Uma portaria divulgada na sexta-feira (14) pelo Ministério da Educação gerou polêmica e reclamações nas redes sociais ao ser interpretada como uma medida que levaria à diminuição do número de vagas em universidades e faculdades públicas.
A medida alterou o procedimento de redução de vagas de cursos de graduação ofertados por parte das instituições de ensino superior que integram o Sistema Federal de Ensino.
Consultado pela BBC Brasil, o MEC esclareceu não se tratar de uma determinação de redução de vagas, mas de uma “desburocratização” da forma como isso pode ser feito por faculdades, ao conferir mais “racionalidade e celeridade” ao processo.
Hoje, faculdades representam 83,8% das 2.364 instituições de ensino superior do país – o restante corresponde às universidades, centros universitários e institutos federais -, de acordo com censo de 2015 do setor elaborado anualmente pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep).
O ministério esclareceu que o processo para redução de vagas existe desde 2006. Hoje, as faculdades – instituições de ensino superior de menor porte – solicitam um número determinado de vagas ao MEC. Mas, por falta de demanda, as vagas acabam não são preenchidas e acabam ficando ociosas.
Atualmente, as faculdades precisam protocolar um pedido de redução do número de vagas que consta junto ao MEC, que é concedido ou não. Com a mudança, agora só será necessário notificar o ministério sobre a redução, mas elas continuam obrigadas a “garantir as condições de atendimento aos atuais alunos”.
De acordo com o MEC, a Portaria Normativa n° 20, assinada na quinta-feira (13) pelo ministro Mendonça Filho, não afeta as universidades e centros universitários, sejam eles públicos ou privados, pois estas instituições já tinham autonomia para fazer a redução por conta própria.
Ao mesmo tempo, para que as faculdades voltem a ampliar o número de vagas, elas ainda precisam protocolar um pedido junto ao ministério e demonstrar que “mantêm as condições necessárias para atender um número maior de alunos”. Segundo o ministério, isso evita que haja um aumento irrestrito sem que a instituição seja capaz de atender seus alunos com a qualidade mínima exigida.
‘Processo longo’
Luiz Cláudio Costa, ex-secretário-executivo do MEC durante o governo de Dilma Rousseff, entre 2014 e 2016, e ex-presidente do Inep, avalia a medida se tratar de uma medida “positiva”.
“Tudo na educação superior brasileira é muito grande e o que for feito no sentido de simplificar processos sem abrir mão de garantir a qualidade é interessante”, disse Costa à BBC Brasil.
“O que se está fazendo é reduzir um processo que era longo. Por causa da reduzida equipe técnica do ministério, esses pedidos podiam levar anos para serem avaliados.”
Costa aponta que isso permitirá dimensionar melhor o tamanho do ensino superior brasileiro, porque, em certos casos, as faculdades faziam pedidos de um número de vagas ao MEC, mas não conseguiam preenchê-las, porque a “demanda social” por elas se reduzia.
As instituições passavam, então, a não ofertá-las nos vestibulares, mas elas ainda constavam no sistema do ministério.
Segundo o censo de 2015, das 8,5 milhões de vagas ofertadas, 2,3 milhões ficaram como “remanescentes”, ou seja, não foram preenchidas.
A maior parte destas vagas remanescentes está nas instituições privadas, que respondem por 7,7 milhões das vagas ofertadas e 2,1 milhões das remanescentes.
“Ao dimensionar melhor o ensino superior do país, se fará uma análise melhor do setor e saber exatamente o número de vagas existentes, quais são as disciplinas que têm maior demanda e as mais concorridas.”
No entanto, o cientista político Daniel Cara, coordenador-geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, que reúne organizações da sociedade civil em prol da promoção da qualidade do ensino no país, faz ressalvas à medida.
“A portaria parece desburocratizar o processo, mas dá às instituições o poder de tomar decisões que podem ir contra o interesse da sociedade de ter um ensino superior que favoreça seu desenvolvimento”, afirma Cara.
Ele ressalta que as vagas podem estar ociosas não apenas por falta de demanda, mas porque o aluno não consegue pagar a faculdade ou não recebe a assistência necessária para se manter no curso.
“Essa mudança pode encobrir esses problemas e não permitir que haja o debate necessário para que estudante não apenas tenha acesso ao ensino superior, mas permaneça nele”, diz Cara.
“O modelo anterior chamava atenção para o número de vagas ociosas, mas, sem esse dado, não há como elevar o nível do debate e, por exemplo, discutir o que essas instituições podem fazer para preencher as vagas ociosas em vez de extinguí-las.”
Fonte: UOL Educação