A maratona do estudante de administração Levino Neves de Lima Júnior, 23, começa às 6h, na cidade de São Paulo, quando acorda e se prepara para o primeiro transporte público do dia. Às 8h, chega a uma das lojas onde vende ração para cachorro. Quando o expediente termina, às 18h, segue para a faculdade. Após a aula, toma metrô e ônibus (para economizar, às vezes, dispensa o ônibus e vai a pé) na volta para casa, onde chega por volta da meia-noite.
Devido ao aumento das matrículas no ensino superior, que mais do que dobraram nos últimos dez anos, é cada vez mais comum encontrar estudantes como Levino nas salas de aula das universidades brasileiras.
Dados do IBGE, tabulados a pedido da Folha, revelam que a proporção de universitários que trabalham passou de 63%, em 1998, para 71% em 2008.
Dentro das universidades, o movimento se reflete na profusão de matrículas em cursos noturnos, que passaram de 56% a 62% do total entre 2000 e 2008, segundo censo do Inep (instituto de pesquisa ligado ao Ministério da Educação).
O fenômeno se deve principalmente à inclusão de alunos com menor renda nas faculdades nos últimos anos, explica Ryon Braga, da consultoria Hoper, especializada em ensino superior. “São pessoas que precisam do emprego para poder pagar a faculdade”, afirma.
Levino é um exemplo: ele será a primeira pessoa de sua família a ter diploma de nível superior. Por outro lado, como muitos dos novos universitários, ele tem menos tempo para estudar. Com o dia tomado por aulas e trabalho, faz as leituras da faculdade no ônibus, no trajeto entre uma loja e outra.
Amin Ziad Chacra, 27, consultor de vendas, só consegue pensar nas tarefas do curso depois de trabalhar o dia inteiro, estudar à noite, responder os e-mails da empresa no começo da madrugada e dar atenção à mulher e ao filho pequeno.
Emprego ajuda
Mas se o emprego tira tempo dos estudos, às vezes, acaba ajudando. “O trabalho facilita a participação nas aulas, porque a gente passa por uma coisa na rua e vê depois a mesma coisa na faculdade. Fica mais fácil assimilar”, afirma Amin.
Maria de Fátima Guerra de Souza, professora da Faculdade de Educação da UnB (Universidade de Brasília), prefere dar aulas no curso noturno justamente porque a maior parte dos estudantes trabalha como professores da educação básica. “Os alunos chegam mais cansados, mas a diferença é que as questões que eles trazem para aula são as que vivem diariamente. A gente não fica conversando sobre hipóteses”, afirma.
Para o estudante, outro ganho pode ser a vivência com os macetes para se relacionar no mundo do trabalho.
Além do maior interesse dos alunos, nos últimos anos tem havido um esforço crescente das empresas para atrair universitários. Dados do Ciee (Centro de Integração Empresa-Escola) relativos a 19 Estados mostram que, de 1998 a 2008, o número de estágios no ensino superior intermediados pela entidade quadruplicou.
“Para as empresas, o estágio é fundamental para identificar talentos e inserir profissionais que irão trazer coisas novas”, afirma Silvana Rocha, gerente técnica de estágios do Ciee. Para o aluno, acredita, serve também para comprovar a opção pelo curso que fizeram