CED: educando para a democracia

O processo eleitoral do CED está sendo um bom exemplo para todos nós refletirmos sobre “educação para a democracia” e isso independe de seu desfecho ou de quem venha a ser o vencedor no pleito. O que se ouviu nas reclamações sobre as eleições, na qual venceu o voto nulo, foi que o processo eleitoral não foi democrático e que a Assembleia Geral (expressando a vontade do CED) não foi respeitada. As urnas parecem confirmar isso e o resultado implicará em novas eleições, talvez no final de agosto, portanto, quase 10 meses depois do Edital 2016.

Mesmo tendo votado na chapa, procuro entender as razões dos que votaram nulo e branco. Lamento as abstenções. E, como democracia não se adjetiva, mas se substantiva, minha linha de raciocínio aqui é buscar em alguns fatos e argumentos o que fundamentou as fervorosas críticas e posicionamentos eleitorais.

 

Agarrar-se aos adjetivos, nominalismos e simbologias nem sempre permite exprimir o grau substantivo e significado real das coisas, como é o caso das assembleias gerais (AG) e de a elas se imputar a função e o poder de definir temas institucionais. Aqui faço um parênteses: foi somente na gestão em que fui diretor do CED (2002/08) que a AG foi inserida em nosso regimento como instância auxiliar e de caráter consultivo, portanto, deixo claro que a defendo em nosso ordenamento institucional.

 

A democracia direta é um bom sistema pelo qual uma comunidade pode, sem intermediários, expressar suas ideias e posições. Contudo, a democracia representativa é um bom sistema democrático. Em ambos os sistemas, enquanto espaços e instrumentos de decisão, seja por meio de uma AG ou em um Colegiado de Representantes, será a natureza dos temasd+ as informações, pressupostos e instruções dos processos, bem como as condições e regras do funcionamento desses espaços, que garantirá a qualidade e justeza das decisões. Incide ainda sobre tudo isso a representatividade do coletivo participante e a garantia à livre expressão de todos, para que os debates produzam maiorias e, eventualmente, minorias. Mas há ainda um requisito fundamental: as pessoas precisam ter todas e as corretas informações sobre o que a AG ou mesmo um Colegiado discutirá e as garantias para participarem livremente do processo de discussão e das decisões. No caso específico do CED, a AG conseguiu oferecer as condições mínimas para que todos esses requisitos fossem garantidos? Que reflitam os principais atores.

 

Minha impressão é de que as razões para a convocação da AG do CED nunca foram bem esclarecidas, mas uma das vertentes era a de recomeçar todo o processo eleitoral, para uma determinada chapa se inscrever novamente e não propriamente esclarecimentos sobre os problemas do processo eleitoral. Ora, usar uma AG para garantir inscrições de chapa não é motivo suficiente para convocá-la. Logo, tem algo de estranho nisso tudo. Um dos principais problemas, não revelado, foi que não se conseguiu registar uma chapa alternativa no novo edital de 2017. Faço aqui outro parênteses: depois da primeira decisão do CUN de não homologar a Chapa 2, o processo voltou ao CED e naquele momento restava uma única chapa inscrita, que, devido à minha desistência (os motivos são públicos), foi necessário reabrir inscrições, de modo que a chapa David/Adilson apresentou seu pedido de inscrição. Mas, no dia seguinte, por argumento infundado e improcedente (parecer do CUN) do presidente da Comissão Eleitoral essa chapa não foi homologada. Pois bem, até onde se conhece dos fatos, nos momentos finais do prazo desse novo Edital houve a tentativa de um determinado grupo político de registrar uma outra chapa, que esbarrou na legislação porque não preenchia um requisito básico: o candidato precisava ser lotado na UFSC. Essas duas situações promoveram uma reação imediata pela suspensão do Edital, passando este último grupo a defender a realização de uma AG visando “começar o processo eleitoral novamente”. Para essa tese encontrou aliados em outras duas correntes políticas: uma que entende que a democracia deve ser direta (soberania da AG) e outra que pretendia voltar ao pleito com sua candidatura, a mesma que se inscreveu no Edital de 2016 e foi posteriormente barrada pelo CUN devido à ilegalidade em sua origem e constituição. Os desdobramentos todos sabemos: inúmeras reuniões, pareceres, recursos e, finalmente, urnas. Considero legítimas as contendas legais, manifestações políticas e decisões das instâncias. Mas, outras nem tanto.

 

As regras operadas no processo eleitoral do CED não foram emanadas por um agente externo, mas por nosso próprio Conselho de Unidade. Ater-se a elas não é um ato contra a democracia, mas garantia de que ela seja plenamente realizada. Contestar e recorrer das decisões fazem parte do processo político e do estado democrático de direito. O que não é aceitável são regras ad hoc, feitas para atender circunstâncias e pessoas. Parece-me, então, que a alegada falta de democracia foi, infelizmente, propiciada justamente pelos que agora a reivindicam. Novamente afirmo: é o desrespeito a elas (regras) que produz anomalias democráticas, as quais alguma instância superior analisará e julgará. Mas isso é suficiente para um pleito ser democrático ou não? Alguns alegam que chapa única não permite a democracia. Contudo, isso depende de muitos fatores e contextos. Historicamente é o que tem ocorrido nas eleições do CED e ninguém concluiu que por isso vivemos numa ditadura. No máximo se reclamou que seria melhor e mais oportuno que todas as visões políticas se apresentassem nos pleitos eleitorais. Por que agora é diferente? Em nosso Centro há várias correntes de opinião (política), mas isso não significa garantias prévias de inscrição e participação no certame.

 

Uma conclusão desses episódios, que servem apenas como um exemplo, é que uma AG não deve ser um instrumento de manipulação (deliberada ou não), pois seu mau uso compromete a democracia, produz vários malefícios, entre eles o de deseducar para a democracia, especialmente entre os mais jovens. O mau uso de espaço e instrumentos democráticos pode até resolver um problema momentâneo de disputa de poder, mas é só isso!

 

Desde que entrei na UFSC, como aluno e depois como professor e pesquisador, tenho colaborado, discutindo seus problemas e ajudando em soluções. Aprendi que o papel de uma instituição universitária não é o de ser um partido, sindicato ou uma empresa. Temos outra função: produzir conhecimento e formar pessoas, auxiliando o país a ser soberano e solidário com os povos. Isso também serve ao CED e à ideia de docência, pois não podemos transformar esses espaços em doutrinarismo de qualquer natureza. Nesse caso um princípio pedagógico deveria ser recuperado: cada qual se forme a si mesmo como puder e quiserd+ com as garantias de que todas as informações lhes sejam oferecidas.

 

Que esta nova etapa do processo eleitoral possa recuperar a estrada do bom debate de ideias e propostas, mas antes precisaremos limpar a narrativa contaminada pela desinformação que ofusca a mente para o alcance da justiça e da liberdade de escolha. Se isso for recuperado, estou certo de que recomporemos o nosso tecido político-institucional, para que qualquer vencedor possa ter condições de ajudar o CED a cumprir com seu papel na educação brasileira, ser mais forte e mais justo.


Carlos Alberto Marques (Bebeto)

Professor no Depertamento de Metodologia de Ensino