Com licença, eu vou à luta

Impressiona a quantidade de professores que, tendo recentemente ingressado na UFSC, permanece alheia à vida sindical. Os motivos para que isso aconteça são numerosos e complexos. Uma coisa é certa: entre as causas do fenômeno, tem grande peso a total irrelevância da Apufsc no cenário político-institucional contemporâneo. Sua atuação hoje praticamente se resume à assessoria jurídica, que, aliás, ao sabor de um Judiciário cada vez mais rendido às teses liberais, acumula derrotas sucessivas.

 

Essa irrelevância é ainda mais patente quando se consideram as promessas que balizaram as últimas gestões. O mote era “devolver a Apufsc aos professores”, sob a suposição de que, no longo período em que foi dirigida pela esquerda, a entidade teria sido aparelhada e colocada a serviço de princípios e práticas estranhos às atividades propriamente universitárias.

 

O projeto de refundar a Apufsc sob novas bases não poderia senão fracassar. A razão é simples: o diagnóstico a respeito do que ocorrera em anos anteriores estava errado. É verdade que uma série de equívocos foi cometida pelas diretorias de esquerda. Boa parte desses equívocos, de resto, se deveu realmente ao fato de que faltou aos nossos antigos dirigentes compreender certas mudanças que afetavam dramaticamente a rotina universitária. Mas isso não é o mesmo que dizer que, naquele tempo, a Apufsc estivesse completamente de costas para o que sucedia nas Universidades Federais. Pelo contrário. Desde o período de redemocratização do Brasil, o sindicato desempenhou um papel altamente relevante na configuração do ambiente acadêmico. Essa importância cresceu significativamente nos anos FHC, quando as instituições públicas de ensino superior foram duramente atacadas e estiveram a ponto de ser privatizadas, com a consequente cassação de quase todos os direitos de professores, técnicos e estudantes. Se àquela altura os nossos salários foram preservados e se, ademais, o plano de carreira docente não colapsou, não foi graças a algum reitor ou burocrata, mas ao sindicato local e à sua filiação à Andes, cujas greves e outras ações eram tudo o que nos preservava da sanha destrutiva do governo tucano.

 

Os anos do petismo representaram uma trégua para as Universidades Federais. Reajustes foram espontaneamente dados aos professoresd+ a carreira alongou-se, ampliando as possibilidades de ganhos financeirosd+ os investimentos aumentaramd+ bolsas se multiplicaramd+ o número de instituições cresceu consideravelmente. Em um tal contexto, a Andes perdeu sua função e de fato não soube se reinventar. E foi nessa conjuntura que ascensão da direita ao sindicato se tornou possível. Um sindicalismo de luta, à maneira dos preconizados pela esquerda, parecia dispensável.

 

Os proponentes, apoiadores e ideólogos da Nova Apufsc jamais vão admitir isso, mas a verdade é que ela é filha do período Lula/Dilma e do comodismo que tal conjuntura disseminou entre nós. Sem força nem ideias para renovar de fato a vida sindical, a Nova Apufsc pautou-se pelo imobilismo. As sucessivas diretorias só deixavam o dolce far niente para investir em projetos pessoais e, em datas próximas às eleições, tentar reproduzir-se no poder. Se o nome disso não é aparelhamento, eu não sei o que a expressão significa.

 

Pois bem: a primavera acabou. Entra em cena o governo Temer, que apresenta as armas e dá os primeiros sinais de que um novo ciclo neoliberal, talvez ainda mais profundo do que o patrocinado por FHC, se inaugura. A direita sindical não tem a menor ideia do que fazer nessas circunstâncias. Acreditando talvez que a pax lulista fosse durar para sempre, desfiliou-se da Andes, como se, com todos os seus defeitos, fosse possível organizar uma luta nacional – a única agora capaz de preservar a Universidade Pública – sem ela.

 

Chegou a hora de separar as crianças dos adultos. Acabou o tempo de brincar de sindicalismo. Resta ao sindicato local retornar ao seio da Andes e unir-se a ela nas campanhas salariais e outros grandes enfrentamentos. Disso a Andes entende. Disso não podemos prescindir, do mesmo modo que a Andes não pode prescindir da Apufsc, uma entidade que, historicamente, sempre esteve entre as forças vivas do movimento nacional. No mais, cabe ao nosso sindicato local dialogar efetivamente com os professores da UFSC em questões mais microfísicas e cotidianas, tarefa que a direita prometeu realizar e teve tempo mais do que suficiente para fazê-lo, mas que ficou no papel. Com licença, eu vou à luta. 


Fábio Lopes da Silva

Professor do Centro de Comunicação e Expressão