Na hora de escolher uma escola para os filhos, a americana Linda Fittante, moradora de Washington, viu-se diante de três alternativas: matriculá-los numa das escolas públicas, que estão entre as piores dos Estados Unidos, mudar-se para o subúrbio em busca de melhores ofertas ou pagar caro por uma escola particular.
Nenhuma das anteriores.
Ela descobriu a Apple Tree e conseguiu vagas: “Tive muita sorte”, contou. “A escola é ótima e tem diversidade. Lá tem filho de gente abastada e também de taxista.”
A Apple Tree é uma das 4.364 escolas charter que funcionam nos EUA. São escolas públicas fundadas por associações, grupos comunitários e empresas que recebem recursos do governo para realizar suas atividades, mas são administradas com mais liberdade do que as escolas públicas tradicionais.
Graças à maior autonomia de gestão, não precisam seguir à risca normas aplicadas para o sistema público de ensino.
Elas podem ampliar o tempo diário de permanência dos alunos na escola, oferecer currículos diferentes do padrão adotado pelo governo e pagar salários acima da média para os professores.
Essas escolas inovadoras têm obtido resultados animadores em vários lugares.
A Fundação Bill e Melinda Gates, que há nove anos investe em projetos na área de educação, decidiu concentrar recursos na promoção da ideia após alcançar resultados frustrantes tentando melhorar escolas públicas tradicionais.
O presidente Barack Obama é outro entusiasta. Seu secretário de Educação, Arne Duncan, pôs as escolas charter no topo da lista de prioridades.
“É mais fácil começar uma escola nova a partir do zero do que mudar a cultura de escolas tradicionais que funcionam há anos do mesmo jeito”, diz Ariana Quinones, diretora da Friends of Choice in Urban School, grupo que promove a ideia.
“As escolas charter não vêm para substituir a rede de ensino tradicional, mas para oferecer opções para demandas mais específicas da população.”
Foi o que salvou o sistema de ensino de Nova Orleans, a cidade devastada pelo pelo furacão Katrina em 2005.
Ele precisou ser reconstruído, das paredes das escolas à administração da rede pública. Escolas charter organizadas por grupos comunitários tiveram papel decisivo nesse processo e têm obtido resultados animadores com crianças nos bairros mais pobres.
Há escolas desse tipo em 40 dos 50 Estados.
O volume de recursos que recebem do governo varia de acordo com as leis de cada Estado. Em geral, elas também podem captar dinheiro com doações privadas e empréstimos.
Uma condição para receber ajuda do governo é que o processo de admissão seja aberto e transparente. Se a demanda for maior que o número de vagas disponível, o sorteio é obrigatório.
Qualquer pessoa pode abrir uma charter no país.
A produtora Gloria Boriand teve a ideia de fundar uma escola que oferece aulas de mandarim, a Washington Yu Ying, após desistir de procurar escolas de boa qualidade na vizinhança. “
O mandarim é a língua do futuro, mas nenhuma outra escola oferece isso.” Sua filha está na 1ª série e já se arrisca na língua chinesa.
Diversas propostas de reforma das escolas públicas têm esbarrado em resistências dos professores e seus sindicatos, que se opõem a mudanças nos currículos e no regime de trabalho.
As escolas charter conseguem saltar esse obstáculo.
Em Nova York, uma delas promete pôr uma das teorias mais quentes à prova: vai oferecer aos professores, além de salário duas vezes e meia acima da média, um bônus calculado conforme o desempenho dos alunos.
O sistema oferece outras vantagens.
“Os professores aqui têm retaguarda para fazer um bom trabalho, ao contrário do que costuma acontecer nas escolas tradicionais”, diz Anne Zummo, diretora da Apple Tree.
Vários estudos sugerem que as escolas charter vêm sendo particularmente bem-sucedidas com estudantes de renda mais baixa, que têm dificuldade para progredir nas tradicionais.
O economista Roland Fryer, da Universidade Harvard, examinou o desempenho de uma charter no Harlem, tradicional reduto dos negros em Nova York, e concluiu que os alunos se saíram quase tão bem quanto os estudantes brancos de regiões mais privilegiadas.
“O que essa escola tem feito é equivalente a descobrir a cura de câncer”, disse ele ao “New York Times”.
Mas nem todas as experiências têm dado certo. Uma charter criada em Washington para atender mães adolescentes oferecendo horários mais flexíveis e outros benefícios fechou as portas recentemente.
A ideia era ótima, mas as alunas não conseguiram conciliar sua mudança de vida com as exigências da escola. Em geral, uma charter tem no máximo cinco anos para mostrar resultados e continuar recebendo o dinheiro do governo.
Já os críticos à proposta argumentam que a autonomia conferida às escolas charter torna mais difícil a fiscalização do uso do dinheiro público.
Mas os resultados obtidos até agora são considerados promissores pelo governo, que anunciou recentemente um pacote de US$ 100 bilhões em investimentos para modernizar o sistema educacional, incluindo recursos para as escolas charter.
“O movimento das charter é uma mudança profunda na educação americana”, disse recentemente o secretário de Educação de Obama.
“Ele traz novas opções para comunidades mal atendidas e introduz competição e inovação no sistema educacional.”