Uma das expectativas em torno do novo Plano Nacional de Educação (PNE) era a definição das responsabilidades de cada um dos entes federados (municípios, estados e União) na execução das metas e estratégias do documento.
O tema foi o principal eixo da Conferência Nacional de Educação (Conae), que discutiu a elaboração do PNE e a criação de um Sistema Nacional de Educação, em maio de 2010. No entanto, o projeto de lei (PL 8.035/2010) encaminhado pelo MEC ao Congresso pouco avança em sua regulamentação.
A necessidade de criação de um Sistema Nacional de Educação foi incluída no artigo 214 da Constituição pela Emenda Constitucional nº 59, aprovada em 2009. A Campanha Nacional pelo Direito à Educação apresentou uma emenda ao PNE que prevê a promulgação de uma lei federal para regulamentar o tema no prazo de um ano.
Mas, segundo Carlos Abicalil, que representou o MEC em debate promovido pelo Todos Pela Educação na última terça-feira (9), o Sistema Nacional de Educação não deve ser regulamentado antes de quatro anos, período durante o qual o ministério espera discutir o assunto.
Abicalil explica que há diferentes posições sobre a forma de regulamentação do sistema, mas descarta seu detalhamento no novo plano. “A lei do plano é uma peça do sistema, não substitui nem propõe ser a sua regulação”, afirma.
“Minha opinião, expressa publicamente na Conae, é que isso derivaria de uma lei complementar que regulamente o artigo 23 da Constituição. Ainda não há uma posição do MEC”, disse Abicalil. “Nosso objetivo é que dentro dos quatro primeiros anos de execução do plano, e portanto no tempo da próxima Conferência, tenhamos condição de ter uma proposição de lei”.
PNE prejudicado
Ao ser questionado se a falta de regulamentação do sistema não prejudicaria a execução do PNE, Abicalil discordou. “[A regulamentação] não pode ser pré-plano. Até porque o plano não parte do zero, parte de um estado de responsabilidades atuais, compartilhadas e concorrentes entre as três esferas. Todos nós reivindicamos essa nova equação, mas não a temos ainda formulada”.
No entanto, a falta de definição clara de responsabilidades é criticada por pesquisadores e pessoas envolvidas com a elaboração do plano. “A fixação do regime de colaboração é fundamental, sem ela não se resolvem os problemas da educação no país. É preciso fixá-lo em lei, e o plano é tímido neste sentido”, afirmou Antônio Carlos Ronca, presidente do Conselho Nacional de Educação (CNE), durante o evento.
De acordo com Cleuza Repulho, presidenta da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) e também presente no debate, a execução das metas do novo plano ficará prejudicada se o regime de colaboração não funcionar. “É inviável que 80% dos municípios consigam chegar a qualquer uma das 20 metas”, disse.
Segundo Cleuza, que é secretária municipal de Educação de São Bernardo do Campo (município paulista), não existe efetivamente regime de colaboração entre o estado de São Paulo e a União, o que dificulta a implantação de políticas educacionais.
Atual secretário de Educação Especial do MEC, Abicalil assume nos próximos dias a recém-criada Secretaria de Articulação dos Sistemas de Ensino. A Educação Especial passará a ser responsabilidade da Secad.
“A nova secretaria tem uma tarefa intimamente vinculada ao desenho do plano conformador do Sistema Nacional de Educação, cumprindo sua tarefa de assistência técnica e financeira a estados e municípios, inclusive no formato de seus respectivos planos, guardando coesão e coerência com o definido nacionalmente”, explica.
Lei de responsabilidade
Mozart Ramos, do Todos pela Educação, ressaltou a necessidade de que se discutam também as consequências da não execução das metas, ou, em outras palavras, a punição de gestores que não cumprirem o novo plano.
De acordo com Ramos, o projeto original encaminhado pelo MEC à Casa Civil continha mecanismos de responsabilização, mas o texto foi desmembrado em outro projeto de lei (PL 8.039/2010). “No nosso entendimento [o projeto] é muito tímido. Assim, não vamos conseguir cobrar a realização das metas”.
Para Mozart, é preciso responsabilizar o gestor, mas também dar-lhe autonomia. O artigo 69 da Lei de Diretrizes e Bases (LDB) estabelece que o gestor da pasta de Educação seja o gestor dos recursos, mas isso ainda não acontece na maioria dos municípios. “Não é possível que ainda haja situações como um secretário que assina o cheque e não sabe como o dinheiro é gasto”, diz Mozart.