprio recurso de um deles não foi aceito. Mas eu vejo hoje que isso é um problema. Não sei como o Departamento de Administração fecha a carga horária dos professores, porque deve ter gente lá que está com o dobro de aulas para cobrir esses professores. Porque hoje não se tem nem o direito de ter um substituto para o lugar deles.

Irineu: Esperamos a solução

São ausências no quadro da universidade e realmente é lamentável, porque a UFSC precisa desses professores, já que não foram contratados outros professores. Nós lamentamos, porque esperávamos que fosse uma situação resolvida rapidamente. É claro que nós não conhecemos a fundo todo o processo, mas lamentamos que não há uma conclusão ainda. As coisas deveriam ser mais claras e céleres, com a conclusão da investigação e o retorno desses professores às atividades acadêmicas.

Balthazar: Decisão foi precipitada

É o absurdo dessa situação. Há um parecer do TCU recomendando que eles voltem. Agora estamos aguardando a manifestação do Ministério Público Federal nesse processo todo. É um absurdo o que aconteceu e está acontecendo ainda. São pessoas que estão sendo investigadas, não existe nenhuma acusação formal contra eles ainda, e estão nessa situação que não podem trabalhar e nem voltar à universidade por uma decisão que eu julgo foi precipitada.

INQUÉRITO DA OUVIDOS MOUCOS

De Pieri: Mexerá com as eleições

Eu acho que prejudica. Sinceramente, acho que está um pouco longo esse inquérito. Então, prejudica no sentido de que há muitas acusações, que em muitos casos não se sabe se estão corretas ou não. Você pode dar opinião, mas não falar certamente o que aconteceu. E isso, certamente, vai mexer com as eleições, porque dependendo do teor do inquérito, se sair em meio às eleições, imagine o quanto isso não pode interferir na eleição. Porque o ideal é que a eleição fosse definida por propostas, por visões de uma universidade moderna, e não porque o inquérito acusou o professor A, o professor B ou disse que não havia nenhuma acusação válida. O resultado do inquérito, dependendo quando sair pode mudar totalmente o rumo da eleição.

Irineu: Prejuizo à imagem da Universidade

Isso prejudica principalmente a imagem da universidade. E esse é um ponto que precisamos resgatar, porque a UFSC é uma universidade de qualidade, qualquer levantamento que se faça ela sempre fica, pelo menos, entre as 10 melhores universidades do Brasil. Na última avaliação, a UFSC ficou como a 4ª melhor universidade pública federal do país. Então, é uma universidade pública importante. Nós temos um número muito grande de professores, cerca de 2.300, praticamente todos com doutorado, são poucos que não tem o título de doutor, além de um quadro de servidores técnico-administrativos muito bem estruturado, e de alunos que passam por um vestibular muito sério, bem elaborado e onde só os melhores entram na UFSC. Então, temos todo esse potencial, mas naturalmente precisamos resgatar a imagem da universidade, porque o que aconteceu (Operação Ouvidos Moucos) é uma disfunção. A UFSC certamente não é isso que aconteceu. Nós pensamos em envolver e fazer com que todos os segmentos da universidade participem, pensem e façam uma nova gestão, tendo um caráter acadêmico, transparente, humanitário e aprimorando os processos de controle e se aproximando mais da sociedade.

Balthazar: Aguardamos conclusão

Eu procuro separar essas coisas, porque a universidade recomeçará suas aulas agora no dia 26. Na próxima semana (esta), vamos iniciar as matrículas e as aulas recomeçam com tranquilidade, sem maiores problemas. O inquérito continua correndo, digamos assim, há cinco meses, e estamos aguardando uma conclusão, o prazo vai até meados de março, lá pelo dia 15, 20 de março. Seja de que forma concluam esse inquérito, nós vamos trabalhar com resultados e vamos ver o que fazer dependendo do que seja concluído. A polícia entregará para o MPF, que decidirá se oferece denúncia ou arquiva. Vamos trabalhar com o que aparecer.

ENSINO a DISTÂNCIA

De Pieri: Mudanças

A gente está discutindo isso. Nós vamos fazer o que fazem as melhores práticas de ensino a distância do Brasil. É uma ferramenta fantástica, que tem ajudado muito a reciclar e melhorar a formação dos professores, mas que não deveria ser feita dessa forma. Deveria, sim, ser institucionalizada dentro da universidade, assim como é a pós-graduação. A pós-graduação, no passado, os recursos também tinham a necessidade de ser descentralizados, passar por fundação. E, depois de um tempo, isso foi mudado. Hoje cada programa gerencia os recursos que tem e há um gerenciamento geral na corregedoria de pós-graduação. Então, nós deveríamos fazer o mesmo com o ensino a distância.

Irineu: Institucionalização

O EaD, desde 2011, quando nós pela primeira vez concorremos à Reitoria, e depois em 2015, o que sempre colocamos é a institucionalização do Ensino a Distância na universidade. Precisa institucionalizar, o vestibular precisa ser o mesmo, o sistema acadêmico o mesmo, o regulamento de graduação e cursos da universidade também devem ser os mesmos para o EaD. As atividades dos professores também devem fazer parte do plano de acompanhamento dos docentes, tudo para que isso esteja dentro da universidade, mais visível e institucionalizado, para que a gestão seja mais específica e possamos estar com isso tudo dentro da UFSC.

Balthazar: Investigação

O ensino a distância eu diria que tem seu futuro garantido. Nós não podemos dizer que vamos acabar com ele. O próprio MEC estimula isso. Algumas universidades estão tendo problemas por causa dessas denúncias. Nós estamos passando por um momento de dificuldade com o financiamento do ensino a distância. Mas não vamos dizer que em função disso vamos acabar. Precisamos é colocar ordem na casa, verificando o que aconteceu, se aconteceu, por que aconteceu, se houve desvios. É preciso investigar, mas investigar com seriedade, não com esse esquema que houve, sem ninguém saber nada e quando vê o reitor é preso, sem acusação formal.

Fonte: Diário Catarinense – publicado em 26/02/2018 às 14h40