Advogados, sindicalistas e servidores criticaram em audiência pública nesta terça-feira a determinação do Tribunal de Contas da União (TCU) de que o Ministério do Planejamento reveja o pagamento de valores referentes a sentenças judiciais que causem distorções salariais ou enriquecimento ilícito do servidor. A recomendação é que os ganhos percentuais não sejam aplicados automaticamente sobre todas as parcelas salariais do servidor.
Na prática, de acordo o auditor do TCU Pedro Ricardo Apolinário, o objetivo é impedir que, quando há reajuste por planos de carreira, as rubricas judiciais se apliquem sobre à carreira reestruturada. O acórdão 2161/2005, do TCU, considera procedente representação contra distorções salariais decorrentes do incorreto processamento de vantagens oriundas de planos econômicos. Conforme a decisão do TCU, os órgãos públicos deverão fazer o levantamento das quantias pagas indevidamente aos servidores, para que sejam devolvidas aos cofres públicos.
A audiência, realizada pela Comissão de Legislação Participativa, discutiu a segurança jurídica em relação aos direitos dos servidores.
Julgamento do julgamento
Os críticos da decisão do TCU, como o especialista em Direito Constitucional e professor da PUC de São Paulo André Ramos Tavares, afirmam que o acórdão (decisão proferida por tribunal em grau de recurso) pretende desfazer decisões já tomadas e transitadas em julgado. Tavares avalia que, com esse acórdão, o Tribunal presta um “desserviço ao cidadão” e está fazendo um “julgamento do julgamento”.
O professor da Universidade Mackenzie José Francisco Siqueira Neto afirmou que, mesmo que tenha havido abusos em alguns casos de reajuste, o poder público não pode demorar tanto tempo para se manifestar em relação a decisões já tomadas. Para ele, o Estado de Direito oferece a todos o acesso ao processo com a possibilidade de todos os recursos. “Mas a coisa julgada é a coisa pública”, afirmou. “Toda vez que se rompe com a regra do jogo, o Estado Democrático de Direito está sendo atingido”, completou.
Decisões administrativas
O auditor Pedro Ricardo Apolinário garantiu que, em nenhum momento, o TCU tomou decisões para desconstituir a “coisa julgada”. Segundo ele, ao determinar a supressão de vantagem de servidores públicos federais, o TCU está aplicando decisão de tribunais superiores.
Ele afirmou que as decisões da corte de contas são pautadas pela observância à constituição e contam do respaldo do Supremo Tribunal Federal (STF). “Já foram impetrados vários mandatos de segurança, e o STF afastou o argumento de que há ofensa à coisa julgada”, disse.
Para o auditor, o tribunal não reprime decisão judicial com o acórdão, mas sim ato administrativo que, sob o pretexto de interpretar a lei, extrapola seus limites. “O TCU vem determinando supressão de vantagem, porque a lei e o ato judicial são passíveis de interpretação. O TCU pode avaliar e constatar que a administração interpretou a decisão erroneamente”, defendeu.
Descompromisso do Estado
O deputado Maurício Rands (PT-PE), coordenador da mesa de debates na audiência pública, disse que a tentativa de rever o pagamento de rubricas judiciais aos servidores é um “descompromisso do Estado Brasileiro com a Constituição Federal”.
Segundo ele, para conseguir algum ganho na justiça, o servidor precisa enfrentar uma verdadeira via crucis e, quando finalmente consegue decisão judicial favorável, recomeça o esforço, dessa vez, para que a sentença seja executada. “O Estado reconhece com uma mão o direito do servidor e, com outra mão, ele tira”, afirmou.
O diretor executivo da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Pedro Armengol, argumentou que são recorrentes as tentativas de subtrair direitos dos servidores públicos. “Em vários casos, para avançar na tabela salarial, exige-se que o servidor abra mão de rubricas judiciais”.
Representantes do Sindicato dos Professores do Ensino Público Federal (Proifes), que sugeriram a realização do evento à deputada Fátima Bezera (PT-RN) e lotaram o Plenário 3, criticaram a decisão do TCU de mandar rever as decisões. A audiência pública foi realizada em parceria pelas comissões de Legislação Participativad+ e de Trabalho, Administração e Serviço Público.