Sindicalismo para a um novo tempo

Há na APUFSC um tipo de docente preso a um passado não muito longínquo em que era chique ser visto por seus pares como um docente combativo e engajado, mesmo que essa militância fosse exercida a custas de um tempo que poderia ser otimizado e inteiramente dedicado as atividades acadêmicas (leia-se, ensino, pesquisa e extensão). Os tempos mudaram e muitos dos novos docentes recém concursados demonstram valorizar bastante a carreira e as suas publicações. Prof. Nildo Ouriques  na sua fala na AG do dia 30 de Agosto aponta como conseqüência disso a pouca adesão desses novos docentes ao sindicato, pois percebem que o salário que recebem mantêm um patamar razoável em relação aos preços. Segundo o prof. Nildo, esses novos professores  não gostam de política, e é a despolitização que está fazendo falta a APUFSC. 

 

Será? É razoável admitir que exista mesmo uma relação de causa e efeito entre o salário manter seu valor  e AG”s esvaziadas, contudo, no que isso representa um problema para a APUFSC? Afinal, um sindicato deve se limitar exclusivamente à defesa dos interesses da categoria e não ser um mero instrumento de enfrentamento do Estado em vista da Revolução Brasileira, certo? 

 

É exatamente este o ponto nevrálgico daqueles que  de tempos em tempos traçam um perfil decadente da APUFSC, a ponto de cogitarem a volta da APUFSC ao abjeto e disfuncional sindicato nacional ANDES.

 

Há pessoas que, talvez presas a dogmas marxistas que aprenderam com um zelo quase religioso e iludidas a ponto de acharem que estavam diante de uma idéia científica quando na verdade mal percebiam que aquilo que professavam (e ainda professam) é a mais pura  anti-ciência (=obscurantismo), se tornaram disciplinadas a ponto de deixarem suas vidas serem absorvidas por este ideal anti-científico. Como resultado,  se ensinam “X” assim o fazem carregado de uma leitura marxista (afinal crêem que é algo científico), e se estão no sindicato, concebem o sindicato dentro da dinâmica marxista da luta de classes, por isso acreditam que mesmo estando os salários razoavelmente íntegros o sindicato tenha que fazer política, enfrentar o Estado e construir a revolução, já que é assim que um marxista faria.

Ora, mas por que deveríamos aceitar pura e simplesmente esta visão particular de mundo? Se na nossa juventude não fomos infectados pelo germe do marxismo, por que deveríamos seguir esse mantra? Por que razão concordaríamos com a tese de que os professores novos deveriam se politizar deixando de lado seu academicismo (leia-se, publicações!!!!)?

 

Entendamos, então, duas coisas.

 

A primeira é que devemos deixar de lados certos mitos propagados nos manuais de iniciação ao marxismo que preconizam que é um sindicato é isso ou aquilo (SIC), afinal, quem define o que é o sindicato são os associados que o mantêm através das  suas contribuições. Assim, se a maioria dos associados não vão as AG”s, mas se mantêm filiados, isto indica a rejeição a uma forma antiquada de deliberação e, possivelmente, também de um modelo politizado de sindicato, o que talvez explique  o pouco mais de cerca de 125 docentes filiados ao ANDES aqui na UFSC.

 

Segundo, todo aquele que criticar os novos professores por terem uma obsessão pela carreira e pelo academicismo “publicista”, e assim cobram deles uma tomada de consciência de classe e conseqüente politização, deve também se submeter a contrapartida  de reproduzir a mesma excelência acadêmica desses novos e obsessivos professores quanto ao que eles publicam. Somente assim, baseado nessa reciprocidade, tem-se autoridade para fazer tal cobrança. Ou seja, um novo professor “publicista” aceitaria se politizar desde que os professores engajados numa causa político-ideológica demonstrem ter a mesma excelência acadêmica dos novos professores no que se refere as publicações.

 

Finalmente, não podemos esquecer que devemos prestar contas ao público do que fazemos. Ora, se a questão fundamental  da apatia da universidade pública brasileira reside numa suposta oposição entre docentes engajados e/ou acadêmicos publicistas imaginemos então uma situação hipotética onde estivesse inteiramente dentro da nossa capacidade decidir tornar a UFSC igual a uma UNAM ou igual a uma Princeton. A primeira, ao que parece, o modelo de universidade engajada, a segunda, o modelo de universidade publicista. Assim, se estivesse dentro da nossa capacidade decidir nos tornar pelo nosso próprio esforço entre uma e outra, que universidade nossos alunos desejariam que a UFSC se tornasse?

 

Mais importante do que dar uma resposta a questão, o efeito pretendido aqui é o de causar uma reflexão de que os tempos mudaram, havendo na universidade uma nova geração de docentes que valorizam sua inserção numa comunidade acadêmica onde o que conta são as publicações e, assim, pensam e agem diferente do pessoal da velha-guarda. Por ora, a universidade brasileira (ainda) comporta espaço a todos, quer apenas ministrem suas aulas ou façam, além disso, pesquisa. No entanto, parece patético demonizar os que obsessivamente valorizam a publicação pondo sobre eles o ônus do sindicato não mais se politizar, afinal, quando não se está disposto a mudar e se adaptar ao novo é mais fácil atacar o que é novo, como se isso pudesse tornar o que é passado uma realidade no presente. 


Marcelo Carvalho

Professor do Departamento de Matemática