Governo faz valer maioria, atropela oposição e, sob protestos de professores, estabelece nova política salarialSob vaias, protestos e tumulto, o projeto de lei complementar (PLC) que altera o salário e o plano de carreira dos professores foi aprovado, ontem, com 28 votos contra oito. Mas só após uma manobra que mandou o projeto direto para a votação em plenário, evitando o pedido de vista – o que poderia adiar a aprovação. Para valer, o PLC aguarda assinatura do governador Raimundo Colombo.
A discussão do PLC começou às 14h e foi até 19h, quando encerrou a sessão, acompanhada por cerca de 4,2 mil professores, presentes dentro e fora do plenário. Policiais à paisana foram colocados no auditório. Para ser aprovado, o projeto precisava passar pela análise de três comissões: Constituição e Justiça (CCJ), Finanças e Serviço Público. Foi convocada uma reunião conjunta das três. A deputada Luciane Carminatti (PT) pediu para a Comissão de Educação também participar.
Para não passar por esse trâmite, e alegando urgência na votação, um requerimento apresentado pela CCJ, assinado por cinco deputados e também aprovado pelos cinco, pediu para o projeto ir direto ao voto em plenário, onde 31 deputados são da base governista e nove da oposição.
O presidente da comissão, Romildo Titon, garantiu que não houve quebra de regimento interno, porque situações não previstas podem ser resolvidas recorrendo ao regimento da Câmara dos Deputados, que permite a manobra. Para ele, a situação era de urgência, não sendo possível haver pedido de vista, o que faria com que o PLC só fosse votado em agosto.
– Entrar em recesso sem decidir essa questão seria uma irresponsabilidade, uma vergonha. A Assembleia cumpriu seu papel para que as aulas voltassem – afirmou.
O presidente da Assembleia, Gelson Merisio, também entende que o regimento não foi ferido e que é preciso respeitar a posição da maioria. Para o líder do PT, deputado Dirceu Dresch (PT), foi uma maneira de atropelar a discussão.
– O projeto não estava em caráter de urgência, não tinha lógica essa obrigatoriedade de votação hoje. Foi uma afronta às regras da casa – disse o líder do PT.
Quando o relator do projeto, Joares Ponticelli (PP), começou a ler o seu voto, os professores começaram a bater nos vidros do plenário. A sessão foi interrompida, por 20 minutos. Em seu relatório, Ponticelli votou pela aprovação. Apesar de não ser possível pedir vista, foi aberta a discussão.
Durante a votação, restavam poucos professores nas galerias e no hall. A coordenadora do Sindicato dos Trabalhadores em Educação (Sinte), Alvete Bedin, lamentou a aprovação e disse que a assessoria jurídica estudará outras maneiras para o governo cumprir a aplicação do piso na carreira.
Manobras e acusações de “teatro”
O projeto de lei complementar da educação aprovado ontem, na Assembleia Legislativa, foi o mote de opiniões divergentes entre os deputados. Até a impossibilidade de adiamento da decisão sobre a proposta que altera salário e plano de carreira dos professores foi alvo de questionamentos. O presidente da Comissão de Constituição e Justiça, Romildo Titon, alegou que a obrigatoriedade da votação, por meio de um requerimento, foi uma medida para atender ao apelo da própria sociedade.
Mas a oposição considera que a votação foi uma manobra do governo para pressionar os professores a retornarem às aulas e que ataca o regimento da casa, pela impossibilidade de se pedir vista. O líder do PT, Dirceu Dresch, sustenta que a proposta deveria ter sido mais debatida.
O relator do projeto, Joares Ponticelli (PP), afirmou que o “maior reajuste que o magistério já teve” não poderia ser perdido e que o ano letivo também deve ser levado em conta.
Segundo o líder do governo, Elizeu Mattos (PMDB), o projeto – que está na casa desde quinta-feira passada –, foi bem discutido. Para ele, mesmo os deputados de oposição que estavam na AL “fazendo teatro contra o projeto”, pelas costas, eram a favor. Além disso, o deputado não descarta a opção de continuidade das negociações depois do início das aulas. De acordo com Mattos, não havia possibilidade de continuar as discussões durante o recesso – que começa amanhã.
Desolação e briga no hall de entrada
Cerca de 1,6 mil professores com camisetas, faixas, cartazes, apitos e alto-falantes acompanharam a sessão da Assembleia. Todos gritavam palavras de ordem e acreditavam poder virar o jogo. Assim que o projeto passou pelas comissões, os manifestantes se calaram. Muitos choraram, sem forças para protestar. O hall de entrada da assembleia parecia um campo de batalha, perdida.
– Estão votando nossa morte. É o fim da educação catarinense – disse a professora Janete Miranda.
Ela é professora de sociologia trabalha em duas escolas de São José, tem 21 anos de magistério, duas graduações, uma pós-graduação e ganha R$ 2,4 mil. Segundo ela, o PLC diminui seus vencimentos.
– Eu ensino aos meus alunos que existe justiça, verdade e dignidade. Agora, voltarei para a sala de aula sem nada disso – desabafou Janete.
Policiamento recebe reforço do Bope
O tumulto na sessão fez o coronel Paulo Henrique, comandante do policiamento da Assembleia, pedir reforço ao Batalhão de Operações Especiais (Bope), que cercou o plenário. A medida revoltou ainda mais os manifestantes. Professores reclamaram de agressões, mas o coronel disse não ter registro de abusos.
Janete foi uma que disse ter sido agredida ao ajudar uma amiga.
– Eu apanhei aqui hoje. Fui humilhada por essa corja que nada no dinheiro – disse a professora.