O governo pode fazer novos cortes de despesas após o mau desempenho da arrecadação de contribuições e impostos em maio, que caiu 5,6%, em termos reais (descontada a inflação), na comparação com igual mês do ano passado. As receitas ficaram R$ 3 bilhões abaixo do projetado pelo Ministério do Planejamento e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva discutirá com a equipe econômica, no início da próxima semana, medidas para tapar o buraco nas contas. Em 2009, a arrecadação está R$ 63 bilhões abaixo do previsto no orçamento.
O ministro Paulo Bernardo não quis falar sobre as medidas possíveis, mas deixou claro que “tudo está em análise”, até mesmo a confirmação do reajuste salarial de servidores. “Se temos menos receitas, temos que adequar as despesas. Não há como escapar disso”, disse Bernardo, atribuindo a queda na arrecadação não apenas à contração da atividade econômica, mas às desonerações feitas pelo governo, que já estão chegando ao limite do possível, segundo ele.
Bernardo descartou, para recompor as receitas, o uso da poupança acumulada no Fundo Soberano. Ele afirmou também que prefere não contar com maior recolhimento de tributos nos próximos meses, mesmo confiante na recuperação da economia. “Já trabalhamos com esse cenário e não funcionou”, confessou Bernardo. As medidas – incluindo os possíveis cortes – devem sair até o fim da semana que vem. “Temos que decidir logo”, advertiu.
Para o ministro, o ponto positivo é que o Brasil está retomando o crescimento. Os dados recentes sobre a atividade industrial e do comércio indicam, conforme sustenta Bernardo, que o segundo trimestre terá expansão sobre o primeiro, tirando o país da recessão técnica em que se encontra, embora ainda fique provavelmente com queda em relação ao mesmo período de 2008.
O ministro criticou a “precipitação” de empresários que demitiram “muito rapidamente” e disse que o Brasil sairá da crise mundial mais forte, “se não em termos absolutos, na comparação com outros países”. As medidas tomadas pelo governo para sustentar o consumo das famílias, como o aumento real do salário mínimo e o Bolsa Família, foram essenciais para evitar um tombo ainda maior do PIB, disse Bernardo, que atacou os defensores do Estado mínimo. “Passamos anos ouvindo falar mal dessas políticas. Diziam que era dar o peixe, e não ensinar a pescar. Agora sentimos os resultados econômicos. Os feirões de imóveis da Caixa, por exemplo, vendem como pipoca em porta de cinema.”
Para o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, os analistas econômicos “não querem admitir”, mas há um descolamento em curso entre países ricos e emergentes. Ele atribuiu à China, país para o qual prevê crescimento de pelo menos 7% neste ano e de até 8,5% em 2010, a recuperação da demanda por commodities e alimentos em geral, o que beneficia a América Latina. Os preços já retornaram ao nível de 2006, destacou, e o risco-país dos emergentes está em nível mais baixo do que o índice dos países ricos.
Por isso, Coutinho aposta em uma expansão do PIB de 4% no ano que vem. Na virada do ano, o Brasil já estará crescendo na velocidade de 3% a 4%, segundo ele. “Nos próximos três anos, a periferia puxará o centro, ao contrário da tendência histórica.”
Coutinho ressaltou que o Brasil tem uma política econômica “sólida”, sistema bancário “extremamente saudável” e contas públicas “arrumadas”. E apresentou duas supostas evidências de retomada do crescimento: as consultas para financiamentos do BNDES voltaram a aumentar em maio e os desembolsos do banco de desenvolvimento devem chegar a R$ 100 bilhões neste ano. “São indícios de que decisões de investimentos que haviam sido adiadas voltaram a ser consideradas”, disse.
Durante a cerimônia de entrega de um prêmio para teses e monografias sobre empresas estatais, Coutinho e Bernardo enfatizaram o papel dos bancos públicos na oferta de crédito recente e no combate à recessão. O presidente do BNDES observou que, no período de setembro de 2008 – mês da quebra do Lehman Brothers – a abril de 2009, a concessão de crédito subiu 19,5% nos bancos públicos e apenas 2,5% nas instituições privadas.
Agora, segundo Coutinho, “o crédito para empresas “investment grade” está voltando e as taxas de risco estão caindo”. “É claro que ainda vai ficar escasso durante um bom tempo, mas voltou a ocorrer.” Ele manifestou também otimismo quanto à recuperação do mercado de capitais. “Podemos até discutir se as bolsas estão excitadas demais, mas é um indício importante de que o humor já mudou”, assinalou o presidente do BNDES.