A “nova Apufsc”, um arremedo ou simulacro de sindicato, foi criado com o apoio de muitos professores do Centro de Filosofia e Ciências Humanas (CFH). Alguns deles já se aposentaram, outros se afastaram por completo do movimento e terceiros se calaram diante do monstrengo surgido. Na verdade, a vergonha foi estabelecida por conta de uma associação que nos representa mal, ou melhor, que não sabe nos representar. Guardar silêncio diante disso seria uma atitude bastante parecida com a estupidez, diriam os proclamadores da Junta Tuitiva na cidade de La Paz. Abordo, neste breve artigo, três pontos relacionados às lideranças da “nova Apufsc” que julgo de fundamental importância: a lista eletrônica, a violação do estatuto e o desprezo pelas ciências humanas.
A “lista de discussão” eletrônica da “nova Apufsc”, da qual participam vários docentes do CFH pensando que ali se poderia disputar uma hegemonia política sobre determinados temas, foi hegemonizada por uma nova direita com rasgos nitidamente fascistas. Enquanto o pensamento conservador defende o status quo, aceitando as normas democráticas burguesas, já a “nova direita” se utiliza do golpismo para atingir seus objetivos estratégicos, desprezando completamente a democracia representativa. Por sua vez, o fascismo se manifesta por meio de um furioso preconceito contra negros, indígenas, pobres, mulheres, bem como contra as pessoas que assumem publicamente uma ideologia de esquerda ou uma diversidade sexual. A verdade dos fascistas não consiste em uma ideia verdadeira, mas sim em uma ação verdadeira, sendo verdadeira toda aquela atitude que seja eficaz. Na definição de João Bernardo, é “uma revolta dentro da ordem”.
Tais professores que dominaram a “lista de discussão”, além de aulas, exercem o papel de educadores. O resultado imediato aparece quando um grupo de alunos não só ataca os servidores técnico-administrativos em greve como também grita palavras de ordem de “fascismo”, “fascismo!”, obviamente que sem saber exatamente o significado e a dimensão deste conceito. Independente disso, estão chocando ovos de serpente. Penso que o Ministério Público Federal, em continuando tais ideias a se difundirem pela “lista”, deva tomar providências o mais rápido possível. Liberdade de expressão não se confunde com a defesa de teses racistas, preconceituosas e de incitamento à violência. Dou apenas dois exemplos: determinado professor chegou a propagar, na “lista de discussão”, a necessidade de demissão de todos os professores da universidade que estejam filiados ao sindicato do Andes-SN da UFSC, em uma verdadeira operação limpeza, já “que por certo não fariam falta nenhuma à instituição”d+ outro professor afirmou, categoricamente, que se sente “alegre” quando chega a notícia de que morreu um colega “esquerdista”. As milícias de Hitler e Mussolini pensavam assim, também, quando se tratava de aterrorizar os partidos políticos e os sindicatos de classe, submetendo-os ao total isolamento.
O estatuto da “nova Apufsc”, feito à imagem e semelhança de seus líderes e apoiadores conservadores, já não responde mais aos anseios da “nova direita”, sendo necessário violá-lo para lograr seus objetivos. Enquanto os conservadores defendem a estratégia de uma mudança estatutária para acompanhar a realidade, já a “nova direita” não esboça nenhuma preocupação com tais normas, pois elas serão quebradas toda vez que se fizer necessário. E sempre em nome da “ordem”. Foi exatamente assim que o nazismo começou sua rápida caminhada ao poder, desrespeitando uma democracia representativa débil e rompendo-a quando a mesma impedia a realização de suas estratégias.. Os fins justificam os meios. Todos os vícios que a “nova Apufsc” criticava da “velha Apufsc”, não apenas os reproduz, como vai, perigosamente, mais longe: busca liquidar com a auto-organização da categoria impondo a hetero-organização, outra das características do trabalhador fascista.
Um código de conduta para o docente universitário, muito utilizado pelos brancos racistas durante o regime de escravidão no Brasil, começa a ser esboçado pelos líderes da “nova Apufsc”, quer na lista eletrônica, quer nos artigos publicados. O verdadeiro pesquisador é aquele que produz, essencialmente, para o mercado. Fundamentado nessa realidade, um docente do Centro Tecnológico (CTC) da UFSC defendeu na “lista de discussão” que se as Ciências Humanas recebem algum recurso elas devem ser gratas ao CTC, que faz o nome da universidade e possibilita que outras áreas se beneficiem dessa condição. Portanto, nessa ótica, “somos mais, valemos mais e temos o direito de ter um sindicato de acordo com os nossos interesses”. Terry Eagleton afirma que, do mesmo modo que não pode ter um pub sem álcool, igualmente não pode existir uma universidade sem as humanidades. Se a história, a filosofia e as demais [ciências humanas] se desvanecem da vida acadêmica, o que deixarão atrás de si serão instituições de formação técnica ou institutos de pesquisa empresarial. Porém, não será uma universidade no sentido clássico do termo, e seria enganoso denominá-la assim. Tampouco haverá uma universidade no sentido pleno do termo quando as humanidades existem isoladamente das demais disciplinas (EAGLETON, Terry. La muerte de las universidades. In: BORON. Atílio. Disponível em: http://www.atilioboron.com/2011/01/universidades-y-capitalismo.html . Acesso em: 23 jan. 2011).
A “nova Apufsc” fechou-se sobre si mesma, evitando qualquer relação com o nacional, projetando sérios problemas para um futuro muito próximo, já que nossa carreira não é local. Corremos o risco de estarmos fora de conquistas concedidas aos docentes organizados em todo o Brasil, tanto no tocante a investimentos na educação como vantagens salariais. Quando isso ocorrer, os responsáveis por tamanho descalabro lavarão as mãos (muitos já estarão aposentados) e nada dirão, como já o fizeram com a conquista fracassada da URP, tão prometida e tão decantada.
Lembro, àqueles que pensam que a gravidade dos fatos não lhes toca e que guardam um silêncio bastante parecido com a cumplicidade, o poema de Maiakovsky quando diz: “… até que um dia o mais frágil deles entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a lua e, conhecendo o nosso medo, arranca-nos a voz da garganta. E porque não dissemos nada, já não podemos dizer nada”.
É hora de dizer um basta a este sindicato que caminha rapidamente para se transformar em uma organização corporativa, fechada, excludente, autoritária, machista, violadora de suas próprias normas internas e nada condizente com a representatividade que deveria exercer em favor da categoria de todos os docentes da UFSC.
Waldir José Rampinelli
Professor do Departamento de História