O uso da tecnologia na educação, dentro e fora da sala de aula, já é realidade em grande parte das escolas brasileiras e do resto do mundo.
Dados do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa, sigla em inglês), divulgados em dezembro, mostram que, no Brasil, 40,8% dos alunos com 15 anos leem e-mails e 56,2% usam chats. Outros países têm índices maiores – na Holanda, por exemplo, as taxas são, respectivamente, de 91% e 90,5%.
Apesar das oportunidades de aprendizado que a rede oferece, nem todos acreditam que a tecnologia impacte positivamente na educação. O Estado traz entrevistas com dois estudiosos que dividem opiniões. Para o professor da USP e coordenador do e-Learning da Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras (Fipecafi), Edgard Cornachione, a tecnologia aprofunda o aprendizado. Já a pesquisa de Felipe Barrera-Osorio, consultor do Banco Mundial, feita na Colômbia, revelou que os computadores tiveram pouco efeito sobre as notas de alunos.
ENTREVISTAS
Edgard Cornachione, PROFESSOR DA FIPECAFI E DA USP
“Impacto positivo é maior no ensino superior”
O professor da USP e da Fipecafi Edgard Cornachione é um grande defensor do uso da tecnologia nos processos de aprendizagem – uma de suas teses trata dos níveis de stress e a performance de aprendizagem de estudantes em ambientes virtuais. Para ele, não há dúvidas sobre a eficácia dos recursos digitais na educação.
Você acredita no impacto da tecnologia na educação?
Não só acredito como existem evidências empíricas disso. Está na literatura sobre o assunto, nas pesquisas. O efeito é visível especialmente no ensino superior.
Como assim?
O maior exemplo é a educação a distância (EAD). Não se verificou ainda prejuízos na aprendizagem final dos alunos. Para preservar a qualidade do seu aprendizado, eles têm de se dedicar até mais do um estudante de uma graduação presencial. Além disso, a literatura sobre esse tema hoje se debruça sobre a diferença que a tecnologia pode fazer nos processos educacionais. E as vantagens são muitas.
Você pode enumerar algumas?
Sim. Com o uso da tecnologia num curso EAD, por exemplo, o aluno sai da zona de conforto. Ele acredita mais em si e na sua capacidade de inventar. Além disso, a EAD não cria horas no relógio: quem controla o tempo é o aluno. Esse é um grande diferencial. Sem contar a questão do espaço e do deslocamento – ou seja, do trânsito – em centros urbanos. A EAD praticamente elimina isso. Mas devemos ressaltar que no Brasil isso tudo é muito recente ainda. O Ministério da Educação (MEC) tem apoiado a modalidade e nosso ciclo de desenvolvimento econômico exige isso.
Como você vê a relação entre tecnologia e educação no futuro?
A tendência que vem se desenhando há muitos anos é inegável. As salas de aula convencionais estão sentindo uma enxurrada de tecnologia. As ferramentas são múltiplas. A educação mediada por tecnologia oferece interfaces alternativas. A geração mais nova de estudantes não consegue ficar muito tempo lendo, por exemplo. Se as escolas e as universidades não se adaptarem às novas tecnologias, o que vai acontecer com elas?
QUEM É
Edgard Cornachione é coordenador do e-Learning da Fipecafi e livre-docente pela USP, onde leciona na Faculdade de Economia e Administração. Tem dois doutorados pela University of Illinois at Urbana-Champaign (EUA) – um deles na área de educação online.
Felipe Barrera-Osorio, CONSULTOR DO BANCO MUNDIAL
“Ainda faltam pesquisas para comprovar eficácia”
O consultor do Banco Mundial Felipe Barrera-Osorio avaliou o impacto de um programa do Ministério de Comunicação da Colômbia que doou 114 mil computadores a 6 mil escolas, envolvendo 2 milhões de alunos e 83 mil professores. A ideia era que as máquinas fossem utilizadas no ensino de espanhol e matemática. Em sua pesquisa, Barrera-Osorio usou uma amostra de 100 escolas – 50 com o programa e 50 sem – e constatou que a iniciativa teve um efeito pífio sobre as notas dos alunos.
O que você percebeu com o estudo?
A avaliação apresentou resultados muito preocupantes: em termos gerais, o programa parece ter tido pouco efeito sobre as notas dos alunos nos testes e em outros resultados, como impacto na quantidade de redes de amizades e grupos de trabalho. Esses resultados são consistentes em níveis de ensino, conteúdos e gêneros. Parece que os computadores não influenciaram a experiência diária de aprendizagem dos alunos.
A que você atribui isso?
A principal razão parece ser a falha em incorporar os computadores em todo o processo educacional. Dados mostram que os professores não incorporaram os computadores em seus currículos. Isso significa que, mesmo recebendo treinamento, é difícil para eles utilizarem computadores no dia a dia.
Existem atividades que podem ser desenvolvidas com computadores para melhorar a aprendizagem?
Na minha opinião, não temos dados suficientes para saber se atividades com os computadores podem melhorar a aprendizagem. Computadores são apenas ferramentas e, como qualquer ferramenta, podem ter aspectos positivos e negativos. Precisamos de mais pesquisas.
Você acredita que o computador possa modificar a aprendizagem de um aluno?
Uma constatação da literatura recente – e, novamente, é uma evidência fraca – é que os computadores que vão diretamente para as crianças são mais eficazes do que seu uso mediado pelo professor. Em outras palavras, é difícil para um professor mudar sua prática pedagógica.
QUEM É
Felipe Barrera-Osorio é economista do Banco Mundial. Tem doutorado pela Universidade de Maryland (EUA). É especialista nas áreas de avaliação de impacto, proteção social e educação. Já trabalhou em programas no Chile, Jordânia, Quênia e Paquistão.