Prof. Fábio, em um texto intitulado “A volta dos que não foram”, demonstra toda sua contrariedade com a forma como a Apufsc conduziu a greve, tecendo críticas tanto à diretoria quanto ao comitê de greve. Tal contrariedade, contudo, parece ofuscar seu discernimento sobre alguns pontos que marcam uma diferença fundamental entre a forma como a Apufsc e o Andes exercem seu mandato sindical. É o que mostrarei a seguir.
O autor afirma que a Apufsc evitou o debate sobre o movimento nacional de greve pelo fato dela estar vinculada ao Andes, e critica a Apufsc pelo fato de só ter iniciado a discussão um mês após o início da greve comandada pelo Andes. Há vários equívocos que precisam ser esclarecidos. Inicialmente, lembramos que a Apufsc, não sendo mais seção sindical do Andes, segue sua própria dinâmica quanto à deliberação de greves, não se sujeitando mais às formas arcaicas e pouco participativas utilizadas pelas seções sindicais do Andes. Assim, conforme consta no regimento da Apufsc no seu capítulo 2, artigo 17, vemos que assembleias gerais podem ser solicitadas pelo CR, ou por requerimento de 5% dos associados, ou pela diretoria. No parágrafo 1, está bem claro que a convocação de AG pela diretoria deve ser feita caso o CR não possa se reunir, ou em caráter emergencial em assuntos que dizem respeito à categoria. Assim, pelo regimento, não compete a diretoria se antecipar ao CR. Foi o que ocorreu. No dia 31 de maio, o CR deliberou por uma assembleia de indicativo de greve que ocorreria no dia 14 de junho. Nesse interim, a Apufsc solicitou que os vários centros discutissem propostas que seriam levadas à assembleia do dia 14 de junho. Pelo que sei, houve pouca participação dos centros nessa discussão preliminard+ a do CFM, por exemplo, contou com a presença de apenas 5 pessoas. Vemos então que naquele momento havia pouco interesse pela greve por parte dos professores. É inacreditável que se critique a diretoria da Apufsc por isso, alegando que faltava informação, pois um acesso à página da Apufsc na internet prova exatamente o contrário. Diariamente (exceto fins de semana) são postadas as mais variadas notícias de interesse dos professores, inclusive notícias vinculadas ao Andes, o que serve para refutar a afirmação do prof. Fábio de que a Apufsc faz oposição sectária a Andes.
Prof. Fábio também lamenta que entre a assembleia dos dias 20 e 21 de junho que decidiu pela greve, e o início da mesma, dia 11 de julho, faltou ao então Comitê de Mobilização: “ações mobilizatórias, contato com as instâncias nacionais responsáveis pela condução do movimento, e a convocação de reuniões por Centro”. Não sei se o professor Fábio levantaria tal ponto caso a decisão da última assembleia fosse pela manutenção da greve. Mas, desconsiderando isso, será que professores precisam mesmo de atos mobilizatórios para se engajar numa discussão? Na verdade, o grau de mobilização dos professores é um indício importante que precisa ser corretamente interpretado pelo sindicato antes de se pensar uma greve. O problema é que no Andes as greves são sempre determinadas e conduzidas por uma minoria que se faz atuante em deliberações que, em geral, não contam com uma presença expressiva de docentes. Assim, no Andes é sempre em relação a um universo minoritário que se mede a mobilização do movimento. Logicamente, para alguém acostumado a essa dinâmica andesiana é conveniente alegar falta de mobilização num sindicato como a Apufsc, quando assembleias ordinárias devem reunir um mínimo de 120 professores (5% dos associados), número provavelmente superior ao de associados da dita seção sindical da Andes na UFSC, isto para não mencionar os mais de 600 professores (25% dos associados) necessários para deliberações de greve.
Merece atenção especial a insistência do prof. Fábio para que o Comitê de Mobilização contatasse instâncias nacionais responsáveis pela condução do movimento. Isso se deve a percepção de que a nível nacional o governo não negocia com sindicatos que aglomeram poucas seções sindicais, o que afeta diretamente a Apufsc na condição de sindicato independente. De certa forma, tal preocupação faz sentido, contudo, tal situação começa a mudar com a movimentação para fundar a federação dos sindicatos independentes. Apesar disso, devemos lembrar que os associados da Apufsc aceitaram esse risco ao decidirem pela desfiliação do Andes. No momento, há dois sindicatos com o qual o governo negocia, o Andes e o Proifes. Diante dessa conjuntura, cabe à Apufsc solicitar sua participação nas negociações com o governo, constituída como uma terceira entidade e, na negativa, analisar as propostas apresentadas na negociação com o governo que lhe seja mais favorável, quer seja do Andes ou do Proifes. Não há, obviamente, um acordo entre todos os pontos de uma proposta e, portanto, escolhe-se a que se apresenta mais razoável. Assim, o Comitê fez a avaliação das propostas e fez uma recomendação à assembleia, que deliberou pelo fim da greve. A posição do comitê não me parece determinante para decidir os rumos da greve, os resultados opostos nas duas últimas deliberações em urna mostram isso, afinal, a posição do comitê não havia mudado. Na verdade, as pessoas votam pela consideração de vários fatores e não exclusivamente pelo que o comitê recomenda ou pelo que é dito nas assembleias. Vale muito mais o que elas refletem em particular, conversando com colegas, se informando e, finalmente, ponderando no que consideram melhor. É muito significativa, embora equivocada, a afirmação do prof. Fábio de que o Comando Local de Greve da Apufsc agiu com o único intuito de impedir o fortalecimento da Andes. Significativa, pois reconhece que a Apufsc tem força para se contrapor a um Andes que estaria então enfraquecidod+ e equivocada porque não há ninguém na Apufsc preocupado com isso. De fato, depois da desfiliação, penso que o Andes não tem importância alguma para a Apufsc.
Voltemos à questão da greve. Qual a razão da greve, afinal? Alguns dirão: salário, estruturação de carreira, melhores condições de trabalho, etc.. Perfeito! Como pensar então a questão complexa da estruturação da carreira? No mínimo, este tópico demanda a criação de um GT tendo como ponto de partida alguma proposta concreta. Poderia ser, por exemplo, a possibilidade de equiparar a carreira docente com as dos pesquisadores vinculados ao MCT. De qualquer modo, carreira não me parece um ponto que deva ser discutido de forma superficial, e enquanto não tivermos uma proposta consensualmente construída não deveria nem estar em questão. Enquanto perdurar isso, devemos tão somente evitar que o governo imponha uma restruturação de carreira da qual nem tomamos parte na sua construção. Agora, não faz sentido algum o prof. Fábio afirmar que se passou a greve discutindo propostas abstratas sem nenhum resultado prático, transformando a greve em um simpósio universitário sobre salário e carreira. Primeiro
continuaEgtd+Egtd+ porque, em relação à carreira, tal simpósio nem mesmo ocorreu e, segundo, se realmente tal simpósio tivesse ocorrido pelo menos a greve teria servido para uma melhor compreensão da questão.
Há algo confuso no discurso do prof. Fábio que precisa ser esclarecido. No penúltimo parágrafo de seu texto ele insinua que a Apufsc deve muito ao governo petista que, supostamente, nos deu certa trégua com reajustes espontâneos, afirmando então que a Apufsc fomenta um ambiente desinformado e despolitizado (este termo deve ser entendido como incluindo o partidarismo, como veremos a seguir). Ora, uma das razões que levou a desfiliação da Apufsc ao Andes foi exatamente a necessidade de despolitizar o sindicato no sentido de não permitir o aparelhamento da sua diretoria. Dentro do Andes isso é impossível, pois a sua associação com a Conlutas acaba alinhando o sindicato para os objetivos e diretrizes do PSOL e PSTU. O sindicato passa a ser então um instrumento de ação político-partidária e não mais um organismo de defesa dos interesses da categoria. Chamo a atenção do prof. Fábio de que as palavras costumam encerrar mais significado do que o uso comum revela. Assim, aquilo que classifica o Proifes como pelego também faz do Andes pelego. Com efeito, potencialmente pode ocorrer que um dia PSOL ou PSTU se tornem governo (o que equivale a vivermos numa ditadura socialista), o que levará o Andes à mesma condição atual do Proifes. Ou seja, o Proifes de hoje é o Andes de amanhã, enquanto o Proifes de amanhã é o Andes de hoje. Agora, coloquemos um pouco de racionalidade na discussão. Onde o PSOL e PSTU são melhores ou piores do que o PT, PSDB, DEM, PP, PSD, PTB, PDT, PP, PCO, PCdoB, PCB etc.? Afinal, são diferentes no que? Não é tudo partido político?
Definitivamente, o Comitê de Greve nos surpreendeu decidindo que todos os professores poderiam participar da deliberação pelo fim ou continuidade da greve. O que parecia uma heresia da Apufsc em subverter o que até então nunca havia sido proposto, ou sequer concebido como possível de regimentalmente ser feito, se mostrou eficaz e engenhoso. Eficaz porque evidenciou a forma verdadeiramente justa de tratar uma greve que afeta a todos – sindicalizados ou nãod+ e engenhoso porque se tirou do Andes qualquer pretensão de representar, com suas assembleias esvaziadas, a opinião dos professores em relação à manutenção da greve. Com efeito, se o Andes alegar que realizou uma assembleia que decidiu pela continuidade da greve ela estará admitindo que não aceita a deliberação dos professores da UFSC na votação universal conduzida pela Apufsc, onde os próprios associados do Andes puderam participar. Insistir nisso revelará uma postura antidemocrática. Claro, sempre há uma saída, por exemplo, alegar que a consulta dos não-sindicalizados foi dificultada por ela ter se concentrado num único lugar (a sede da Apufsc). Imagino que a mesma crítica deva ser feita em dias de eleições obrigatórias aqui no Brasil, não é mesmo? Talvez o modelo das ditaduras socialistas, por exemplo, a ditadura cubana, agrade os descontentes.
Prof. Fábio finaliza afirmando em tom profético: “Veremos o quanto vale transformar greves em simpósios acadêmicos. Veremos o quanto vale reduzir a atividade sindical a assinar um nome na lista e fazer um xis em um papel”. Essa assertiva me parece meio incompleta e ambígua. Do jeito que está escrita se concebe a atividade sindical unicamente do ponto de vista de sua manifestação coletiva em assembleias. Tem suas motivações. Com efeito, esse modelo assembleísta é essencial para o projeto da construção do modelo ditatorial socialista (isso começou com a espoliação dos sindicatos ingleses pelos marxistas no início da revolução industriald+ algo que PSOL e PSTU repetem via a Conlutas). Na universidade, o assembleísmo usa o recurso de longas e intermináveis assembleias para desestimular a participação da massa de professores que se recusa a trocar sua função de docente pelo exercício do sindicalismo profissional (é aqui que se origina a falácia do discurso “produtivista” como forma de proteção daqueles que já não conseguem fazer nada academicamente original). Quando esse modelo assembleísta é substituído (no caso da Apufsc), os professores voltam a participar das decisões do sindicato usando seu tempo racionalmente, assim, o “X” marcado num papel reflete uma decisão de pessoas que pensam! Como vemos, isso só traz ônus para aqueles que desejam usar o sindicato para fins ideológicos. Agora, devemos nos perguntar se vale mais a pena o modelo assembleísta da Andes, altamente politizado e movido por frequentes assembleias reunindo poucos professores e que mais parece uma confraria de amigos, ou o modelo da Apufsc que por vezes mal consegue quórum em assembleias ordinárias, mas que, em decisões importantes, consegue reunir mais de 900 professores.
Em tudo o que se tem escrito e dito em assembleias por ocasião da greve, vejo uma ausência de qualquer preocupação com o efeito da greve na formação acadêmica dos nossos estudantes. Talvez tenhamos nos tornado egoístas e assim vemos nossa profissão como um mero negócio que se resume a uma relação patrão-empregado que se sobrepõem à nobre missão que a sociedade nos deu de formar nossos jovens. Talvez tenhamos perdido o sentido do que significa excelência acadêmica ao achar que a greve não causa transtornos irreversíveis nos cursos que ministramos, e por isso tratamos os conteúdos de forma superficial e sem a devida importância. Talvez tenhamos nos tornado cínicos a ponto de dizer que lutamos contra a precarização da universidade sem reconhecer que ao comprometer a formação dos nossos estudantes nós também passamos a contribuir para a mesma precarização. Qualquer que seja a causa, eu deixo que cada um responda por si e, de preferência, diante de seus alunos.