Na Semana de Ensino, Pesquisa e Extensão de 2007, a comunidade universitária da UFSC pôde perceber que perdeu um dos seus principais órgãos de divulgação. Em acontecimentos como a explosão ocorrida há dias no RU, vai depender só dos boatos para saber o que houve. E na eleição para reitor do segundo semestre, vai sentir a falta de uma fonte de informação que seja plural e independente. O projeto Universidade Aberta do Curso de Jornalismo deixou de existir em março, depois de mais de 15 anos de produção de noticiário diário sobre a UFSC. Já não se pode dizer com certeza que “todo dia a UFSC é notícia”, como no slogan do projeto, e o que se passa no Campus da Trindade fica menos conhecido, transparente e explicado. Os jornalistas de Santa Catarina perderam também a sua mais confiável fonte de informações sobre a Universidade.
Fundado em 1991, com um programa diário sobre a UFSC produzido pelos alunos de Jornalismo na extinta Rádio União FM, o projeto conquistou credibilidade dentro e fora do campus e se expandiu para outras mídias. Manteve programas diários em várias rádios comerciais, mais tarde também na TV, conquistou páginas periódicas em jornais de Florianópolis e em 1997 inaugurou o site www.unaberta.ufsc.br, o primeiro jornal online de todo o estado de Santa Catarina e também a primeira página de internet com notícias diárias de toda a universidade brasileira. Desde então, durante as greves na universidade, o Unaberta foi a única fonte de informação atualizada diariamente sobre os rumos do movimento e as negociações em Brasília, para onde várias vezes enviou alunos-repórteres, e conquistou com isso um público nacional. O site recebeu mais de sete milhões de acessos reais em sua existência, não baixando, nos últimos tempos de vida, dos cinco mil acessos diários.
Em 1998, por iniciativa do pró-reitor Faruk Nome, a Reitoria transferiu ao Unaberta os recursos e a responsabilidade pela divulgação do Vestibular da UFSC, antes confiados a uma empresa privada. As inscrições no vestibular aumentaram nos cinco anos seguintes, e a experiência foi apontada pelo MEC às demais Ifes como exemplo de como reduzir custos e ganhar eficiência na organização do concurso. O projeto passou a produzir toda a campanha publicitária do vestibular (cartaz, folder, anúncios para jornal, revista, rádio, TV e internet), administrar a sua veiculação, elaborar o site do concurso, o Guia do Vestibulando, o Guia dos Cursos e a revista institucional da Universidade (UFSC 2000), além de outros serviços de comunicação institucional, requisitados por vários setores.
Com os recursos recebidos, o Unaberta sustentava toda essa produção, inteiramente realizada por alunos do Jornalismo, com apoio de servidores e supervisão de professores. E, mais do que isso, garantia o financiamento de seu objetivo principal, a produção diária de notícias independentes sobre a Universidade para a mídia própria e externa. No auge, o projeto de extensão chegou a manter simultaneamente seis professores, três servidores e trinta alunos como bolsistas. Atuando como agência de notícias e produtora multimídia, passou a colecionar prêmios nacionais e a ser citado como referência laboratorial no ensino de jornalismo. Enquanto estágio interno, tornou-se um dos alicerces do projeto pedagógico que colocou o curso da UFSC por vários anos na posição de “o melhor do país”, como aparecia no Guia do Estudante da Editora Abril.
ESVAZIAMENTO – A nomeação de um professor do curso, participante do projeto Universidade Aberta, para a direção da Agência de Comunicação da Universidade, na última gestão do reitor Rodolfo Pinto da Luz, criou a expectativa de um maior aproveitamento da competência do Departamento de Jornalismo para gerar a elaboração do Plano Estratégico de Comunicação da UFSC no âmbito da Agecom. Mas o que se seguiu foi o inverso: nos anos seguintes, o Unaberta começou a perder espaço na comunicação da universidade e as verbas necessárias para funcionar. Na gestão do professor Lúcio Botelho, prosseguiu o esvaziamento do Projeto Universidade Aberta: o Curso de Jornalismo foi definitivamente excluído da comunicação do vestibular, perdeu as bolsas de extensão dos professores e funcionários, depois também as verbas de contratação de serviços e de material de consumo, mantendo apenas as bolsas dos alunos, já reduzidas pela metade em relação a oito anos antes. O projeto só não morreu no início de 2006 pela resistência teimosa de sua última coordenadora, que o sustentou, apoiada apenas por um punhado de alunos, até o final do último semestre letivo, quando se afastou da UFSC para cursar doutorado.
Faça-se justiça, no entanto, ao atual reitor: ao tomar conhecimento da paralisação do projeto, o professor Lúcio Botelho disponibilizou-se a buscar recursos para viabilizar a continuidade da existência do Universidade Aberta, concordando que a UFSC precisava de um veículo independente da sua comunicação institucional, conforme o UA sempre se propôs a ser e vinha atuando. Na verdade, foram o Departamento e o Curso de Jornalismo que já não se interessaram por dar continuidade ao Unaberta.
DIVISÃO INTERNA – Para mais de 500 jornalistas diplomados na UFSC, que passaram pelo Unaberta nestes últimos quinze anos e meio, o projeto foi um dos alicerces da qualidade de sua formação. Mas os atuais responsáveis pelo Departamento e o Curso – direção e corpo docente – não pensam da mesma forma que seus ex-alunos. Assim, na última reunião do Colegiado do Departamento, realizada no dia 18 de abril, o projeto foi desqualificado de várias formas e tido como perfeitamente dispensável. Diante do impedimento dos seus últimos coordenadores – uma afastada para doutorado, outro assumindo a coordenação da implantação do mestrado – nenhum outro professor se interessou em dar continuidade ao projeto, e a experiência do site foi considerada encerrada.
Envolvidos em mais uma árdua disputa interna, que é recorrente na história do Departamento e do Curso, não parece importar tanto aos vários grupos de professores edificar o institucional coletivo. É neste contexto que se opta por extinguir o Unaberta, mesmo sem nada ainda de concreto delineado para colocar no lugar. E o certo é que todas tentativas anteriores de substituição não conseguiram se consolidar.
A maioria silenciosa do Departamento, envolvida em seus projetos e afazeres, que são muitos, e atordoada pelas disputas internas, desistiu de continuar defendendo o projeto. Os atuais alunos, assustados e temerosos, optaram por se calar durante todo o desenrolar do episódio. E só agora, depois dele consumado, dão-se conta de que foram os verdadeiros perdedores.
Se a disputa interna não inviabilizar mais outras coisas, o Departamento de Jornalismo da UFSC continuará a contar com excelentes professores em aula, projetos de pesquisa de ponta e uma infra-estrutura tecnológica de fazer inveja. Neste momento, o Departamento dá, sem dúvida, um grande salto, com a criação do primeiro mestrado especializado em Jornalismo no país, que vem sendo muito saudado pela comunidade acadêmica do campo e também pela área profissional.
Mas a morte do Projeto Universidade Aberta marca o fim de uma era na formação profissional oferecida na instituição. A convivência de professores e alunos em torno de uma prática com P maiúsculo, feita real dentro do curso, não mais será a mesma. A emoção da cobertura em tempo real dos acontecimentos da Universidade, do enfrentamento dos dilemas éticos, dos desafios teóricos e técnicos da profissão, no testemunho diário de uma paixão pelo ofício, isso pode ter ficado para a história como o período romântico, ou melhor, utópico, do Curso de Jornalismo da UFSC. Ao alcance dos signatários desta, fundadores e ex-coordenadores do projeto, fica a vontade de manter viva uma pequena semente deste espírito na Rádio Ponto UFSC (www.radio.ufsc.br), projeto do Laboratório de Radiojornalismo do Curso, onde, aliás, tudo começou.