É um crime qualificar fundo de pensão complementar como previdência, é capital portador de juros. A opinião é da professora da Escola de Serviço Social da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Sara Granemann, especialista em áreas como “Acumulação capitalista e a Previdência Privada”d+ “Modalidades de Previdência Complementar: a Aberta e a Fechada (Fundos de Pensão)”d+ “As reformas recentes na Previdência Social e a Reforma do Estado”d+ e “As demandas do mundo do trabalho no âmbito da Seguridade Social”. A docente participou de um debate promovido pela Apufsc no dia 24 de maio, no auditório do Colégio de Aplicação da UFSC, no qual avaliou os principais aspectos do fundo de previdência complementar (Funpresp) proposto pelo governo Lula.
Sara destacou que desde a aprovação da Reforma da Previdência, no final de 2003, que estendeu o teto do valor das aposentadorias do INSS para os trabalhadores do serviço público e instituiu a cobrança dos aposentados, o governo vem cobrando 11% de contribuição dos trabalhadores da ativa sobre o total da remuneração, sem limitá-la aos R$ 2.894,28 de teto da Previdência Social pública.
A iniciativa do governo está escorada na lei 10.887, de 18 de Junho de 2004, que “dispõe sobre a aplicação de disposições da Emenda Constitucional nº 41, de 19 de dezembro de 2003, altera dispositivos das Leis nº 9.717, de 27 de novembro de 1998, 8.213, de 24 de julho de 1991, 9.532, de 10 de dezembro de 1997, e dá outras providências”, que em seu artigo 4º determina que “a contribuição social do servidor público ativo de qualquer dos Poderes da União, incluídas suas autarquias e fundações, para a manutenção do respectivo regime próprio de previdência social, será de 11%, incidente sobre a totalidade da base de contribuição”.
A professora da UFRJ ressalta que, amparado na lei, o governo usa o argumento de que o valor da contribuição do servidor é social, ou seja, deve ser capaz de sustentar solidariamente o regime próprio de Previdência Social, garantindo não só a aposentadoria individual, mas a de todos.
A partir desse argumento, o governo não baixou o valor da contribuição. Nenhum contratado depois da promulgação da Emenda Constitucional 41 está pagando 11% sobre o R$ 2.894,28, e sim sobre o total dos vencimentos. Assim, para garantir uma aposentadoria minimamente decente, o novo servidor teria que contribuir com mais 7,5% sobre a parte que exceder o teto do INSS, o que faria, dependendo do total de seus vencimentos, com que ele contribuísse com mais de 15% de seus proventos para a Previdência.
Essa contradição entre contribuir com base na integralidade do salário mas não ter garantida a integralidade e a paridade da aposentadoria, abre possibilidade, segundo Sara Granemann, para buscar a paridade na Justiça.
A professora destaca ainda que o sistema de contribuição definida, modelo que o governo quer adotar no Funpresp, exime dos empregadores a responsabilidade pela manutenção do fundo e pelo pagamento das aposentadorias e pensões. Se o fundo quebrar por má gestão ou má aplicação dos recursos, os trabalhadores ficam a ver navios.
“Sei quanto pago ao longo do caminho, mas não sei quanto terei no final. Quando chegar lá, se não tiver nada, nada receberei. O patrão não tem mais obrigação de bancar a previdência e isso é o mais grave. Se os investimentos não valorizaram devidamente, não haverá recursos e ninguém se responsabiliza”, adverte Granemann.
A docente informa que o projeto de lei do Funpresp abre a possibilidade do fundo ser multipatrocinado, englobando também servidores municipais e estaduais. Só a União, sem contar os poderes Legislativo e Judiciário, teria 600 mil servidores para ingressar no fundo. A estimativa do mercado financeiro é que em sua primeira década, sem ainda haver pagamento de aposentadorias, junte um patrimônio de R$ 500 bilhões. Se houver a adesão de estados e municípios, esse volume seria muito maior. “Petros e Previ virariam “cofrinho de criança””, ressalta Sara.