A interdição do Laboratório de Anatomia do Departamento de Ciências Morfológicas do CCB na semana passada é o desfecho de um problema que se arrasta há meses sem que a administração central da UFSC demonstre vontade política de resolver a situação.
A medida afeta o ensino de mais de 2 mil alunos de cursos como Psicologia, Educação Física, Biologia, Medicina, Odontologia, Farmácia e Enfermagem, que ficarão sem aulas práticas, fundamentais para a aprendizagem da Anatomia, por todo o atual semestre.
Subchefe do Departamento de Ciências Morfológicas e professor titular de Anatomia, Geraldo Morgado Fagundes ressalta que há mais de 18 meses o departamento vem tentando sensibilizar a Reitoria para resolver os graves problemas do laboratório. O apoio, no entanto, não tem saído do discurso.
O professor destaca que a contaminação por formol, utilizado para a conservação dos cadáveres, está cinco vezes acima do permitido. O laboratório não conta com mais nenhum servidor técnico-administrativo à disposição. Um deles faleceu por problemas decorrentes das péssimas condições de trabalho e outros dois estão afastados por doenças relacionadas à exposição aos elementos tóxicos utilizados no setor. Um destes descobriu recentemente que está com câncer de garganta, relacionado diretamente à contaminação por formol.
No 1º semestre de 2008, a Vigilância Sanitária já havia emitido laudo elencando os diversos problemas do laboratório. Além dos já conhecidos pelos professores, a fiscalização apontou a contaminação por microorganismos, problemas de higiene e falta de material de proteção para os usuários das instalações.
A Vigilância Sanitária determinou um prazo para a Reitoria sanar os problemas. A administração central da UFSC declarou que estava disposta a resolvê-los, mas se limitou a liberar a visita a outras universidades para que os professores do Departamento verificassem a infra-estrutura de outras instalações.
O prazo foi descumprido e dessa vez a Vigilância Sanitária não foi tolerante. Interditou o laboratório e apontou ainda as inúmeras irregularidades nas condições de trabalho oferecidas para docentes e técnico-administrativos. Destacou ainda que, além da reforma ou construção de novas instalações, é preciso realizar o treinamento do pessoal e oferecer a eles todo o equipamento necessário para minimizar os riscos à saúde.
Novamente a Reitoria, através do pró-reitor de Infra-Estrutura, João Batista Frutuoso, ressaltou sua disposição em resolver o problema, mas, segundo o professor Geraldo Morgado Fagundes, não trata a questão como emergencial. A administração da UFSC se limita a informar que vai encaminhar a licitação para a reforma do laboratório, o que pode pôr em risco também as aulas do próximo semestre, afetando diretamente a qualidade de ensino oferecida a milhares de aluno.
O subchefe estranha ainda a posição da maioria dos coordenadores dos cursos afetados pela interdição do laboratório. Em reunião com a pró-reitora de Ensino de Graduação, Yara Maria Rauh Müller, ocorrida na última quinta-feira, dia 14, para discutir alternativas para o problema, muitos deles minimizaram os efeitos da falta de aulas práticas para a formação dos alunos de seus cursos.
Morgado ressalta que o Departamento conta com o apoio dos alunos, que, inclusive, foram impedidos pela pró-reitora de acompanhar a reunião de quinta-feira, e está preocupado com a qualidade de ensino. Os professores vão buscar alternativas para as aulas, usando imagens e outros artifícios, mas destaca que o prejuízo é grande, porque a disciplina é 90% prática.
O professor está reticente quanto a uma solução rápida como a gravidade do caso exige. “Não basta só reformar o prédio, é preciso contratar servidores e treiná-los para a utilização dos novos equipamentos”, adverte. Este treinamento, destaca ele, terá que ser feito em outra universidade, já que o material disponível é velho e defasado. As peças de articulação têm 30 anos de uso e as de manuseio estão degradadas pelo uso excessivo. No momento, não há logística para novas técnicas.
Durante a reunião com a pró-reitora, a alternativa oferecida foi a utilização do laboratório morfofuncional de Medicina, situado no prédio novo do CCB. A instalação, no entanto, não conta com estrutura suficiente para ser um bom paliativo. Só dispõe de 15 microscópios e os manequins para as aulas de anatomia teriam que ser comprados.
O professor Geraldo Morgado assinala, porém, que como demonstração do interesse em minimizar os prejuízos aos alunos, o departamento de Ciências Morfológicas vai fazer um levantamento completo de todas as necessidades para resolver paliativamente a situação usando o laboratório morfofuncional.
O docente destaca ainda que uma solução definitiva só virá com a urgência necessária se houver pressão social e política sobre a Reitoria. “Há vários anos estamos alertando sobre a ameaça do telhado do laboratório cair e até agora nada foi feito”. Para o professor Morgado, nem a Reitoria nem a direção do Centro de Ciências Biológicas tratam o departamento como prioridade porque ele se dedica fundamentalmente ao ensino de graduação. “Temos umas das maiores cargas de ensino de toda a universidade, com 50 alunos por professor e 14 horas/aula por semana. Mesmo assim, não recebemos novos professores e servidores. Infelizmente a situação chegou ao limite”, lamenta.
A gravidade da situação exige que a Reitoria saia do discurso e encaminhe ações práticas. Estas ações não podem se limitar a encontrar paliativos que, de temporários, podem passar a definitivos. A solução definitiva para os problemas do laboratório de anatomia precisa ser encaminhada com urgência, evitando que os alunos sejam prejudicados por muito mais tempo.