Acobertamento Tabajara

A Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) rejeitou – por 40 a 25 votos e uma abstenção – o relatório do deputado Sergio Zveiter (PMDB-RJ) que recomendava a autorização da Câmara dos Deputados para que o Supremo Tribunal Federal investigue a denúncia de corrupção passiva contra Michel Temer. Até a votação de hoje, 13 deputados haviam sido substituídos pelas lideranças partidárias a serviço de Temer. Caso as substituições a peso de liberação de verbas não tivessem ocorrido, seria razoável supor que o resultado seria: 38 pela admissibilidade, 27 contra e uma abstenção.

Temer comprou o resultado com a liberação de verbas de emendas de deputados no valor de, pelo menos, R$ 1,8 bilhões. Se tivesse comprado a votação com dinheiro dele, já teria sido uma vergonha e um crime. Mas, foi bem pior: Temer usou de dinheiro do contribuinte, numa fase em que o que o Brasil mais precisa é de contenção de despesas. Uma fase em que os Estados estão sem dinheiro para pagar salários, para prestar serviços básicos de saúde pública, aumentar os contingentes de policiais. A insegurança corre solta, mormente no Rio, onde diariamente se morre de bala perdida em tiroteio de bandidos. Falta dinheiro para investimento em infraestrutura, em educação e segurança. Diante deste quadro dantesco, este canalha, Michel Temer Lulia, passa a mão em (pelo menos) R$ 1,8 bilhões em liberações para deputados comparsas, bandidos desavergonhados que, comprados, deram seu voto contra a admissibilidade para que o STF pudesse investigar o Ali Babá encrustado naquelas cavernas sujas em que se tornaram os palácios presidenciais em Brasília. Se isto não foi crime de obstrução da Justiça, então eu não mais entendo o que possa ser tal crime. Os deputados, comprados com dinheiro do contribuinte, confirmaram que a CCJ é um valhacouto de bandidos. Ali, por sórdidos ardis, Temer Lulia tornou-se protegido contra a investigação da Justiça. Temer e esta corja comprada formam uma pústula moral nesta República de Banânia.

Já houve recurso ao STF, frustrado por decisão monocrática da presidente daquela Corte, ministra Carmen Lúcia. Argumenta a ministra que a indicação dos membros da CCJ é da competência das lideranças partidárias – o que até os paralelepípedos da rua onde eu moro sabem – e que, por isso mesmo, conclui, o Judiciário nada pode fazer.

Será?

Ora, a nomeação do Procurador Geral da República é da competência do presidente da República. Nem por isso tem o presidente o poder para trocar o PGR sempre que este age, ou parece que vai agir em desacordo com o presidente. Tomando este exemplo, ouso afirmar: pode até não estar escrito no Regimento da Câmara que um membro da CCJ, uma vez empossado por indicação do líder, não pode ser substituído ao bel prazer deste, para a colocação de um moleque que, por dinheiro ou outras safadezas, seguirá suas determinações. Se é para um membro poder ser mudado, a qualquer momento, sempre que for contrário à vontade do líder, para que a composição atual da CCJ? Bastaria que fosse composta apenas dos líderes de bancada, por óbvio.

Não, a bandalheira da “dança das cadeiras” na CCJ, embora não expressamente proibida no Regimento, não pode existir. Não é compatível com a noção de moralidade imanente no cidadão de bem. Não é compatível com a liturgia que se espera de um órgão do poder legislativo de uma República digna deste título. Não é compatível com o Estado Democrático de Direito. É coisa de uma republiqueta Tabajara.

Será que a ministra Carmen Lúcia não poderia ser menos burocrata e ter pensado nisso? E, em pensando nisso, não poderia ter se dado conta de que um crime de obstrução da Justiça se desenrolava à luz do sol, sob a batuta de Temer Lulia e às expensas do minguado dinheiro do contribuinte?

Quando, por Júpiter, teremos magistrados menos obcecados pela cega burocracia da forma e mais interessados no Direito de fato dos cidadãos que prestam desta República? Será que é nossa sina sermos, como sugeriu Gilmar Mendes, colega de Carmen Lúcia, uma República Tabajara?


José J. de Espíndola

Engenheiro Mecânico pela UFRGS — Mestre em Ciências em Engenharia pela PUC-Rio — Doutor (Ph.D.) pela Universidade de Southampton, Inglaterra — Doutor Honoris Causa da UFPR — Membro Emérito do Comitê de Dinâmica da ABCM — Detentor do Prêmio Engenharia Mecânica Brasileira da ABCM — Detentor da Medalha de Reconhecimento por Ação Pioneira na Construção da Pós-graduação na UFSC — Detentor da Medalha João David Ferreira Lima, concedida pela Câmara Municipal de Florianópolis — Professor Titular da UFSC, Departamento de Engenharia Mecânica, aposentado.

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P. S.: Como ilustração do texto acima, assista ao vídeo abaixo. Mas, antes, previna-se: Se você é uma pessoa decente tome antes um anti-vomitório, que assistir a essas manobras nojentas é para estômagos fortes.

https://youtu.be/_b-QvAHDYKc