Numa atitude desesperada, os funcionários públicos endividados estão recorrendo à Justiça para impedir que seus salários sejam integralmente retidos pelos bancos para pagamentos de empréstimos. A novidade é que eles estão conseguindo decisões favoráveis. O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDF) decidiu limitar em 30% da renda o desconto que o Banco de Brasília (BRB) poderá fazer do salário de três servidores. A decisão, para preocupação dos bancos, pode abrir precedente para novos questionamentos judiciais.
Uma das beneficiadas foi a servidora pública aposentada Maria de Fátima Lima. Há vários anos ela utiliza várias modalidades de créditos para conseguir pagar as despesas de casa. Mesmo com um comprometimento da renda acima dos 30%, percentual recomendado pelos órgãos de defesa do consumidor, Maria de Fátima não tinha dificuldades para pegar dinheiro emprestado. A dívida, no entanto, virou uma bola de neve. Isso porque, toda a aposentadoria que recebe era automaticamente retida, no caso pelo Banco de Brasília (BRB), para abatimento do débito.
“Minha dívida era impagável. Não estava conseguindo sobreviver. Não tinha dinheiro nem para alimentação. Por isso, decidi entrar com uma ação na Justiça”, afirmou a aposentada, de 52 anos e moradora do Gama. Maria de Fátima estava há cinco meses sem receber o salário, pois o crédito era integralmente retido para abatimento de saldo devedor com o BRB. O alívio veio com a sentença da 6ª Vara da Fazenda Pública do DF, que limitou em 30% o desconto na renda da aposentada.
Descontrole – O presidente do Instituto Brasileiro de Estudo e Defesa das Relações de Consumo (Ibedec), Geraldo Tardin, informou que muitas pessoas estão pegando empréstimo novo para cobrir o antigo e acabam entrando num caminho sem saída, acumulando juros e multas de uma dívida sobre outra. Na avaliação dele, as instituições financeiras têm parcela de culpa, pois oferecem crédito sem verificar a capacidade de pagamento do cliente. “Os bancos são os maiores culpados do superendividamento. Se concede mais crédito do que o consumidor tem capacidade de pagar, estão agindo de má-fé e a consequência será a limitação do Judiciário das parcelas, mediante alongamento da dívida em quantas parcelas forem necessárias”, ressaltou. Para Tardin, a retenção de salários, acima da margem utilizada no crédito consignado de 30%, pode ser considerada abusiva.
Até setembro do ano passado, quando explodiu a crise internacional com a quebra do banco norte-americano Lehman Brothers, a concessão de crédito no país registrava considerável crescimento. A facilidade de acesso, associada à queda das taxas de juros, fez com que muitos brasileiros buscassem crédito para realizar os sonhos de consumo. A concessão, muitas vezes, foi superior à possibilidade de pagamento e agora esses clientes sofrem para pagar suas dívidas. Mas o endividamento desenfreado não é culpa apenas do tomador. Também cabe aos bancos fazer uma avaliação do empréstimo para evitar que esse tipo de situação provoque uma onda de calotes.