Governo Lula prepara projeto que pode privatizar HU

Fundação estatal seria paga por serviço prestado e contrataria pessoal pela CLT

O governo Lula prepara mais um ataque ao serviço público federal. Embora não tenha finalizado o projeto de lei, o site do Ministério do Planejamento (clique aqui) já apresenta as justificativas para a criação da fundação estatal de direito privado. 

De acordo com informações da Fasubra (Federação de Sindicatos de Trabalhadores das Universidades Brasileiras), os hospitais universitários, assim como os hospitais federais situados no estado do Rio de Janeiro, serviriam de cobaia para a implantação da proposta, que pode causar profundas mudanças no serviço público e para os trabalhadores do setor. 

A apresentação do documento Fundação estatal: principais aspectos diz textualmente que “dotada de autonomia gerencial, orçamentária e financeira, a fundação estatal é regida por regras do direito privado, à semelhança do formato da empresa estatal sem, entretanto, se referenciar no modelo competitivo da busca pelo lucro. O modelo é próprio para a atuação do Estado em áreas que não lhe são exclusivas, ou seja, onde não é requerido o exercício do seu poder de autoridade, como a saúde, educação, cultura, esporte, turismo, tecnologia, assistência social, dentre outras”.

Como se vê, em praticamente todas as áreas da atuação do Estado, a fundação poderia atuar, mesmo naquelas fundamentais para grande parte da população como saúde, educação e assistência social. 

E como essa fundação funcionaria? Depois de ser criada através de uma lei específica, a Fundação seria formada por um conselho curador, uma diretoria executiva, um conselho fiscal e um conselho consultivo social e firmaria um contrato de gestão com o Estado, sendo remunerada por serviços prestados. Esse contrato pode ser assinado por um órgão da administração direta ou indireta, que repassaria os recursos de acordo com o convencionado no contrato. 

“As receitas da fundação estatal não são previamente garantidas no orçamento público. Ela recebe pelo serviço efetivamente prestado. Esse instituto, ao tempo em que permite autonomia orçamentária e financeira à entidade, institui o controle de resultados, que é o modelo de gestão almejado para toda a administração pública, em proveito do interesse Público”, diz o texto do Ministério do Planejamento. Nem a verba para pagamento de salários estaria garantida. 

De acordo com Sindicato dos Trabalhadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Sintufrj), não existe recurso de nenhum ministério para fundação estatal, nem mesmo para pagamento de pessoal. Os recursos serão aqueles pactuados no contrato de gestão com o SUS, através do Orçamento Global. Os trabalhadores do RJU serão cedidos e pagos pela fundação. Os demais, pela CLT. Hospitais estaduais de Sergipe, Bahia e Rio de Janeiro já adotam termos de ajuste de conduta para mudança do modelo. Transmutados em fundações, os hospitais podem vender serviços para convênios para ampliar receitas, o que significa redução dos espaços de atendimento gratuito, assim como produção acadêmica voltada ao perfil social.

A fundação teria autonomia gerencial, orçamentária e financeira. Seus recursos não entrariam no bolo do Orçamento da União. Ela também poderia captar recursos na iniciativa privada. Seria fiscalizada pelo Tribunal de Contas da União, mas teria um sistema contábil próprio e se beneficiaria de imunidades tributárias que favorecem as fundações que atuam na área social, como o não recolhimento de contribuição patronal ao INSS. 

A fundação estatal teria autonomia para contratar pessoal, que seria admitido por concurso público, mas regido pelo regime celetista. O próprio documento do Ministério do Planejamento destaca a ausência da estabilidade no emprego garantida aos servidores públicos como uma grande vantagem para o funcionamento das fundações. Cada uma delas teria um plano de cargos e salários próprio e negociaria um acordo coletivo de trabalho específico com seus empregados.

Isso significa, na prática, o esquartejamento das carreiras do serviço público, conquistas históricas dos trabalhadores do setor. Profissionais poderiam ser contratados por salários diferentes para a mesma função de fundação para fundação. 

A Fasubra informa que o hospital da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, localizado em Dourados, já está sendo preparado, através de estudos técnicos, para ser convertido em fundação estatal.

Os hospitais universitários transformados em fundação estatal estariam liberados então para fechar contratos com os planos de saúde e deixariam de privilegiar o atendimento ao SUS, como ocorre hoje. Como os HU são os únicos que atendem exclusivamente pelo Sistema Único de Saúde, a população mais pobre seria definitivamente marginalizada dos serviços de saúde, já que é difícil imaginar que não se priorize o atendimento a quem paga melhor, no caso, os planos privados. 

CRÍTICAS

Matéria publicada pelo jornal do Sintufrj (nº 769, de 04/06/07) informa que o presidente do Conselho Nacional de Saúde, Francisco Batista Júnior, fez duras críticas à proposta do governo de transformar hospitais em fundações estatais, inclusive por ter sido feita sem a participação de usuários e trabalhadores. 

Batista disse que “a proposta da fundação aponta para a total impossibilidade daquilo que defendemos historicamente, que é a carreira do trabalhador do SUS”. A remuneração vai ser definida de acordo com o mercado. Uma mesma categoria pode ter remuneração diferente de uma fundação para outra: “Isso acaba com qualquer possibilidade de carreira e, mais ainda, com a possibilidade da implantação das Diretrizes de Plano de Carreira (DPC) dos trabalhadores do Serviço Público”, explica.

Segundo ele, há concordância com o diagnóstico, como falta de autonomia, de profissionalismo e ingerência política, mas não com o remédio. “Defendemos para o atual modelo autonomia administrativa, financeira, política, orçamentária e gerencial. Defendemos que a gerência dos serviços públicos possa ser profissionalizada. E que aquelas dificuldades de pessoal em alguns serviços possam ser resolvidas não de acordo com o mercado, mas de acordo com Diretrizes dos Planos de Carreira”, afirma Francisco Batista Júnior. O projeto será pauta da próxima reunião do Conselho Nacional de Saúde, em junho.