é difícil viver transições. Professores de minha geração foram criados na educação disciplinadora e tentam agora ensinar para indivíduos hipermodernos. O problema não é a educação ter mudado e acompanhado a modernidade. Os problemas são como lidar com qualidades e problemas da própria modernidade.
As opções plurais da modernidade permitem que as sociedades sigam caminhos alternativos. No caso da sociedade brasileira, o caminho percorrido deslocou a educação como referência central na formação dos jovens. Paralelamente a inclusão de novos valores, o que é positivo, houve a deterioração da polidez e da construção de virtudes na educação familiar e da dedicação ao estudo na educação escolar. Apesar da retórica elogiosa para a educação, “tudo pela educação”, os professores sentem na prática este problema. Três fenômenos da modernidade contribuem para este deslocamento.
Primeiro, a multiplicação dos meios de comunicação tirou o monopólio da informação da escola. A própria modernidade gerou o desenvolvimento técnico que permite a divulgação ampla. Produziu também inovações, fatos novos e diversidade de opiniões. A informação não é mais transmitida apenas na forma culta. A informação se popularizou. A escola ficou como reduto da forma monótona de transmitir informação e de fazer análise profunda. Mas quem se interessa por análise profunda? Como um professor pode competir com a tela colorida de um computador?
Segundo, a modernidade criou uma variedade de formações que permite diversas formas de inserção no mundo econômico. Várias atividades passaram a ser bem remuneradas, o que é positivo. A valorização mercantil se diversificou para atividades ligadas à cultura, entretenimento e diversão. O lado negativo está em se considerar a formação universitária como um caminho longo e sem garantia de boa remuneração no futuro. Além disso, as exigências de consumo fazem com que o curto prazo tenha preferência em relação a formação gradual e contínua do estudo. Afinal, para que estudar tanto se não há garantia de boa remuneração?
Terceiro, houve a ampliação de valores sociais e individuais, com novas exigências sobre o Estado quanto a cidadania, mais respeito ao meio ambiente e preocupações com a identidade individual, o que é positivo. Paralelamente, houve questionamentos à educação moderna familiar, acusada de repressora, e escolar, acusada de reprodutora. O que era uma premissa na primeira modernidade, disciplina para aprender, passou a ser encarada como uma oposição. Agora o lÚdico é o meio para atingir a felicidade do novo indivíduo, naturalmente bom e socialmente progressista. Auto-estima e pensamento positivo são orientações que ganharam hegemonia na formação. Estudo sistemático e avaliação externa perderam a centralidade que tinham. Triste e frustrada a geração que viveu como aluno disciplinado, estudou muito, planejou seu futuro para ser professor e, agora, tem que cuidar da auto-estima do aluno.
Sociedades e indivíduos devem saber lidar com a modernidade, seus benefícios e malefícios. A centralidade da educação permite organizar e ordenar valores e orientar formações para resultados mais eficientes para indivíduos e sociedade. No caso brasileiro, a modernidade tem trajetória desequilibrada e caótica. O problema não é a modernidade mas a forma mal educada, tanto na família quanto na escola, como passamos a lidar com ela. Os competidores no mercado internacional agradecem a confusão brasileira.
Wagner Leal Arienti
Professor do Departamento de Economia e Relações Internacionais da UFSC