Mantendo a trajetória ascendente verificada desde os anos 1990, os gastos nominais com a folha de pessoal dos Três Poderes vão subir mais uma vez em 2010. O Orçamento enviado pelo Executivo ao Congresso Nacional prevê que as despesas com salários de servidores públicos alcançarão R$ 169,4 bilhões — 8,8% superior à estimativa para 2009 (R$ 155,6 bilhões). No total, os contracheques do funcionalismo devem bater em 5% do Produto Interno Bruto (PIB).
O impacto do crescimento da folha referenciado no PIB preocupa os analistas de mercado, mas não o governo. O ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, disse ontem que as contas públicas estão sob controle e atacou os críticos. “Tivemos de mexer nos salários porque a máquina foi sucateada, os salários foram arrochados. Só que, em vez de dizer “eu sou contra” aumentar salário, as pessoas ficam falando que o governo está montando uma bomba-relógio. Não estamos deixando bomba relógio alguma. Isso é um equívoco muito grande”, afirmou.
As despesas com pessoal atingiram 5,37% do PIB em 1995. Nos anos seguintes, a conta variou, mas sempre abaixo do patamar esperado para 2010. Só em 2001 e 2002, os desembolsos superaram esse teto, chegando a 5,03% e 5,08%, respectivamente. Entre 2003 e 2007, a rubrica com o funcionalismo estacionou na casa dos 4%, o que alimentou grandes tensões entre os sindicatos e o governo. No ano passado, os gastos com servidores alcançaram R$ 144,4 bilhões, trazendo a despesa com salários novamente para 5% do PIB.
Bernardo avaliou que o percentual é confortável e não vê riscos de descontrole fiscal a médio e longo prazos. “A tendência é isso depois, com a economia crescendo, acomodar um pouquinho abaixo de 5%”, completou. Segundo ele, ao contrário do que uma parte das estatísticas oficiais demonstram, a qualidade da despesa está melhorando a cada ano. “Vamos deixar a melhor condição possível. O resto é marola”, reforçou o ministro do Planejamento, advertindo que os ataques à política de recomposição salarial dos servidores têm como motivação a campanha presidencial de 2010.
Parcela garantida
Na segunda-feira passada, o Executivo enviou ao Congresso Nacional projetos de lei aperfeiçoando reestruturações de carreiras ou propondo revisões. Para isso, a União reservou R$ 701 milhões. Entre os setores beneficiados estão o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), os fiscais agropecuários, agentes penitenciários federais, empregados públicos do quadro de pessoal do Hospital das Forças Armadas e funcionários da tecnologia militar. Outras propostas criam cargos ou funções para uma série de órgãos do Executivo federal, entre eles Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), Ministério das Relações Exteriores e Ministério da Educação. O ministro do Planejamento afirmou que há dinheiro para cobrir essas propostas.
Bernardo também garantiu o pagamento da próxima parcela de reajuste para os servidores que foram alvos de reestruturações autorizadas em 2008. “O que estiver marcado para o próximo ano vamos cumprir”, resumiu. Os aumentos transformados em lei terão um custo total de R$ 6,5 bilhões em 2010 — R$ 4,4 bilhões para o pessoal civil e R$ 2,1 bilhões para os militares.
Presente de grego
O superpacote de reajustes salariais autorizado pelo governo federal em 2008 vem sendo pago aos servidores de forma escalonada. Civis e militares já receberam duas parcelas. Algumas categorias aguardam para 2010 e 2011 a complementação do aumento. Os partidos de oposição na Câmara e no Senado acusam o Palácio do Planalto de aumentar despesas fixas que terão de ser honradas pelo próximo presidente da República.
Todos de olho nas eleições
O governo não economizou nos recados. Ao detalhar o Orçamento para o próximo ano, o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, disparou contra a oposição, afagou o funcionalismo e, de quebra, ainda renovou para 2010 as esperanças de quem sonha com um emprego público. No ano das eleições para presidente da República, aumento de servidor e concursos são intocáveis.
Tudo o que o Palácio do Planalto não quer é comprar briga com bases eleitorais importantes, por isso antecipou-se para acalmar os sindicatos e anunciou logo que a parcela de aumento prevista para o próximo ano será paga. A corrida eleitoral já começou faz tempo. Bernardo e outros ministros sabem que se não forem explícitos na defesa de bandeiras tradicionalmente petistas, há riscos de confrontos desnecessários.
O embate entre tucanos e petistas está nas ruas e tem no Estado as diferenças mais visíveis. Com habilidade política, Paulo Bernardo chamou para a briga aqueles que, sob holofotes, atacam novas contratações e melhorias salariais. Mais do que o choque de ideias, o que o cidadão comum verá daqui para frente será o confronto, cada vez mais ácido, de ideologias entre os partidos que querem manter ou retomar o poder.
Teto pode ir a R$ 27.952
No limite do prazo legal para propor reajustes e criação de cargos na administração pública, o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Ministério Público da União (MPU) encaminharam na segunda-feira ao Congresso Nacional dois projetos de lei que aumentam os salários dos ministros da Suprema Corte e do procurador-geral da República em 14,09%. Se aprovadas, as propostas elevarão o teto do funcionalismo de R$ 24.500 para R$ 27.952, com efeito cascata imediato sobre os degraus inferiores da burocracia.
Assim como foi feito no Executivo, as mudanças remuneratórias pleiteadas por STF e MPU seriam partilhadas neste e no próximo ano da seguinte forma: 5% a partir de 1º de setembro, outros 4,60% a partir de 1º de novembro e 3,88% a partir de 1º de fevereiro de 2010. Na exposição de motivos anexada ao projeto que beneficia a cúpula da magistratura, Gilmar Mendes, presidente do STF, assinalou que os cálculos levaram em consideração a inflação acumulada entre 2006 e 2008. “O montante da despesa decorrente do projeto conforma-se plenamente dentro da margem de crescimento permitida aos gastos com pessoal e encargos sociais do Poder Judiciário da União para o corrente exercício”, justificou Mendes.
Parte dos recursos necessários está no Orçamento 2010. Outra, de acordo com o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, não. O impacto financeiro estimado para a primeira parcela — que era o plano original reivindicado pelo Judiciário e pelo MPU até o ano passado — é de R$ 54 milhões em 2009. O custo anualizado, conforme técnicos do governo, é de R$ 204 milhões. “Vamos ter de esperar. Se houver aumento maior do que aquele (acordado em 2008) teremos de fazer alterações no Orçamento”, disse Bernardo, que descartou ainda qualquer efeito cascata sobre outras carreiras. “Só vale para a Justiça federal”, resumiu o ministro. (LP)
Tíquete sem correção
O Orçamento 2010 não indica quais recursos poderão ser utilizados para reajustar o vale-alimentação dos servidores do Executivo federal. Demanda represada desde maio, o aumento do tíquete é aguardado com ansiedade por 539 mil funcionários da administração direta, autárquica e fundacional. Embora o Ministério do Planejamento já tenha em mãos um estudo que aponta para a necessidade da revisão dos valores pagos a esses servidores, a decisão política ainda depende do aval do Palácio do Planalto.
Congelado desde 2004, o vale do Executivo é o mais baixo entre os Três Poderes: varia de R$ 126 a R$ 161,99 por mês. Técnicos do governo que defendem a atualização do benefício propõem uma fórmula que mescle a inflação acumulada no período e as diferenças regionais no custo da alimentação fora de casa. O percentual de reajuste e os impactos financeiros com o aumento não estão fechados.
O relator-geral do Orçamento, deputado Geraldo Magela (PT-DF), defende a revisão do tíquete como forma de equiparar os valores pagos nos Três Poderes. O parlamentar adverte, no entanto, que o recurso não está previsto. Nas discussões com os colegas na Comissão Mista, Magela está disposto a discutir o assunto. “Se não for um montante excepcional, é possível trabalhar alguma receita”, disse. No Legislativo e no Judiciário o vale-alimentação é de cerca de R$ 600.
A Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Federal defende a isonomia dos benefícios entre Legislativo, Executivo e Judiciário. Segundo a entidade, a disposição é manter o diálogo com o governo e tentar buscar com os parlamentares apoio a fim de encontrar os recursos necessários para reajustar a cesta de benefícios. Josemilton Costa, presidente da Condsef, afirmou que o fato de o Planejamento ter garantido a próxima parcela de aumento para as carreiras do Executivo deve ser comemorado, mas nem por isso os servidores baixarão a guarda. “Estamos convocando uma plenária para discutir a agenda de 2010”, explicou.