A recusa na liberação de atendimento médico pelas operadoras de planos de saúde tem levado muitos usuários a procurar a Justiça para garantir seus direitos. O ingresso de uma ação reivindicando cobertura envolve diversos casos, mas a maior polêmica refere-se à interpretação da Lei 9.656/98, que abrange os considerados contratos novos, ou seja, aqueles fechados a partir de janeiro de 1999.
Para negar a cobertura aos usuários de convênios antigos, as operadoras alegam que os direitos e deveres previstos nessa lei são voltados exclusivamente para os contratos novos. Porém, cada vez mais a Justiça, em ações pacificadas inclusive pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça), com base no CDC (Código de Defesa do Consumidor), tem garantido o atendimento também aos usuários mais antigos, que chegam a ficar mais de 30 anos em um mesmo plano de saúde, com receio de ter de enfrentar novos prazos de carência com a troca de operadora.
Para apontar as ações que garantem atendimento a esses usuários e que servem como parâmetro para aqueles que enfrentam problemas similares com a saúde privada em todo país, o Cash consultou a ex-diretora da ANS (Agência Nacional de Saúde) e professora de direito do consumidor da PUC São Paulo Maria Stella Gregori. De acordo com a especialista, os contratos antigos, que não são regidos pela Lei 9.656, têm conseguido cobertura prevista apenas para os convênios novos.
“Existe uma maciça satisfação por parte do Poder Judiciário em garantir ao consumidor mais antigo, que paga o plano por muitos anos, os mesmos benefícios dos novos usuários”, garante. “Esses contratos anteriores a 1999 não previam cobertura para doenças graves como Aids, transplante de rim, córnea ou medula. Assim, esses usuários acabavam não tendo cobertura para esses casos, se precisassem. Não há uma unanimidade na Justiça, mas muitos consumidores têm conseguido ganho de causa em suas ações”, explica. Para casos considerados urgentes, a Justiça pode conceder a chamada “antecipação de tutela” – decisão liminar que garante o atendimento até o julgamento do mérito da ação.
Cobertura
Entre os principais casos de recusa de atendimento por parte da operadora está a necessidade de uso de peças em tratamentos voltados para correção de problemas no funcionamento ou fraturas. A operadora alega que tais peças são consideradas próteses, como braços ou pernas mecânicos.
Há muitos casos em que a operadora indica ao médico o uso de material inferior ao recomendado, como forma de baratear o tratamento. O STJ foi claro: o plano de saúde, obrigatoriamente, deve oferecer o tratamento mais moderno e adequado, mesmo se o contrato prever um método ultrapassado. Até mesmo se o procedimento ainda não existia quando o contrato foi assinado, o plano terá que garantir a cobertura.
Internação
Depois de enfrentar toda a burocracia para o atendimento, o usuário se depara com outro problema: a internação. Como forma de minimizar as despesas, alguns convênios médicos se recusam em cobrir as internações ou tentam limitá-las. Alguns usuários que pagam por quarto particular, por exemplo, acabando tendo de dividir o ambiente. Nos casos de quartos de UTI (Unidade de Tratamento Intensivo), a recusa é ainda mais comum. Para essa situação, o STJ também já sentenciou que não pode haver qualquer restrição no tratamento.
Conforme o Cash havia mostrado, o entendimento dos magistrados é que atendimento ao beneficiário de convênio médico não deve ser baseado exclusivamente em critérios econômicos. Portanto, o convênio médico deve oferecer o tratamento adequado, independentemente do valor. Do contrário, a orientação é que o usuário procure a Justiça para garantir seus direitos.
Idosos
O reajuste de mensalidade para maiores de 60 anos é um dos pontos mais críticos na guerra entre operadoras e usuários. Alguns aumentos chegam a 200% na passagem para a faixa etária, o que é condenado pelo Estatuto do Idoso.
A Justiça já cancelou diversos reajustes considerados abusivos para o público da terceira idade. O STJ (Superior Tribunal de Justiça) reconhece que as determinações do Estatuto do Idoso envolvem todos aqueles que completaram 60 anos após 3 de outubro de 2003 – data em que as regras entraram em vigor. Muitos dos casos de desrespeito são denunciados à Defensoria Pública, através do número 0800-2852279.
A especialista Maria Stella Gregori lembra que o papel da operadora do plano de saúde não é o de prestar serviço médico, mas sim, o de intermediação. Assim, o convênio deve respeitar o tratamento indicado pelo médico, sem qualquer limitação. Quem acabou tendo que pagar o tratamento como motivo de urgência, mesmo assim, pode entrar na Justiça para ser ressarcido. Há usuários que além de terem conseguido o dinheiro de volta, com juros e correção monetária, ainda receberam indenização por danos morais.
Como ingressar com a ação
Para entrar com a ação contra seu plano de saúde, o usuário deve procurar a Justiça Comum. Dependendo do valor da ação, há a possibilidade de entrar com o processo nos Juizados Especiais Cíveis, mais conhecidos como de Pequenas Causas, que, geralmente, são mais rápidos. No entanto, como se trata de uma questão de saúde, dependendo da urgência, a Justiça pode conceder uma liminar para atendimento imediato.
Aos procurar pela Justiça, é interessante que o reclamante leve tudo que possa comprovar sua reivindicação. Por exemplo, se a causa envolver a recusa de atendimento, é interessante portar as anotações do nome do funcionário, horário e local. Testemunhas também poderão ser ouvidas. Na verdade, quem deve provar que não deve é o acusado – no caso a operadora -, e não o consumidor. Mas o material pode contribuir positivamente para a decisão do juiz e agiliza ainda mais o procedimento.
Caso o valor da reivindicação seja de até 40 salários mínimos (R$ 18.600), a ação pode ser movida nos Juizados Especiais Cíveis. Acima desse valor, é preciso procurar a Justiça Comum. Até 20 salários mínimos, não é necessário constituir advogado. Já de 20 a 40 salários mínimos, é exigida a contratação do profissional de direito.