A perspectiva de crescimento econômico de até 7%, num cenário de escassez crescente de mão de obra especializada, tem facilitado a conquista de aumentos reais de salários este ano. Categorias profissionais com data-base para renovação coletiva de trabalho no primeiro semestre estão conseguindo negociar acordos que garantem aumentos salariais de até 2,9% além da reposição integral das perdas com a inflação.
Na semana passada, os cerca de 300 mil trabalhadores da construção civil da capital paulista aprovaram proposta negociada com as construtoras que garante reajuste de 8,01% nos salários a partir de 1.º de maio, data-base da categoria. Descontada a inflação de 5,49% acumulada em 12 meses até abril, os operários da construção obtiveram ganho real de 2,39% no período.
“O ambiente macroeconômico é amplamente favorável à negociação de aumentos reais de salários e melhores condições de trabalho”, afirma o diretor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Clemente Ganz Lúcio.
Contudo, o superaquecimento do consumo fez o governo adotar medidas adicionais à política de elevação da taxa básica de juros iniciada na última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), que elevou a Selic em 0,75 ponto porcentual, para 9,5% ao ano. Para esfriar a demanda, de forma a evitar pressões inflacionárias, e tentar garantir o cumprimento da meta do superávit primário, o governo anunciou um corte de mais de R$ 10 bilhões do orçamento.
O governo tem motivos para estar preocupado. Em 12 meses até março, a massa de salários nas seis principais regiões metropolitanas do País cresceu 5,2% acima da inflação, segundo o IBGE. A massa de salários é o principal indicador da capacidade de consumo da população. Nesse período, ela recebeu a injeção de R$ 1,523 bilhão extras, patrocinada pelo aumento de 3,8% no número de pessoas ocupadas e de 1,5%no rendimento médio mensal dos trabalhadores. “Já começa a faltar mão de obra qualificada em alguns setores, e as empresas precisam pagar bem para contratar novos funcionários e tentar manter seu quadro de pessoal”, observa Ganz Lúcio.
Calçados. Com o mercado interno em alta e a concorrência dos importados em baixa, graças à tarifa antidumping (concorrência desleal) aplicada sobre calçados chineses, empresas calçadistas de Franca (SP) atropelaram as negociações salariais entre o sindicato patronal e dos trabalhadores para não correrem o risco de perder mão de obra treinada para concorrentes.
Com data-base em 1.º fevereiro, as negociações foram suspensas ainda em janeiro pelo representante da indústria, que questionava a representatividade do sindicato dos trabalhadores. Os sindicalistas negociaram então um acordo com o Sindicato das Micro e Pequenas Indústrias do Estado de São Paulo (Simpi) que estabelece reajuste salarial de 7,5%. Descontada a inflação, o índice corresponde a um aumento real de 2,9%. O reajuste não ficou restrito apenas às empresas com até 50 funcionários.
“Fechamos o mesmo acordo em negociações diretas com boa parte dos fabricantes da região, inclusive integrantes da diretoria do sindicato patronal”, conta o presidente do sindicato dos trabalhadores, Sebastião Ronaldo de Oliveira. Os acordos foram sacramentados pela Justiça do Trabalho, o que estendeu o beneficio a todos os 28 mil trabalhadores do setor em França.
Os salários dos 80 mil trabalhadores em processamento de dados do Estado de São Paulo foram reajustados em 6% nos salários, retroativos a 1.º de janeiro. O índice representa aumento real de 1,9% ante uma inflação de 4,1%. No entanto, a principal conquista da categoria foi a redução da jornada de trabalho de 44 para 40 horas semanais, sem redução dos salários, a partir de janeiro de 2011. A redução da jornada é uma bandeira das centrais sindicais há 17 anos e faz parte de proposta de emenda constitucional (PEC) que está parada no Congresso Nacional sem previsão de data para ser votada.