é inquestionável que um procurador da república no exercício de sua função atue com independência e zele pela justiça. Contudo, o que fazer quando o objeto da ação do procurador se mostra desprovido de base sólida, tornando-se assim algo que atenta contra direitos fundamentais do cidadão, por exemplo, sua liberdade de expressão?
é exatamente este o caso do Ministério PÚblico Federal e do Cepal (Conselho Estadual das Populações Afrodescendentes de Santa Catarina), ambos órgãos da administração pública pagos com nossos impostos, que pede a condenação pela justiça federal de um aluno da UFSC e da própria UFSC É o que lemos na matéria do grupo “Tudo sobre Floripa” em http://www.tudosobrefloripa.com.br/index.php/desc_noticias/aluno_da_ufsc_pode_ser_condenado_a_pagar_mais_de_r_50_mil_por_danos_morais.
O caso se refere a uma matéria publicada por um aluno da UFSC nas redes sociais em um grupo não vinculado a UFSC onde foi publicada uma foto de um homem negro de joelhos oferecendo um enorme cacho de bananas para uma mulher negra. O aluno da UFSC nada escreveu sobre a foto. O que se sucedeu foi que certas pessoas decidiram fazer a seu gosto uma leitura do sentido da foto que havia sido vinculada, afirmando que se tratava de uma manifestação de racismo, pois o cacho de bananas sendo oferecido à mulher negra significava que ela era um macaco, e isso se tornava ofensivo pelo fato do macaco ser um animal irracional. Ou seja, os acusadores do aluno da UFSC que moveram a ação no MPF interpretaram a foto como bem desejaram, pois em nenhum momento o aluno escreveu coisa alguma. Posteriormente, quando a confusão já havia se formado, o aluno até tentou se explicar (em vão) ao exaltado coletivo negro da UFSC, que movido pelo costumeiro espírito da luta de classes, exigia a “cabeça do aluno” pedindo a sua expulsão da universidade.
Pois bem, eis que o absurdo da ação desses coletivos ficou nitidamente claro. Nos dias que se seguiram vimos membros desse coletivo portando cartazes no hall da reitoria onde se lia coisas estranhas a um movimento que supostamente luta pelos direitos dos negros, já que misturavam várias palavras de ordem contra a “opressão do capital”, etc.. (Ah…, claro, para eles talvez um negro não possa ser bem sucedido nem ter uma empresa, ou seja, na ótica do cartaz, Pelé subitamente não seria mais negro.). Vimos também cartazes colados em paredes da universidade que tinham até um tom agressivo para quem não era negro, pois fazia alusão de que a “UFSC iria ficar negra”, etc.. Ora, não tardou para alguém traduzir o significado original da foto como remontando a um grupo humorístico nigeriano que retratava um costume deles, onde os jovens oferecem bananas as jovens com quem desejam casar. No caso, o lado humorístico da foto se referia a desproporção do tamanho do cacho de bananas que fora oferecido, que realmente era enorme. Supostamente, o grupo humorístico que produziu a foto queria fazer uma brincadeira com o preço, cada vez mais alto, que se tinha de pagar para se casar. Não saberia dizer a veracidade dessa interpretação (se é mesmo algo usual, ou bem particular na Nigéria), mas tampouco levaria a sério a justiça da acusação de racismo feita pela livre interpretação do exaltado movimento negro da UFSC. De fato, quando um coletivo se presta unicamente para consolidar uma posição de confronto e se recusa a estabelecer um diálogo construtivo (exatamente o que eles fizeram ao recusar que o aluno se explicasse) corremos o sério risco de ver absurdos na UFSC onde um amigo branco pode ser processado por dar uma banana para seu amigo negro que estava com fome, ou um professor ser acusado de racismo, se por acaso tiver algum aluno negro reprovado na disciplina que leciona.
Outro absurdo que causa indignação é que a ação baseada nesta leitura arbitrária de racismo que expus acima foi endossada por um órgão estadual, o Cepal, sem critério algum, ou seja, o Estado que é financiado pelo cidadão é usado aqui contra o próprio cidadão. Afinal, quem controla o Cepal?
Outro absurdo. Segundo a matéria mencionada do “Tudo Sobre Floripa”, na ação o procurador federal Maurício Pessutto penaliza também a UFSC. Ora, mas o que a UFSC tem a ver com isso para ser responsabilizada? A matéria sequer foi vinculada na página oficial da universidade, mas sim em um grupo da rede social que usa o nome UFSC. O simples uso do nome UFSC, ou parte dele por terceiros, não identifica o grupo como representando institucionalmente a universidade, da mesma forma que APUFSC, SINTUFSC, e inúmeros outros grupos que mantêm páginas na internet com alguma menção a UFSC, são entidades distintas.
Vemos então claramente que a ação movida pelo procurador da República Maurício Pessutto em resposta a uma representação do CEPAL carece de fundamentação, é injusta e cerceia a liberdade de expressão do aluno, pois se há alguma suposta conotação racista na foto ela não foi feita pelo aluno, mas foi fruto de uma interpretação e de um exercício de imaginação exagerado por parte de terceiros, que sugere um precedente perigoso a ação de coletivos que passam a exercer um bully coletivo sobre o indivíduo. O candidato a presidente pelo PRTB nas últimas eleições, Levy Fidelix, passou por uma situação semelhante tendo sido acusado de homofobia por coletivos LGBT e simpatizantes do PSOL por conta de uma declaração que dera num debate ao responder a uma pergunta provocativa da candidata do PSOL. Recentemente, a justiça inocentou Levy, algo que era evidente, contudo, é lamentável que o dinheiro do contribuinte seja gasto em ações que servem aos interesses de movimentos coletivos ávidos para enquadrar e calar, pela força da lei, seus desafetos.
é preciso colocar limites a ação de procuradores da República em casos desse tipo, onde a acusação em si é tênue e insustentável, pois é muito conveniente para um procurador mover ações, afinal, eles são muito bem pagos para realizar este ofício. Contudo, ao cidadão desprotegido que se vê diante de uma máquina estatal voraz com seus inúmeros procuradores espera-se o mínimo de bom senso e justiça. Em suma, se o custo de um processo associado a uma ação cível entre dois cidadãos recaí sobre aquele que perde a ação, o que ocorre quando o cidadão comum é alvo de uma ação de um procurador motivada pela representação ao ministério público de uma queixa de um coletivo? Enfim, como o cidadão comum pode se proteger de forma rápida e economicamente viável da ação movida por esses procuradores, e de coletivos que aparelham a máquina estatal? Que medidas deveriam ser aplicadas a um procurador que comprovadamente tenha agido de má fé na sua acusação?
Uma Última observação sobre este caso, que talvez ajude a refletir melhor sobre o evento em si. O então grupo em que foi publicada a foto pelo aluno da UFSC tinha o costume de realizar votações entre os membros do grupo (cerca de 5 mil pessoas) para escolher os seus moderadores. Curiosamente, após o evento da foto, e realizada a votação, o membro mais votado para ser moderador do grupo (com o dobro de votos do segundo colocado) foi exatamente o aluno que publicou a foto e acusado injustamente de racismo. Será isso uma indicação que os membros do grupo que o escolheu como moderador são racistas, ou será isso simplesmente uma desaprovação pública da injusta leitura racista que o movimento negro militante da UFSC desejou dar a foto?
*Marcelo Carvalho
Professor do Departamento de Matemática da UFSC