Ao editar a Medida Provisória 431, em 14 de maio de 2008, o governo Lula dá por concluído o que denominou de um “inovador processo de negociação salarial” com 17 categorias de servidores públicos federais, dentre elas a dos professores das instituições federais de ensino.
Apoiado em um forte aparato de mídia, confunde os servidores federais e divulga para a população que concedeu significativos aumentos salariais para esses trabalhadores, tentando difundir a imagem de um governo capaz de inaugurar um sistema de negociação salarial, no qual a luta dos trabalhadores torna-se dispensável e a conciliação “por cima” apresenta-se viabilizada. No caso dos docentes, particularmente, os problemas advindos dessa estratégia governamental já haviam sido denunciados pelo Andes-SN (ver edições especiais de abril e maio do InformAndes sobre a campanha salarial).
Para compreender tal “inovador processo de negociação salarial” e as questões que se apresentam para a luta imediata em defesa da categoria, é preciso que se esclareça a lógica que orientou tal processo.
Primeiro: quebrar a política unificada dos servidores em relação à campanha salarial. Para isso, o governo contou com o auxílio do neopeleguismo, que se instalou em alguns sindicatos das categorias, dificultando a ação da Coordenação Nacional das Entidades de Servidores Federais – CNESF e impondo negociações isoladas por setor. Nessas, ficou evidenciado o engodo da “negociação”, em que o governo, ao final, impôs suas propostas com o aval de seus aliados.
Segundo: exigir assinaturas de acordos dentro de prazos que inviabilizavam a discussão com as bases das categorias. Tais acordos são, na realidade, pactos que amarram as relações dos servidores com o governo, por prazos correspondentes aos períodos de uma gestão governamental, impedindo ou dificultando atualizações decorrentes de variações conjunturais.
Terceiro: conceder algumas respostas à demanda por reajustes salariais, mas condicionando-as firmemente a valores preestabelecidos, muito aquém das justas demandas dos servidores, criando uma política que foge ao reajuste linear para as categorias e intercategorias, quebrando com isso a isonomia e fragilizando ou impedindo uma reação unitária dos trabalhadores.
Quarto: criar novas carreiras, a pretexto de atender à demanda de reestruturações, sem dar tempo às necessárias análises da categoria, impondo, além disso, opções individuais de adesão. Ou seja, desloca-se a discussão sobre a conveniência de criá-las – uma questão coletiva para além de interesses corporativos -, para o espaço da conveniência pessoal, mesmo assim limitada, porque aos servidores que por ela não optarem não resta senão a alternativa de permanecerem numa carreira em extinção, com todos os prejuízos e riscos que isso representa, tais como, congelamento salarial e danos quando do ato da aposentadoria.
Quinto: quebrar a dignidade da categoria docente por meio de uma política de desvalorização salarial. Nesse sentido, basta lembrar que, ao tempo que tais ataques não se faziam presentes na intensidade dos de hoje, o salário de um professor titular, doutor, em regime de Dedicação Exclusiva era equivalente ao salário de um Ministro do Supremo Tribunal Federal. Hoje esse professor tem remuneração inferior a um terço da remuneração desse ministro.
PONTOS NEGATIVOS DA MP 431 – O Setor dos docentes das Instituições Federais de Ensino do Andes-SN, reunido no Rio de Janeiro, dia 15/5, antecedendo o I Seminário dos Servidores Públicos Federais da Conlutas, em uma análise preliminar destacou que a MP 431/08:
1. Embute, sob o mote de reajuste salarial, uma reestruturação na carreira dos docentes de nível superior e cria nova carreira para os docentes do ensino básico. Ao contrário do que defende o Movimento Docente (MD) – carreira única, institui três carreiras.
2. Escalona o reajuste salarial até 2010, a fim de escamotear que ele não recupera a defasagem salarial, decorrente de perdas acumuladas, mantendo-se muito aquém do reivindicado pelo MD. Além disso, não estabelece cláusula que assegure correção inflacionária.
3. Mantém a política de gratificações ao eliminar a GED e instituir a Gratificação Temporária para o Magistério Superior (GTMS) a partir de 14/5/08, a qual será transformada em Gratificação Específica do Magistério Superior (GEMAS) a partir de 1º/2/09.
4. Retira o percentual de titulação do vencimento básico, que será transformado em uma nova gratificação, a Remuneração por Titulação (RT), o que reforça a política de gratificações e impõe um brutal retrocesso na carreira docente.
5. Agrava a situação dos docentes do ensino básico com a exigência da assinatura de um termo de opção individual pela nova carreira.
6. Mantém a política de Vencimentos Básicos (VB) rebaixados, contradizendo a propalada disposição do governo de fortalecê-los. Exemplificando, durante todo o ano de 2008, o piso do VB dos professores continuará sendo de R$ 147,00.
7. Desrespeita o princípio da isonomia ao estabelecer valores para titulação sem critérios objetivos por meio da Gratificação Remuneração por Titulação – RT. Atualmente, por exemplo, o título de doutor representa um vencimento básico, que é 75% superior ao de graduação em todos os níveis das tabelas salariais. A partir de 1º de fevereiro de 2009, a titulação deixa de compor o vencimento, tornando-se a gratificação RT, que, para o Adjunto 1, em regime de Dedicação Exclusiva, equivalerá a 157,53% do VB, para o Adjunto 4, 141,43% e, para o Associado 1, 191,59%.
Com a edição da MP 431/08 o governo afirma encerrar qualquer negociação até 2010.
Em síntese, o governo faz inicialmente um discurso positivo em relação a alguns pleitos dos servidores, mas, nos meandros do que é ajustado, impõe condições que negam ou vão diametralmente contra esse discurso. Exemplo disso é o discurso de valorização do VB, imediatamente contraditado pela política de fortalecimento das gratificações. Outro exemplo é o atendimento à demanda pela extinção da GAE, ao impor como contrapartida a desvinculação dos incentivos de titulação do VB. Em decorrência, a base em que incidem os anuênios e ganhos pessoais é proporcionalmente reduzida. Ou seja, adota a política de dar com uma mão e retirar com a outra.
Nesse quadro, fica evidente que a tarefa colocada para o Movimento Docente se mantém: a reconquista da dignidade profissional dos docentes e do seu projeto de carreira. E isso, só será alcançado, com mobilização e disposição para assumir a luta.
Cabe à categoria, às assembléias de base e às instâncias democráticas de deliberação do Andes-SN definir quais estratégias desenvolver, respeitadas as condições objetivas existentes para implementá-las.
ENCAMINHAMENTOS – Em relação à discussão sobre indicativo de greve que o Setor das Ifes solicitou às seções sindicais, a conclusão foi a de que ele não encontrou a necessária mobilização da categoria. O Setor afirma a necessidade de acumular forças para dar continuidade à luta e não aceitar ausência de campanha salarial até 2010, como pretende impor o governo e continuar solicitando abertura de negociação com o governo. Nesse sentido aprova os encaminhamentos a seguir:
– Solicitar análises da MP 431/08 pelo GT Verbas e pelo GT Carreira comparativamente à pauta de reivindicações do Sindicato.
– Divulgar e esclarecer as conseqüências negativas da MP 431/08, comparativamente à proposta salarial do Andes-SN, reiterando a luta pela abertura de negociações.
– Aprimorar a comunicação com a base nos desdobramentos dos impactos da MP 431/08 para a vida dos docentes e das Ifes.
– Explorar as diferenças salariais das tabelas de algumas categorias do serviço público federal.
– Retomar a referência do salário-mínimo de Dieese na elaboração de nossa malha salarial.