Um dia após a publicação da Medida Provisória nº 431, de 14 de maio de 2008, o setor das Ifes do Andes-SN reuniu-se e produziu a nota intitulada “MP 431/08: entre o engodo do aumento salarial e a reestruturação compulsória da carreira dos docentes”, que se encontra disponível na página eletrônica do sindicato e no relatório da reunião divulgado pela Circular 137/08, de 19 de maio de 2008. A partir das contribuições da referida reunião, de consultas feitas à Assessoria Jurídica Nacional que ainda estão em estudo, da montagem das tabelas salariais completas e de conversas com dirigentes do Sinasefe, foi possível produzir a presente análise. Como será possível observar no texto, ela ainda não é uma análise conclusiva, pois algumas questões ainda carecem de maiores esclarecimentos.
1. A PASSAGEM DE DUAS PARA CINCO CARREIRAS
O Plano Único de Classificação e Retribuição de Cargos e Empregos, PUCRCE, instituído pela Lei 7.596, de 1987, contempla duas carreiras docentes, a do magistério de 1º e de 2º grau e a do magistério do ensino superior. Delas fazem parte todos os professores de instituições de ensino vinculadas ao MEC, ao Ministério da Defesa e aos ex-territórios. A MP 431, de 14 de maio de 2008, mantém a carreira do magistério do ensino superior, na qual se encontram todos os docentes ocupantes dos cargos de ensino superior das instituições federais de ensino superior vinculadas ao MEC e ao Ministério da Defesa. Para os docentes que atuam na educação básica, técnica e tecnológica, a MP cria três novas carreiras, a Carreira do Magistério do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico, para os docentes de instituições vinculadas ao MEC, a Carreira do Magistério do Ensino Básico Federal, para os docentes de instituições vinculadas ao Ministério da Defesa e a Carreira do Magistério do Ensino Básico dos Ex-territórios. Considerando que a atual carreira de 1º e de 2º grau permanece até que não tenha mais nenhum docente a ela vinculado, há, a partir de agora, cinco carreiras do magistério em âmbito federal.
Considerando que o Andes-SN, juntamente com o Sinasefe, defende a existência de uma carreira única, a edição da MP 431/08 traz novos desafios para o Movimento Docente.
2. A TRANSPOSIÇÃO DA ATUAL CARREIRA DE 1º E DE 2º GRAU PARA A CARREIRA DO MAGISTÉRIO DO ENSINO BÁSICO, TÉCNICO E TECNOLÓGICO
O enquadramento na nova carreira dar-se-á mediante assinatura de termo de adesão individual, no prazo de 15 de agosto de 2008, no qual consta, além dos dados de identificação do professor, apenas a frase “Venho optar por integrar o Plano de carreira do Magistério do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico, estruturado pela Medida Provisória nº 431, de 14 de maio de 2008”. Como o teor do termo consta da MP (Anexo LXX), o termo de adesão não poderá sofrer nenhuma modificação por ato infralegal. As seções sindicais deverão orientar os docentes em relação isso.
De acordo com o Anexo LXIX da MP 431/08, a transposição dos docentes da atual carreira de 1º e de 2º grau para a carreira do magistério do ensino básico, técnico e tecnológico obedecerá às correspondências do quadro ao lado.
O quadro mostra que não haverá correspondência para as atuais classes A e B. Os poucos ocupantes dessas classes deverão ser transpostos para o nível 1 da Classe D1. Os aposentados e pensionistas, de acordo com o art. 119, terão transposição igual à dos docentes em atividade, e serão “respeitadas as alterações relativas a posicionamentos decorrentes de legislação específica”. Isso significa que os beneficiados pelo art. 192 da Lei 8.112 terão o direito garantido de perceber as vantagens de um nível acima.
3. CRIAÇÃO DO CARGO DE TITULAR NA NOVA CARREIRA
A MP 431/08 cria o cargo de Professor Titular da Carreira do Magistério do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico, ao qual se ingressará por concurso público que exigirá o título de doutor. O art. 110 cria trezentos e cinqüenta cargos de titular, “para provimento gradual”. Ao Ministério da Educação caberá fazer a distribuição desses cargos entre as diversas instituições, “levando em consideração a necessidade e as peculiaridades de cada instituição”. (parágrafo único do art. 110).
4. INGRESSO E PROGRESSÃO NA CARREIRA DO MAGISTÉRIO DO ENSINO BÁSICO, TÉCNICO E TECNOLÓGICO
De acordo com o art. 113, o ingresso dar-se-á no nível 1 da Classe D1, independentemente da titulação, diferentemente do que ocorre hoje na Carreira de 1º e de 2º grau. Deixa de haver a correspondência entre grau de formação e Classe. Quanto à progressão na carreira, o art. 120 estabelece:
“O desenvolvimento na Carreira do Magistério do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico dos servidores que integram os Quadros de Pessoal das Instituições Federais de Ensino, subordinadas ou vinculadas ao Ministério da Educação, ocorrerá mediante progressão funcional, exclusivamente, por titulação e desempenho acadêmico, nos termos do regulamento.” (grifo nosso)
Tal regulamento deverá ser estabelecido por meio de instrumento infralegal, provavelmente um decreto. O § 5º do mesmo artigo define:
“Até que seja publicado o regulamento previsto no caput deste artigo, para fins de progressão funcional e desenvolvimento na Carreira do Magistério do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico, aplicam-se as regras estabelecidas nos arts. 13 e 14 da Lei nº 11.344, de 2006.”
O § 2º do art. 13 da Lei nº 11.344 prevê:
“A progressão prevista no inciso II (de uma para outra Classe) far-se-á, independentemente do interstício, por titulação ou mediante avaliação de desempenho acadêmico do docente que não obtiver a titulação necessária, mas que esteja, no mínimo, há dois anos no nível 4 da respectiva Classe ou com interstício de quatro anos de atividade em órgão público, exceto para a Classe Especial.” (grifo nosso)
A lei anterior (11.344/06) prevê a progressão por titulação ou desempenho acadêmico. Já a MP 431/08 prevê a progressão por titulação e desempenho acadêmico. Isto significa que não haverá mais progressão exclusiva por titulação. Na verdade, haverá apenas progressão por avaliação de desempenho acadêmico da qual, a conclusão de curso de pós-graduação deverá ser um quesito para avaliação.
O interstício para progressão, na nova carreira, será de dezoito meses e não mais de vinte e quatro como ocorre na atual carreira de 1º e de 2º grau. No entanto, para aqueles que serão transpostos para a nova carreira, “será aproveitado o tempo computado da última progressão até a data em que tiver sido feito o enquadramento na carreira”. (§ 3º do art. 120).
Os professores que estiverem “posicionados nas atuais classes “C” e “D” que, à época de assinatura do Termo de Opção pela Carreira do Magistério do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico, estiverem matriculados em programas de mestrado ou doutorado poderão progredir na Carreira mediante a obtenção dos respectivos títulos para a nova Classe D III, Nível “. (§ 4º do art. 120)
5. ATUAÇÃO EM NÍVEIS DIFERENTES DE ENSINO
A MP 431/08 prevê a atuação temporária em níveis de ensino diferentes.
“Art. 24. Os titulares de cargos de provimento efetivo da Carreira do Magistério Superior, desde que atendam aos requisitos de titulação estabelecidos para ingresso nos cargos da Carreira do Magistério do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico, poderão, por prazo não superior a dois anos consecutivos, ter exercício provisório e atuar no ensino superior nas Instituições Federais de Ensino Básico, Técnico e Tecnológico vinculadas ao Ministério da Educação.”
E, para os docentes da Carreira do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico, o art. 111 permite, em seu § 1º, o inverso.
“§1o Os titulares de cargos de provimento efetivo do Plano de Carreira e Cargos do Magistério do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico, desde que atendam aos requisitos de titulação estabelecidos para ingresso nos cargos da Carreira do Magistério Superior poderão, por prazo não superior a dois anos consecutivos, ter exercício provisório e atuar no ensino superior nas Instituições de Ensino Superior vinculadas ao Ministério da Educação.”
A limitação em dois anos consecutivos assemelha-se ao prazo total para a permanência de Professor Substituto nas Instituições Federais de Ensino. Neste caso, o limite tem por objetivo evitar que o professor com contrato precário possa reclamar, na justiça, a caracterização de vínculo empregatício e obter direitos que dele possam decorrer. A limitação, nos casos previstos pela MP 431/08, deve ter motivação semelhante. Ela, porém, é problemática para as instituições de ensino superior, e apontamos, abaixo, alguns dos problemas.
Os CEFET do Maranhão, do Rio de Janeiro e Minas Gerais e a Universidade Tecnológica do Paraná (ex CEFET) são Ifes e contam, em seus quadros, com maioria de docentes da carreira de 1º e de 2º grau. Estes já atuam no ensino superior, não apenas em cursos tecnológicos, mas também em cursos de graduação e em cursos de pós-graduação. Esses professores deverão aderir à Carreira do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico. Se eles já pertencem a instituições de ensino superior, e seu exercício no ensino superior não é provisório, mas permanente, o que poderá ocorrer após completados dois anos da adesão à nova carreira?
A única forma de não haver contradição com o que define a MP será a limitação de oferta, por parte dessas instituições, de cursos de educação básica, técnica e tecnológica, o que seria adequado à política de expansão do ensino superior que privilegia cursos de curta duração.
No que diz respeito às universidades federais, passa-se a ter a possibilidade de atuação temporária em níveis diferentes, o que pode agravar os problemas hoje existentes de falta de professores, principalmente na educação infantil e básica.
O próximo passo que o governo pretende dar, após a edição da MP 431/08, será o envio ao Congresso Nacional de projetos de lei que criarão os IFET. Nas universidades, cujos colégios aderiram ou aderirão aos IFET, está sendo dada a opção de permanência na instituição dos docentes que assim desejarem. Mas, como poderão as universidades aproveitar plenamente os professores, hoje pertencentes à Carreira de 1º e de 2º grau, nas atividades que desenvolvem?
As questões acima e outras que ainda poderão surgir exigirão um acompanhamento cuidadoso dos processos que se iniciam com o advento da MP 431/08.
6. SEMELHANÇA ENTRE COMPOSIÇÕES REMUNERATÓRIAS E DISTANCIAMENTO ENTRE CARREIRAS
As estruturas remuneratórias das carreiras do magistério do ensino superior, do magistério do ensino básico, técnico e tecnológico serão, a partir de fevereiro de 2009, semelhantes. Haverá a incorporação da GAE e da VPI ao vencimento básico, e o incentivo de titulação, que hoje compõe o vencimento, será transformado em gratificação com o nome de Retribuição por Titulação-RT. Em lugar da GED e da GEAD haverá a Gratificação Específica do Magistério do Ensino Superior – GEMAS e a Gratificação Específica de Atividade Docente do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico – GEDBT. No caso da carreira do ensino superior, haverá, de 14 de maio de 2008 a 1º de fevereiro de 2009, uma gratificação temporária – GTMS, em substituição à GED.
Como na Carreira do Magistério do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico não há relação entre níveis de formação e classes, seja para o ingresso, seja para promoção, o que ainda é mantido na Carreira do Magistério do Ensino Superior, as duas carreiras estão mais distantes uma da outra do que a relação entre as atuais carreiras do PUCRCE. Tomando-se como referência a proposta de carreira única do Andes-SN, a Carreira do Magistério do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico será uma não-carreira.
As estruturas remuneratórias criadas pelo governo serão prejudiciais aos docentes em relação à conquista do PUCRCE, em 1987. As tabelas salariais apresentadas pelo Andes-SN, na campanha salarial de 2007 e atualizadas a partir do aumento do salário-mínimo, visavam a recompor os valores dos salários dos docentes, eliminar as gratificações e voltar aos percentuais precisos para os degraus entre níveis e entre classes como fora em 1987.
O governo comprimiu as tabelas de vencimentos básicos e definiu os valores finais que pretendia obter nas remunerações, ajustando, sem qualquer critério técnico, os valores das gratificações para cada um dos níveis das carreiras. Isto é, o que passará a ter maior influência na diferenciação remuneratória entre os níveis e entre as classes serão as gratificações e não mais os valores diferenciados de vencimentos.
7. VARIAÇÃO DE REAJUSTES NOS ANOS 2008, 2009 E 2010
O parcelamento de efeitos financeiros de medidas que modificam carreiras ou malhas salariais não é novidade no serviço público. Nos casos em que isso ocorreu, no passado, seguia-se um norte. Um exemplo é o da carreira dos servidores técnico-administrativos das IFE. Nem sempre o governo cumpriu as etapas estabelecidas, o que resultou em novas mobilizações para forçá-lo a cumprir o que fora pactuado. A novidade agora, já analisada em outros textos, é a realização de uma única negociação salarial para todo o mandato. Com a vigência da MP 431/08, o governo pretende se livrar, até o final da gestão, de negociações salariais com os servidores, o que só voltaria a ocorrer no próximo governo, a partir de 2011.
O parcelamento dos efeitos da MP 431/08, no caso dos docentes, pelo menos, tem, como já analisado aqui, norte diferente daquele pretendido pela categoria. Além disso, os reajustes na remuneração serão maiores em 2008 e menores em 2009 e 2010. O estabelecimento prévio dos reajustes que vigorarão a partir de fevereiro de 2009 e de julho de 2010, diante de uma inflação que dá sinais de crescimento, pode vir a significar perdas em relação ao que é percebido hoje pelos docentes, além de não compensar perdas anteriores. Pelo critério adotados pelo governo de dar tratamento diferenciado aos regimes de trabalho e às classes, os efeitos da inflação serão sentidos diferenciadamente por cada professor em função de seu regime de trabalho e de seu posicionamento na carreira.
A reabertura de negociações com o governo é uma necessidade para que sejam corrigidas as distorções introduzidas pela MP, tendo como nortes a isonomia, a carreira única, a incorporação das gratificações, com valorização efetiva do vencimento, malha salarial que tenha regras claras e o estabelecimento de uma política salarial que proteja os valores dos salários da corrosão inflacionária.
8. TABELAS SALARIAIS
Os anexos contêm dezoito tabelas salariais, sendo nove da Carreira do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico e nove da Carreira do Magistério do Ensino Superior, divididas conforme os efeitos da MP 431/08 em 2008, 2009 e 2010 e para os regimes de 20 horas, 40 horas e Dedicação Exclusiva. Suas colunas representam a composição da remuneração em cada um dos três momentos. Após a coluna “Total” de cada tabela, encontram-se uma coluna referente à remuneração anterior, outra referente aos percentuais de reajuste e a última contém os valores da proposta do Andes-SN atualizados para março de 2008. Ela acompanha todas as tabelas, até 2010, para que seja possível comparar a defasagem, incluindo os anos posteriores, em relação ao que deveria ser a remuneração a partir de março de 2008, conforme reivindica o Sindicato.
O ANEXO XVII da MP 431/08 contém os valores de Vencimento Básico da Carreira do Magistério do Ensino Superior que vigorarão a partir de 1º de fevereiro de 2009. Não consta o nível um da classe de Professor Auxiliar. Até o momento do fechamento deste texto não foi possível saber se este nível será, de fato, extinto, ou se houve um erro por parte do governo, uma vez que, para as gratificações, a MP contempla o referido nível. As tabelas que foram elaboradas pelo Andes-SN, então, deixam em branco os espaços reservados para os valores do Vencimento Básico do nível um da classe de Professor Auxiliar, o que resulta em reajuste negativo em 1º de fevereiro de 2009.
Deve ser observado, ainda, que, em alguns casos, em 1º de fevereiro de 2009 haverá reajustes negativos, cujos percentuais aparecem entre parênteses.