O discurso das feministas invariavelmente é centrado na defesa dos direitos das mulheres em face de situações que julgam injustas. Acertadamente, não há como negar ser injusto as desigualdades em relação à remuneração, ou a questão da violência a que muitas mulheres estão submetidas de modo que, se o discurso se restringisse apenas a isso, dificilmente alguém poderia deixar de ser simpático à causa. No entanto, percebe-se do discurso feminista que o movimento carrega intrinsecamente uma visão muito particular da realidade do “ser-mulher”, visão que de modo algum pode ser tomada como representando o pensamento e os ideais de vida das mulheres como um todo.
Recentemente, em discurso proferido por ocasião do dia internacional da mulher, o presidente Michel Temer foi duramente criticado quando disse
“Tenho absoluta convicção, até por formação familiar e por estar ao lado da Marcela [Temer], do quanto a mulher faz pela casa, pelo lar. Do que faz pelos filhos. E, se a sociedade de alguma maneira vai bem e os filhos crescem, é porque tiveram uma adequada formação em suas casas e, seguramente, isso quem faz não é o homem, é a mulher”.
A crítica é fruto de uma visão prevalente no meio feminista que não vê como positivo o papel de educadora e mantenedora do lar que é usualmente associado a “mulher no seio da família”. Criou-se assim, artificialmente, um estigma que tal função é degradante, e a aplicação mais visível desse discurso assinala que a mulher em relação ao homem está sobrecarregada de trabalho, já que muitas mulheres além de trabalharem fora ainda se ocupam das coisas do lar. Mas, será mesmo que as mulheres consideram sua função como esposas e mães no seio da família algo degradante? Será que este esforço extra de ser esposa e mãe e de desempenhar de forma diferenciada na família um trabalho de formação e educação dos filhos, além da manutenção e coesão do lar é algo que todas as mulheres depreciam? Será que não advêm disso uma satisfação interior que a mulher sente de se ver como pilar fundamental dessa estrutura familiar? A chamada “família tradicional” é fundamentada exatamente neste papel da mulher na família, e a afirmação do presidente Temer enaltecendo esta função não é estranha se vista por esta ótica.
Talvez em nenhum outro lugar este ideal de educadora e mantenedora do lar esteja tão presente e bem harmonizado quanto nas famílias cristãs, embora possa estar igualmente presente e harmonizado em qualquer outra família também. A razão é que entre as mulheres cristãs existe a percepção de que ser esposa e mãe é uma vocação, ou seja, não é algo que qualquer mulher consegue realizar, já que é necessário ter aptidão para realizar essa missão. Mesmo reconhecendo a dureza do desempenho desta missão familiar, é um fato que mulheres cristãs que livre e conscientemente aceitaram a vocação de serem esposas e mães são capazes de ver algo de belo e edificante na sua missão de educadora e mantenedora do lar. Assim, nesta perspectiva vocacional, é lícito afirmar que
… E, se a sociedade de alguma maneira vai bem e os filhos crescem, é porque tiveram uma adequada formação em suas casas e, seguramente, isso quem faz não é o homem, é a mulher.
Talvez, as únicas ressalvas que podem ser feitas ao que foi dito é que o “esposo e pai” também participa deste processo de formação, e que pessoas podem ser íntegras mesmo se submetidas ao abandono ou a desagregação familiar, bastando que em algum momento tomem para si um bom exemplo, como vemos em muitos casos.
Finalizo este texto com uma explicação para aquelas mulheres que possam estar chocadas com o que eu escrevi anteriormente:
“Mulheres cristãs que livre e conscientemente aceitaram a vocação de serem esposas e mães são capazes de ver algo de belo e edificante na sua missão de educadora e mantenedora do lar.”
De fato, não é o serviço que diminui a pessoa, mas sim as disposições interiores com que se realiza a tarefa. Ora, a disposição interior da mulher cristã, hoje e sempre, toma como modelo o exemplo diverso de inúmeras mulheres cristãs que ao longo dos séculos se puseram a serviço da comunidade cristã em que estavam inseridas (e o livro dos Atos dos Apóstolos faz referências a muitas dessas mulheres já no início da então incipiente comunidade cristã que se formava). Curiosamente, foi no seio dessas comunidades cristãs primitivas que as mulheres passaram a ter uma função diversa, para além das tarefas domésticas da família, pois a comunidade cristã se reunia e se ajudava mutuamente. Essas mulheres faziam isso como um chamado de serviço, de vocação, que confirmava sua adesão à comunidade e não como uma obrigação. Vemos então que a “condição servil” com que muitas feministas hoje se referem a condição da mulher na família (que é implicitamente o objeto da crítica ao discurso do presidente Temer) não se aplica pelo menos as mulheres cristãs que livremente abraçam sua vocação de esposa e mãe. Podemos ver o lado belo e edificante desta vocação experimentada pelas mães e esposas quando vemos testemunhos de filhos e filhas que reconhecem com gratidão o esforço e dedicação com que foram educados. Mais ainda, a mulher que abraça livremente a vocação de ser esposa e mãe descobre que a célula social mais básica chamada família está fundamentada substancialmente na mulher, pelo fato de que os filhos/filhas são algo que a mulher graciosamente concede ao mundo e por isso mesmo se une a eles de forma mais efetiva que o homem. Isso explicaria a forma diferenciada com que a mulher que é esposa e mãe assume para si a função de manter a coesão da família. O feminismo hoje, tenta de todas as formas erradicar essa concepção familiar tradicional classificando-a de arcaica, e tem todo o direito de fazer isso desde que se dirija as mulheres que não desejam assumir essa vocação (tipicamente da mulher cristã) , neste caso, devem reconhecer que não falam em nome de todas as mulheres e tampouco representam o desejo e ideal de todas as mulheres.
Ainda que a grande mídia hoje dê um amplo espaço ao modismo das idéias feministas vemos que de forma silenciosa a vocação da mulher cristã contradiz em larga escala a tese feminista e, assim, a vitalidade e abundância das famílias cristãs impõem-se de forma invencível como um obstáculo a certas pretensões do feminismo.
*Marcelo Carvalho
Professor do Departamento de Matemática