“O governo federal quer flexibilizar relações trabalhistas e regras de licitação em nove setores da administração pública, retirando, por exemplo, a estabilidade no emprego. A proposta foi enviada por meio de projeto de lei ao Congresso”. Assim o jornal Folha de S.Paulo da última sexta-feira, dia 13, abre sua matéria sobre o envio do PL que cria a fundação estatal de direito privado ao parlamento.
Mais não precisava dizer. Flexibilizar, cortar, reduzir, eliminar são os verbos a serem conjugados na equação apresentada pelo governo Lula, que requenta, aprofunda e piora a reforma administrativa proposta por Luiz Carlos Bresser Pereira durante o mandato de Fernando Henrique Cardoso.
Assim, conquistas históricas dos trabalhadores do setor público, inseridas na Constituição de 1988 a custo de muita luta e pressão, podem correr pelo ralo. Regime Jurídico Único, estabilidade no emprego, isonomia salarial, entre outras estão seriamente ameaçadas. Mas a proposta não traz prejuízos somente aos servidores públicos. O Sistema Único de Saúde, que, mesmo com seus problemas, é uma conquista da sociedade brasileira também está seriamente ameaçado.
O projeto enviado ao Congresso “estabelece que o Poder Público poderá instituir fundação estatal, sem fins lucrativos, integrante da administração pública indireta, nas áreas de saúde, educação, assistência social, cultura, desporto, ciência e tecnologia, meio-ambiente, previdência complementar do servidor público”, conforme informa mensagem do ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, datado do dia 4 de junho.
A princípio, a proposta valeria para os 10 hospitais que, hoje, são subordinados ao Ministério da Saúde – nove no Rio e um em Porto Alegre – e para os 48 hospitais universitários de instituições federais, como o HU da UFSC. No entanto, a proposta poderá ser adotada também por estados e municípios, atingido cerca de 2.500 unidades.
Mesmo com a 172ª reunião ordinária do Conselho Nacional de Saúde (CNS), realizada de 12 a 14 de junho, condenando a proposta do governo de transformar hospitais federais e universitários em fundações estatais de direito privado, o governo não mudou uma vírgula de seu projeto, comprovando mais uma vez que o suposto diálogo com os movimentos sociais não passa de jogo de cena.
Por conta disso, o presidente do Conselho Nacional de Saúde (CNS), Francisco Batista Júnior, disse à Folha de S. Paulo que “caso a entidade não consiga derrubar no Congresso o projeto de lei de criação de fundações estatais para gerir serviços públicos, irá entrar com uma ação de inconstitucionalidade contra a lei no STF (Supremo Tribunal Federal)”.
Batista considera que o projeto “terceiriza” a gestão dos hospitais e “não resolve os problemas que ele reconhece existir no SUS (Sistema Único de Saúde). Isso porque, para ele, as fundações também teriam vícios, como a indicação política de administradores e a má gestão de recursos públicos”. O presidente do CNS destacou ainda o “profundo desrespeito com o controle social” cometido pelo governo ao elaborar uma proposta sem ouvir o Conselho.
Em coletiva conjunta com o ministro da Saúde, José Ramos Temporão, para divulgar o Projeto, o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, disse que a Fundação Estatal é uma nova tecnologia de gestão e permitirá ao Estado agir com mais eficiência e rapidez. “Queremos ampliar a capacidade do Estado de prestar melhores serviços à população”, destacou Bernardo.
O ministro da Saúde disse que esta é uma medida importante para a saúde que sofre com problemas estruturais de gestão. Segundo Temporão, a gestão de hospitais mudou radicalmente nos últimos anos e o setor público tem o dever de responder com rapidez aos problemas das unidades hospitalares.
Mais uma vez a privatização é vendida como a cura para todos os males, com a entrega do patrimônio público e a exclusão de grande parte da população do acesso a um direito vital à sua sobrevivência sendo escamoteadas sob o discurso do ganho de eficiência e da qualidade do serviço prestado.