Interdisciplinaridade na UFSC

Nos 49 anos que se passaram desde que cheguei à UFSC muitas mudanças ocorreram nas universidades federais. Adotando modelos do exterior, o Brasil conseguiu estruturar um sistema universitário academicamente bem mais evoluído do que aquele existente antes da reforma universitária. Além da graduação conseguimos implantar com sucesso a pós-graduação e a pesquisa. Por dever constitucional, muito sabiamente imposto, nos falta desenvolver uma extensão mais abrangente, que seja verdadeiramente indissociável do ensino e da pesquisa.
No modelo universitário adotado atualmente na UFSC, os professores da pós-graduação orientam alunos de doutorado, mestrado e graduação. Forma-se assim um processo virtuoso de agregar e gerar conhecimento que flui naturalmente para o ensino universitário em todos os seus níveis. A participação em bancas de defesa de trabalhos de conclusão desses cursos também contribui bastante para melhorar a atuação dos docentes no ensino e na pesquisa.

Um dos problemas desse modelo é a dificuldade de vinculação dos temas de pesquisa com as reais necessidades da sociedade brasileira. A famosa torre de marfim pode estar sendo construída na UFSC na exata medida em que a extensão não se desenvolve de maneira articulada e indissociável com a pesquisa, como via de mão dupla. Sem essa vinculação, como bem coloca o nosso colega Silvio Botomé, a pesquisa alienada pode conduzir a um ensino alienante.

A graduação necessariamente organiza-se como atividade universitária regular justapondo disciplinas curriculares, com vistas à formação de profissionais de nível superior. Já a pesquisa e a extensão são operacionalizadas através de projetos específicos, dependentes, em geral, de financiamentos externos. O problema que se coloca em relação à indissociabilidade é que a pesquisa, bastante vinculada com a pós-graduação, é essencialmente acadêmica e disciplinar, enquanto a extensão, vinculada à realidade transdisciplinar da sociedade externa, precisa ser geralmente interdisciplinar.

Em 1984 estive na França atuando em um programa de cooperação acadêmica. Naquela ocasião os franceses estavam implantando a reforma da sua reforma universitária. A motivação desta mudança estava na constatação de que as universidades francesas estavam produzindo muitas pesquisas avançadas, mas que os conhecimentos gerados estavam sendo aproveitados principalmente fora da França, sem beneficiar adequadamente à sociedade daquele país.
Assim, acredito que um grande desafio atual da UFSC está na montagem de mecanismos apropriados de atuação interdisciplinar, capazes de aglutinar competências de pesquisa disciplinar em programas de extensão e pesquisa. As direções de Centro e as pró-reitorias poderiam desempenhar um papel viabilizador de tais programas de caráter mais abrangente, envolvendo vários departamentos. Como exemplo, a mobilidade urbana encontra competências complementares espalhadas por toda a nossa Universidade.

O planejamento estratégico, devidamente respaldado nas competências e interesses departamentais, pode atuar como eficiente agente agregador de esforços, capaz de melhorar significativamente a eficácia institucional da UFSC. Vale lembrar que no Brasil cerca de 80% das competências para inovação estão nas universidades e que estas instituições são as únicas que podem visualizar as problemáticas da sociedade por mÚltiplos ângulos, permitindo encontrar soluções de máxima eficácia social.

Raul Valentim da Silva
Professor aposentado