Caça aos servidores com duplo emprego

Em uma iniciativa inédita, União e estados vão compartilhar as bases de dados de servidores civis federais e estaduais ativos e inativos. Com o cruzamento das informações, será possível, por exemplo, identificar casos de acúmulo indevido de cargos ou pagamentos, além de aposentadorias irregulares. A adesão não é obrigatória, mas o Ministério do Planejamento e o Conselho Nacional de Secretários de Administração (Consad), que assinam um convênio de cooperação hoje à tarde, esperam que todas as unidades da Federação integrem a nova rede.

O funcionalismo estadual emprega atualmente cerca de 3 milhões de pessoas, enquanto que no Sistema de Administração de Pessoal Civil (Siape) estão outros 1,3 milhão de funcionários do Executivo federal. O objetivo é estabelecer uma conexão entre as duas plataformas, proporcionando a checagem de quase tudo: vínculo, jornada de trabalho, lotação, CPF, nome, data de nascimento e filiação. O Ministério da Previdência Social também decidiu cooperar e emprestará informações complementares para refinar ainda mais a pesquisa. Responsável por administrar o Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS), a Previdência repassará os registros de trabalhadores empregados e contribuintes individuais, empregadores, o tipo de vínculo e as remunerações.

Caberá à Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência Social (DataPrev) gerenciar o superbanco de dados e estabelecer as bases técnicas. Os estados participantes terão de assinar termos de adesão e repassar os formulários à Secretaria de Recursos Humanos (SRH) — ligada o Ministério do Planejamento — até 30 de setembro. Entre reenvios e confirmações de informações na Dataprev e nos órgãos estaduais, a previsão é que o sistema apresente resultados em escala a partir da segunda metade de 2010. A proposta de compartilhamento de informações teve como inspiração a experiência bem-sucedida ocorrida no Rio de Janeiro(1) .

Desvios
Marcelo Viana, secretário de gestão do Ministério do Planejamento, explica que a abertura dos dados permitirá aos gestores planejar melhor as políticas de recursos humanos. “Com todos esses cruzamentos, vamos fazer uma depuração da folha de pessoal, tratando de corrigir erros ou irregularidades”, explica. “É como se todos os participantes do programa franqueassem os acessos uns dos outros”, completa Viana. Quando as irregularidades ou os desvios são descobertos, o servidor que acumula dois cargos pode perder uma ou as duas funções e ser até mesmo indiciado criminalmente.

A Constituição Federal proíbe que o servidor acumule cargos públicos, com exceção de professores, profissionais da área de saúde e magistrados. Nos últimos dois anos, como forma de dar mais transparência e racionalidade aos gastos, alguns estados do país iniciaram por conta própria o cruzamento de informações. O Distrito Federal foi um deles. De acordo com o secretário de Planejamento do DF, Ricardo Penna, a disposição do governo local é aderir o quanto antes ao programa encabeçado pelo Consad e intensificar as ações em andamento. “Já fazemos informalmente esse trabalho no DF. É uma iniciativa moderna e que está em linha com os novos padrões da administração pública”, resume.

Paulo César Medeiros, presidente do Consad, diz que a troca de informações entre os estados e a União e entre os próprios estados é um avanço sem precedentes. Segundo ele, será possível economizar recursos e ter melhores condições de gerenciamento de pessoas. “Trabalhar em conjunto é a solução. Vamos ter dados muito mais precisos e claros da administração estadual e federal”, completa. Conforme Medeiros, de início, entre oito e 10 estados — além do DF — deverão aderir ao projeto.

Projeto-piloto
Em fevereiro de 2008, o secretário de Planejamento e Gestão do Estado do Rio de Janeiro, Sérgio Ruy Barbosa, fechou com o Ministério do Planejamento uma parceria que estabeleceu padrões para o cruzamento de dados de servidores estaduais e federais. As folhas de pessoal de órgãos do próprio estado detectaram 439 servidores em situação irregular. Todos tiveram de optar por um vínculo apenas — o que resultou em uma economia de R$ 4,3 milhões anuais. Ao confrontar dados da folha estadual geral com a da União, descobriu-se 2.578 servidores suspeitos de acumulação ilícita.