No ano de 1997, após a realização de eventos nacionais dos quais participou boa parte das entidades vinculadas à educação no Brasil, foi produzido um Plano Nacional de Educação, que ficou conhecido como o “PNE da Sociedade Brasileira”. O documento assim elaborado consubstanciou-se a seguir no Projeto de Lei nº 4.155/98, apoiado por mais de 70 parlamentares. Essa iniciativa forçou o então governo federal a desengavetar seu PNE e encaminhá-lo ao Congresso Nacional, onde tramitaria como anexo ao PNE da Sociedade Brasileira, tendo o executivo conseguido que fosse indicado um relator próximo de suas posições. Ao final do processo, foi promulgada a Lei 10.172/01 – que é o PNE em vigor. A pressão exercida pela sociedade foi capaz de incluir, no texto aprovado pelo Congresso, algumas medidas positivas. Entretanto, o então Presidente da Republica aplicou ao texto aprovado um conjunto de vetos, cujo resultado final foi tornar o documento aprovado genérico e ineficaz – muito mais uma inócua carta de intenções do que um estatuto legal capaz de impulsionar as mudanças requeridas.
A eleição presidencial de 2002 trouxe para o centro do debate, mais uma vez, temáticas sociais – dentre elas a educação. No programa de governo do candidato que seria eleito eram demarcadas linhas políticas distintas, em sua essência, das até então defendidas e praticadas pelos dirigentes anteriores. Neste início de 2010, passados sete anos de nova orientação, a análise das políticas de educação adotadas mostra uma reversão parcial da trajetória anterior, embora persistam imensos desafios ainda em aberto.
Em relação à Educação Infantil, os avanços alcançados têm sido tímidos, em especial no que se refere à faixa etária até 3 anos de idade. A aprovação da PEC 96A/03, que assegura o direito à Educação Básica gratuita dos 4 aos 17 anos, vem, por seu turno, aportar perspectivas promissoras ao atendimento de crianças na pré-escola, conquanto até o momento não tenha havido uma ampliação significativa de vagas para esse nível de ensino: em 2006 cerca de 1/3 das crianças não tinha acesso à pré-escola, problema esse agravado por fortes diferenciais regionais, entre a cidade e o campo, entre etnias e entre classes sociais. No Ensino Fundamental tem havido redução significativa da defasagem idade-série. Ainda assim, uma em cada quatro crianças não conclui o ciclo. Para os que têm entre 15 e 17 anos, abrem-se horizontes positivos, com a previsão de universalização do Ensino Médio. Em contrapartida, ainda hoje, ao fim dessa etapa, quase 50% dos adolescentes acabam excluídos da educação formal. A Educação Profissional tem recebido atenção especial, com a criação de expressivo número de Institutos Federais e de novas Escolas Técnicas. Entretanto, nos programas de Educação de Jovens e Adultos as matrículas passaram, entre 2002 e 2008, de 3,4 para 4,7 milhões, muito aquém do desejável. Finalmente, houve uma expansão importante das vagas oferecidas pelas IFES, com a criação de novas universidades e diversos campi nas já existentes. Cumprida a expectativa de se chegar a um milhão de matrículas federais em 2.012, ou 4% dos jovens na faixa etária 18/24 anos, estaremos muito melhor do que em 2002, quando esse número era 2,2%, mas longe das metas projetadas pelo próprio PNE vigente.
No que se refere à destinação de mais verbas para a educação, registre-se a aprovação do Piso Nacional do Magistério, da Lei 11.784, que promove a valorização dos docentes do Ensino Superior e do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico, do Fubdeb e da lei que prevê o fim da DRU. Esses aportes, embora expressivos, são insuficientes para enfrentar os desafios que o país terá que vencer se quiser desenvolvimento econômico com inclusão social. Não será possível, pois, levar adiante as transformações de que o Brasil precisa na educação sem discutir novas fontes de recursos – como os que provirão das riquezas do pré-sal.
O caminho para uma sociedade justa e igualitária passa pelo equacionamento e pela solução dos problemas educacionais brasileiros, única forma de dar acesso ao conjunto da população às informações e à capacidade de processá-las criticamente, sem o que não será sequer possível uma verdadeira e mais radical democratização do país. Para isso, é preciso definir num novo PNE metas e diretrizes específicas, bem como os investimentos requeridos para alcançá-lasd+ seu cumprimento deve ser um compromisso do Estado, a ser executado sob o olhar atento da sociedade, não podendo ficar o destino da educação à mercê de políticas ou programas de governo, muitas vezes sem continuidade histórica.
Defendemos, assim, que o novo PNE tenha como eixo central o fortalecimento da educação pública, de qualidade e gratuita, fixando as seguintes metas prioritárias.
– Até 2016: universalizar a Pré-escola, o Ensino Fundamental e o Ensino Médiod+
– Até 2020: erradicar o analfabetismod+ expandir com qualidade a Educação Infantil/Creche, alcançando 50% da população de até 3 anosd+ atender 12 milhões de pessoas em programas de Educação de Jovens e Adultosd+ triplicar as dimensões da Educação Profissional públicad+ viabilizar a inclusão no Ensino Superior público do equivalente a 20% da população de 18 a 24 anos, garantidos a excelência acadêmica e o incentivo à pesquisa. Além disso, propomos como diretrizes gerais:
– Promover, de forma integrada e em todos os níveis e modalidades educacionais, atenção específica às necessidades de estudantes portadores de deficiência e de segmentos da população que estejam defasados em relação aos padrões educacionais vigentesd+
– Reduzir as disparidades de acesso à educação, sejam elas regionais, entre a cidade e o campo, ou resultado de desigualdades de qualquer origemd+
– Oferecer, em todos os níveis, ensino noturno público e gratuito, regular ou supletivo, adotando opções programáticas e metodológicas apropriadas, bem como horários flexíveis, no sentido de superar restrições enfrentadas por alunos trabalhadoresd+
– Ampliar gradualmente o tempo de permanência nas escolas de educação básica, de forma a implantar, até 2020, a Escola de Tempo Integrald+
– Definir, em cada nível de ensino, parâmetros para o investimento anual por aluno que possam garantir condições materiais condizentes com elevado nível de qualidaded+ e
– Valorizar os profissionais da educação, propiciando-lhes formação inicial, capacitação continuada e condições de trabalho, salariais e de carreira compatíveis com a importância que a educação deve ter em nosso país.
O investimento necessário à consecução desses objetivos é de 6% do PIB em 2011, alcançando quase 9% em 2020.
Considera-se essencial, finalmente, a instituição de um Sistema Nacional de Educação, que, gerenciado de forma democrática e com a participação da sociedade, integre as diferentes esferas administrativas, os diversos níveis de ensino e os vários poderes da União, e possa garantir – como política estratégica de Estado – a execução das metas e diretrizes de um Plano Nacional de Educação que vise assegurar a todos os brasileiros a conquista da cidadania plena, e, de forma coletiva, dê ao país os meios de apropriação e produção do conhecimento, essenciais a seu soberano desenvolvimento científico, tecnológico e humano.
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O texto acima foi publicado pela Comissão de Educação da Câmara dos Deputados e sintetiza a publicação Educação Universal e de qualidade: um projeto para o Brasil. O trabalho foi apresentado no Conae e está disponível na seção “Documentos” da página da Apufsc (clique aqui), juntamente com o arquivo ppt da apresentação (clique aqui). Este trabalho será apresentado no II Encuentro de Sindicatos de Educación Superior que ocorrerá nos dias 15 e 16 de julho, em Buenos Aires