O curso de Jornalismo da Universidade Federal de Santa Catarina criou a Cátedra RBS – Rede Brasil Sul –, empresa associada à Rede Globo de Televisão, ambas defensoras e mantenedoras do monopólio nas comunicações. Portanto, opositoras de qualquer forma de democracia participativa e igualitária. O objetivo dessa Cadeira de Ensino é preparar jornalistas técnicos e subservientes – mas não críticos e independentes – para atuarem nos órgãos de comunicação da RBS espalhados na região Sul do país. É uma interferência não apenas pedagógica, mas principalmente política na autonomia da universidade, com a aprovação do Colegiado do Departamento de Jornalismo e a aquiescência da administração central da UFSC. Sem dúvida, um assunto para uma intervenção do Conselho Universitário (CUn), caso ele fosse zeloso de suas funções acadêmicas, pedagógicas e políticas e as exercesse com autonomia.
Luiz Carlos Prates – comunicador que se tornou conhecido em Santa Catarina por suas posições reacionárias, quando não fascistas, apresentava-se, em seu currículo, como “colaborador do curso de Jornalismo da UFSC na disciplina “Cátedra da RBS””d+ por sua vez, Rogério Christofoletti, professor do Departamento de Jornalismo, afirmou que “são bem-vindas iniciativas como a da Globo Universidade, de aproximar seus quadros profissionais e empresas às escolas. Bem como é oportuna a criação de cátedras específicas, como a Cátedra RBS da UFSC”d+ já o estudante de Jornalismo de nome Pedro lembra que “tal disciplina [refere-se ao seminário optativo da Cátedra RBS] servia como programa de curiosidades sobre o dia a dia de profissionais do grupo RBS e um exemplo de atuação na academia de um grupo monopolista da mídia catarinense. Acho importante [continua Pedro] que se tenham matérias práticas no curso e que o jornalista que saia da Universidade esteja de alguma forma em sintonia com o que se produz no mercado, sempre com o posicionamento crítico que a academia promove e que, via de regra, o mercado aniquila. […] Trata-se de não sairmos como um “apertador de botões”, coisa que matérias como a Cátedra RBS, além das implicações políticas, insistem em querer promover”. Disponível em: http://monitorando.wordpress.com/2009/10/22 . Acesso em: 20 jan. 2011. (Texto extraído do livro Crítica à Razão Acadêmica – reflexão sobre a universidade contemporânea, 2ª ed. Florianópolis: Insular, 2012, p. 57-58).
O imperialismo, que se manifestou durante todo o século XX por meio da hegemonia financeira, busca novas formas para continuar levando o excedente econômico das “raças inferiores”, tal como a dominação cultural. O liberal John A. Hobson, em seu clássico livro Imperialism: A Study (1902), analisa o papel desempenhado pela educação superior, disfarçada de patriotismo, na defesa dos interesses imperialistas ingleses. “A mão que pode oferecer ajuda e proteção é também a que põe algemas à liberdade intelectual de nossas universidades, e o fará, cada vez mais, enquanto não nos dermos conta de que o ensino superior deve ser financiado com recursos públicos”. Ele criticava a aristocracia da Inglaterra que pagava os salários dos professores universitários, sendo que em troca tais “mestres” deveriam ensinar as teorias econômicas conservadoras, apresentar a história dos vencedores e defender os interesses dos ricos na da imprensa escrita.
O marxista James Petras, em seu trabalho Ensaios contra a Ordem (1995), mostra as duas faces do imperialismo cultural: o econômico e o político. O econômico conquista mercado para seus produtos culturais e estabelece uma hegemonia, moldando a consciência popular. Para tanto, a exportação de enlatados do “entretenimento” se tornou uma das fontes mais importantes de acumulação de capital e de lucros globais, chegando a tomar o lugar das manufaturas industrializadas. Já o político tenta dissociar as pessoas de suas raízes culturais e de suas tradições de solidariedade, substituindo-as pelas necessidades criadas pela mídia que mudam a cada campanha publicitária. O resultado imediato de tudo isso é a alienação do povo em relação a sua classe tradicional e aos seus vínculos comunitários.
Nessa perspectiva, você já imaginou a “Cátedra Monsanto” em um departamento do Centro de Ciências Agrárias que tenha por objetivo estudar e pesquisar a agricultura familiard+ ou a “Cátedra Friedrich Hayek” em um departamento do Centro Sócio-Econômico que deva ensinar a pluralidade das teorias de economiad+ ou ainda a “Cátedra João Havelange” em um departamento do Centro de Desportos que pretenda ver o esporte como lazer e saúde para a população! Pois bem, tudo isso significaria pôr a universidade a serviço do monopólio monsantense, da servidão hayekiana e da corrupção havelangiana.
Penso que cátedras devam existir, sempre e quando as mesmas levem os estudantes a pesquisar em profundidade a ciência e o conhecimento que, por sua vez, ajudem as pessoas a viverem mais e melhor. Tampouco resolve criar uma cátedra em oposição a outra, isso porque com os representantes do imperialismo cultural monopólico não se compete, mas sim, se luta.
Waldir Rampinelli
Professor do Departamento de História